Docsity
Docsity

Prepare-se para as provas
Prepare-se para as provas

Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity


Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos para baixar

Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium


Guias e Dicas
Guias e Dicas

Emergências Cardiovasculares - SBC, Notas de estudo de Enfermagem

CUIDADOS COM O PACIENTE COM DISTÚRBIOS CARDIOVASCULAR

Tipologia: Notas de estudo

2015
Em oferta
30 Pontos
Discount

Oferta por tempo limitado


Compartilhado em 19/06/2015

junior-pereira-60
junior-pereira-60 🇧🇷

4.4

(8)

22 documentos

Pré-visualização parcial do texto

Baixe Emergências Cardiovasculares - SBC e outras Notas de estudo em PDF para Enfermagem, somente na Docsity! TREINAMENTO DE EMERGÊNCIAS CARDIOVASCULARES DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA CURSO OFICIAL DA SBC AVANÇADO AVANÇADO TREINAMENTO DE EMERGÊNCIAS CARDIOVASCULARES DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE CARDIOLOGIA Sociedade Brasileira de Cardiologia XI Su m ár io Capítulo 11 Taquiarritmias. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84 ƒ Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 84 ƒ Taquicardias com QRS estreito (QRS < 120 ms) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85 ƒ Taquicardia de QRS largo (QRS ! 120 ms) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 93 Capítulo 12 Acidente vascular encefálico . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 98 ƒ Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 98 ƒ Exames de imagem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101 ƒ Outros exames complementares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102 ƒ Tratamento. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102 ƒ Fatores prognósticos pós-trombólise . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106 ƒ Tratamento agudo em pacientes sem indicação de tratamento de reperfusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 108 ƒ Indicadores de qualidade no tratamento hospitalar do paciente com AVE. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112 ƒ Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 113 Capítulo 13 Insuficiência cardíaca descompensada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114 ƒ Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114 ƒ Quadros de ICD . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 114 ƒ Fisiopatologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 115 ƒ Classificação funcional. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117 ƒ Abordagem inicial. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117 ƒ Vasodilatadores e vasoconstritores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127 ƒ Inotrópicos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 128 ƒ Considerações finais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129 Bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130 XIII Prefácio A Sociedade Brasileira de Cardiologia apresenta o livro e curso Treinamento de Emergên- cias Cardiovasculares Avançado (TECA A). Este livro, associado ao curso para profi ssionais de saúde que atuam em emergência médica, tem como objetivo o treinamento cognitivo, psi- comotor e afetivo no atendimento da principal causa de morte em nosso país, a emergên- cia cardiovascular. O TECA A foi desenvolvido com base na I Diretriz Brasileira de Parada Cardiorrespiratória e Emergência Cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardiologia – 2012 e na diretriz mais recente do International Liaison Committee on Resuscitation (ILCOR). O livro e o curso foram desenvolvidos por especialistas em emergência cardiovascular, seguindo critérios modernos de didática e treinamento, fazendo com que ambos sejam fer- ramentas úteis e indispensáveis para unidades hospitalares e pré-hospitalares que traba- lham com emergência médica no Brasil. Ambos abordam a emergência cardiovascular de maneira inédita e customizada para o profi ssional brasileiro, fato de extrema importância, já que, no Brasil, o ensino de emergência precisa ser aprimorado dentro e fora das escolas médicas. O TECA A tem como objetivo focar a parada cardiorrespiratória (PCR) como ja- mais foi abordada por qualquer outro livro ou treinamento no mundo. O objetivo é incluir treinamento das situações de pré-PCR (acidente vascular encefálico, insufi ciência coro- nariana aguda, arritmias e insufi ciência cardíaca descompensada), PCR (ritmos da PCR) e pós-PCR (hipotermia etc.), além do trabalho em equipe e do time de resposta rápida. Outro ponto de destaque deste livro e curso é o fato de constituírem o primeiro mate- rial inteiramente nacional de treinamento de emergência cardiovascular, feito com toda a credibilidade da Sociedade Brasileira de Cardiologia e customizado para as reais necessi- dades de nossos profi ssionais de saúde. Portanto, temos curso e livro feitos para o Brasil e que serão revisados e atualizados com as ciências nacional e internacional, de acordo com as mudanças necessárias. A Diretoria de Promoção de Saúde Cardiovascular da Sociedade Brasileira de Cardio- logia é conhecida tradicionalmente como a pioneira e principal entidade em treinamento cardiovascular de emergêcia no país, além de promover várias ações de promoção da saú- de cardiovascular, por meio de parcerias com entidades internacionais. Com o lançamento 2 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Conceitos Define-se por emergência a constatação médica de condições de agravo à saúde que impliquem em risco iminente à vida ou sofrimento intenso, exigindo, portanto, tratamento médico imediato (Conselho Federal de Medicina, Resolução CFM n. 1.451/95). A parada cardiorrespiratória (PCR), parada cardiocirculatória ou parada cardíaca, pode ser defi- nida como uma situação extrema de emergência médica, marcada pela cessação súbita da função mecânica cardíaca com consequente colapso hemodinâmico. Pode ser reversível, quando tratada de forma rápida e efetiva. Evolui para óbito nos casos em que não ocorre intervenção adequada e imediata. O termo PCR deve ser empregado nos casos de parada cardiorrespiratória nos primeiros minutos após o colapso do paciente, enquanto ainda há possibilidade da circulação espontânea ser resta- belecida, e nos casos em que a RCP for bem-sucedida, com retorno à circulação espontânea (RCE). Nos casos que evoluem para óbito, o evento deve ser chamado de morte súbita cardiovascular (MS), principalmente quando o óbito ocorre de forma natural, por causas cardiovasculares, dentro da primeira hora após o início dos sintomas. Algumas definições estendem o tempo para até 24 horas após o início dos sintomas. Embora em muitos locais o termo “morte súbita abortada” ainda seja empregado para os eventos que retornam à circulação espontânea, a tendência é reservar o termo MS para os eventos que têm o óbito como seu desfecho final. Entendem-se como manobras de RCP o conjunto de intervenções aplicadas em vítimas de PCR com o objetivo de promover o RCE. Para alguns autores, incluem apenas as compressões torácicas e as ventilações; para outros, incluem todas as intervenções aplicadas, como as compressões torácicas, ventilações, dispositivos de vias aéreas, drogas e terapia elétrica. Para alguns autores, o termo mais adequado seria reanimação cardiocerebral (RCC), ou reanimação cardiopulmo- nar-cerebral (RCP-C), com a justificativa de que a recuperação da função neurológica da vítima de PCR seria o segundo objetivo mais importante das manobras de reanimação, apenas menos importante que a recuperação da função cardiocirculatória. Epidemiologia Dados obtidos em um estudo observacional prospectivo multicêntrico realizado pelo Resusci- tation Outcome Consortium (Nichol et al., 2008), nos Estados Unidos e no Canadá, mostram que a incidência de PCR com ativação do sistema médico de emergência (SME) é em média de 95,7/100.000 pessoas ao ano, variando de 71,8/100.000 habitantes, em Ottawa, a 159,0/100.000 habitantes, em Dallas. Nesse estudo, uma população de 21,4 milhões de pessoas foi acompanhada por 1 ano. Foram registradas 20.520 PCR não traumáticas avaliadas pelo SME. Em 8.622 casos não foram iniciadas manobras de RCP, por se tratar de pacientes com documentos assinados por médicos para não ini- ciar RCP, pacientes com história prolongada de doença intratável ou terminal, ou por solicitação dos familiares ( Figura 1). Para melhor avaliação das taxas de sobrevida com alta hospitalar, podem-se considerar apenas os casos em que foram realizadas manobras de RCP. Dessa forma, a incidência média de PCR com tentativa de RCP passaria para 55,6/100.000 habitantes, variando de 40,3/100.000 habitantes, no Alabama, a 86,7/100.000 habitantes, em Milwaukee. As taxas médias de sobrevida com alta hospitalar ficariam em 7,9%, variando de 3%, no Alaba- ma, a 16,3% habitantes, em Seattle. A ampla diferença nas taxas de sobrevida pode estar relacio- Sociedade Brasileira de Cardiologia 3 In tro du çã o Figura 1 Fluxograma dos pacientes baseado no modelo de Utstein. PCR: parada cardiorrespi- ratória; SME: serviço médico de emergência; RCP: reanimação cardiopulmonar; RCE: retorno à circulação espontânea. Fonte: Nichol et al., 2008. nada a fatores de risco para PCR pré-hospitalar (fatores locais de prevalência de doença corona- riana e qualidade dos programas de prevenção cardiovascular), mas também estaria relacionada à disponibilidade do SME – incluindo programas de capacitação da população que possibilitem o início de RCP por socorristas leigos –, a existência de programas de acesso público à desfibrilação, à qualidade e disponibilidade rápida do SME e à qualidade dos cuidados pós-PCR dos hospitais de cada região. A incidência de fibrilação ventricular (FV) ficou em 12,8/100.000 habitantes, o que corresponde a 22,8% dos casos de PCR com tentativa de RCP, com taxas de sobrevida com alta hospitalar de 21%. Em apenas 31,4% das vítimas de PCR que receberam RCP, as manobras foram iniciadas por so- corristas leigos. Em ambiente hospitalar, a incidência de paradas cardíacas é estimada em torno de 3,8/1.000 internações (Hodgetts, 2002). Se essas incidências forem projetadas para a população brasileira, pode-se estimar que no Brasil ocorrem aproximadamente 220 mil PCR ao ano, sendo 180 mil em ambiente pré-hospitalar e 40 mil em ambiente hospitalar ( Tabela 1). Tabela 1 Projeção da incidência de PCR para o Brasil Brasil Incidência de PCR Total de PCR ao ano no Brasil População 190.732.694a 95/100.000b 181.196b Número de internações em 2011 11.268.089c 3,8/1.000d 42.818d a IBGE Censo 2010; b Ambiente pré-hospitalar; c Datasus 2011; d Ambiente hospitalar PCR: parada cardiorrespiratória População total 21,4 milhões 20.520 PCR não traumáticas avaliadas pelo SME 8.622 Não iniciada RCP 3.357 RCE 7.486 Transportados ao hospital 964 Alta hospitalar vivo 11.898 Realizada manobra de RCP 4 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Dados brasileiros podem ser obtidos de um estudo observacional prospectivo da cidade de Porto Alegre (Semensato et al., 2011) que analisou 593 atendimentos por PCR não traumática, dos quais 260 foram submetidos a manobras de RCP. Dos 332 pacientes que não receberam RCP, a maior justificativa para não iniciar RCP foi a presen- ça de sinais evidentes de óbito, constatados em 290 vítimas. Nos pacientes que receberam RCP, os ritmos chocáveis foram encontrados em 65 vítimas (25% das vítimas submetidas à RCP), enquanto os ritmos não chocáveis foram encontrados em 182 vítimas (70% das vítimas submetidas à RCP). O RCE foi observado em 52 vítimas (20% das submetidas à RCP); 16 vítimas estavam vivas ao 30º dia (6%) e dez tiveram alta hospitalar (3,9%). Destas, seis (2,3%) apresentavam condições neurológi- cas adequadas (Cerebral Performance Categories Scale I e II). A presença de ritmo chocável foi o único preditor independente de sobrevida em 30 dias após a análise multivariada, enquanto PCR no domicílio foi o único preditor independente de mortalidade em 30 dias após a análise multivariada. Nesse estudo, o tempo estimado do colapso até a ativação do SME foi de quatro minutos, e a mediana do tempo de resposta foi de 13 minutos no grupo geral e de 11 minutos no grupo de sobre- viventes. RCP iniciada por leigos ocorreu em 28% dos casos. Na Figura 2, pode-se analisar o fluxograma do estudo, conforme o modelo de Utstein. Sociedade Brasileira de Cardiologia 7 Co rre nt e d a so br ev ivê nc ia Primeiro elo O primeiro elo consiste no reconhecimento rápido do colapso da vítima e na ativação imediata do SME, que em ambiente pré-hospitalar no Brasil é representado pelo Sistema de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), por meio do telefone 192. Esse primeiro elo também pode incluir a identificação precoce de sinais de alerta que podem anteceder uma PCR. Segundo elo O segundo elo consiste no início rápido da reanimação cardiopulmonar (RCP). Após a ativação do SME, a sequência de circulação, vias aéreas e respiração deve ser executada. Desde as diretrizes publicadas em 2000, mudanças têm sido feitas para aumentar o tempo e a qualidade das compressões torácicas. Leigos podem apresentar insegurança para iniciar as manobras, mesmo após treinamento. Por- tanto, devem ser orientados a iniciar pelo menos as compressões torácicas sem ventilações (hands- -only) se a vítima não responde, não se move e não respira. Existem evidências de que as compres- sões podem ser tão efetivas quanto sua combinação com ventilações. Estudos mostram aumento de chances de alta hospitalar quando uma vítima de PCR recebe RCP por socorristas leigos. A palpação de pulso pode ser realizada por profissionais da área da saúde, mas não deve demo- rar mais do 10 segundos. Na ausência de pulso, ou em casos em que exista dúvida, manobras de RCP, começando pelas compressões torácicas, devem ser iniciadas imediatamente. As compressões torácicas devem ser realizadas com 5 cm de profundidade mínima, na frequência mínima de 100 com- pressões por minuto. O tórax deve retornar à posição original após cada compressão, antes que uma nova compressão seja iniciada. As interrupções das compressões torácicas devem ser minimizadas e devem acontecer somente para intervenções como a desfibrilação. Terceiro elo O terceiro elo consiste na desfibrilação precoce. Assim que disponível, o desfibrilador automá- tico externo (DEA) deve ser empregado e a desfibrilação deve ser realizada nos casos de PCR em ritmo chocável (fibrilação ventricular [FV] ou taquicardia ventricular sem pulso [TVSP]). Quando o colapso não é presenciado e o DEA já está disponível, recomenda-se que a RCP seja realizada até que o DEA esteja carregado e pronto para o choque; assim que o DEA estiver pronto, o choque deve ser administrado. Estudos mostram que, quando a RCP é iniciada por socorristas leigos e o DEA é aplicado, as taxas de sobrevida com alta hospitalar praticamente dobram. O retorno da circulação espontânea (RCE) conseguido no local do colapso é um forte preditor de alta hospitalar com boa função neurológica. Quarto elo O quarto elo consiste no suporte avançado precoce. O suporte avançado somente poderá contri- buir para o aumento de sobrevida no atendimento de vítimas de PCR se o suporte básico tiver sido efetivo. O suporte avançado tem sua importância potencializada no atendimento de PCR em ritmos não chocáveis. Quando o ritmo inicial é chocável, a desfibrilação automática externa promovida pelo suporte básico tem grandes chances de restabelecer a circulação espontânea, principalmente nos 8 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado primeiros minutos após o colapso. Quando a vítima encontra-se em atividade elétrica sem pulso (AESP) ou assistolia, não é possível que a desfibrilação promova o RCE. As causas que levaram o paciente à PCR precisam ser identificadas e tratadas imediatamente. Nessas situações, as interven- ções avançadas, como dispositivos de via aérea avançada, drogas e diagnósticos diferenciais, são de extrema importância. Quinto elo O quinto elo consiste nos cuidados pós-PCR, que incluem continuar a pesquisa e o tratamento das causas relacionadas à PCR, os controles hemodinâmico e metabólico, os ajustes dos parâmetros ventilatórios e demais cuidados intensivos. Quando a síndrome coronariana aguda é uma das pos- síveis causas, o cateterismo cardíaco deve ser realizado nas primeiras 24 horas. Nos casos de RCE em pacientes que permanecem comatosos, a única intervenção capaz de aumentar as chances de recuperação neurológica e prevenção de sequelas hipoxêmicas cerebrais é a indução de hipotermia moderada (de 32 a 34 °C), por 12 a 24 horas. capítulo 3 9 Introdução A realização imediata de reanimação cardiopulmonar (RCP) em uma vítima de parada cardiorres- piratória (PCR), seja com RCP tradicional ou hands-only, contribui sensivelmente para o aumento das taxas de sobrevivência das vítimas. O suporte básico de vida (SBV) defi ne a sequência primária de ações para salvar vidas. Por mais adequado e efi ciente que seja um suporte avançado de vida (SAV), se as ações de suporte básico não forem re alizadas de maneira adequada, será extremamente baixa a possibilidade de sobrevivência de uma vítima de PCR. Sequência do SBV do adulto para profissionais da saúde Em uma situação de PCR, um recurso mnemônico pode ser utilizado para descrever os passos simplifi cados do atendimento em SBV: o “CABD primário”. Seu signifi cado é: checar responsividade e respiração da vítima, chamar por ajuda, checar o pulso da vítima, compressões (30 compressões), abertura das vias aéreas, boa ventilação (duas ventilações) e desfi brilação. A seguir tem-se a sequên- cia completa de atendimento a uma vítima que se encontra em colapso súbito. Suporte básico de vida no adulto PONTOS-CHAVE 1. Avaliar responsividade e checar respiração. 2. Chamar por ajuda e solicitar desfibrilador. 3. Iniciar reanimação cardiopulmonar com ênfase em compressões torácicas de alta qualidade. 4. Evitar interrupções nas compressões torácicas. 5. Desfibrilação precoce. 12 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Ciclos de 30 compressões e 2 ventilações Iniciar ciclos de 30 compressões e 2 ventilações ( Figura 4), considerando que existe um dis- positivo de barreira (p. ex., máscara de bolso para aplicar as ventilações). Compressões torácicas efe- tivas são essenciais para promover o fluxo de sangue, devendo ser realizadas em todos os pacientes com PCR. Figura 4 Realizar compressões e ventilações na relação de 30:2. Compressões torácicas Para realização das compressões torácicas ( Figura 5): ƒ Posicionar-se ao lado da vítima e manter os joelhos com certa distância um do outro para ter mais estabilidade. ƒ Afastar ou cortar a roupa da vítima que estiver sobre o tórax, deixando-o desnudo. ƒ Colocar a região hipotenar de uma mão sobre o esterno da vítima e a outra mão sobre a primeira, entrelaçando-as. ƒ Estender os braços e posicioná-los acima da vítima em um ângulo de cerca de 90º. ƒ Comprimir na frequência de, no mínimo, 100 compressões/minuto e com profundidade de, no mínimo, 5 cm. ƒ Permitir o retorno completo do tórax após cada compressão, mantendo o contato das mãos. ƒ Minimizar interrupções das compressões. ƒ Revezar com outro socorrista a cada dois minutos para evitar fadiga e compressões de má qua- lidade. Recomenda-se a utilização de equipamentos que avaliam a qualidade das compressões durante a RCP, fornecendo um bom parâmetro para os socorristas. As manobras de RCP devem ser ininterruptas, exceto nos casos a seguir: se a vítima se movimen- tar, durante a fase de análise do desfibrilador, na chegada da equipe de resgate, no posicionamento de via aérea avançada ou se houver exaustão do socorrista. Sociedade Brasileira de Cardiologia 13 Su po rte b ás ico d e v id a no a du lto Ventilação Para não retardar o início das compressões torácicas, a abertura das vias aéreas deve ser realizada somente depois de aplicadas 30 compressões. As ventilações devem ser realizadas na proporção de 30 compressões para 2 ventilações com apenas 1 segundo cada, fornecendo a quantidade de ar sufi ciente para promover a elevação do tórax. A hiperventilação é contraindicada, pois pode aumentar a pressão intratorácica e diminuir a pré- -carga, consequentemente diminuindo o débito cardíaco e a sobrevida. Além disso, aumenta o risco de insufl ação gástrica, podendo causar regurgitação e aspiração. Embora evidências de contaminação com a realização de ventilação boca a boca sejam mínimas, é indicado que o socorrista utilize mecanismos de barreira para aplicar as ventilações, como o lenço facial com válvula antirrefl uxo, máscara de bolso ou bolsa-válvula-máscara. Independentemente da técnica utilizada para aplicar ventilações, será necessária a abertura de vias aéreas, que poderá ser realizada com a manobra da inclinação da cabeça e elevação do queixo ( Fi- gura 6) e, se houver suspeita de trauma, a manobra de elevação do ângulo da mandíbula ( Figura 7). Quando o socorrista não conseguir realizar a manobra de elevação do ângulo da mandíbula e hou- ver apenas suspeita de trauma cervical, sem evidência de lesão na cabeça, deve-se utilizar a manobra de inclinação da cabeça e elevação do queixo. Ventilação com bolsa-válvula-máscara A ventilação com a bolsa-válvula-máscara deve ser utilizada com a presença de dois socorristas, um responsável pelas compressões e outro por aplicar as ventilações com o dispositivo ( Figura 8). Com uma das mãos, fazer uma letra “C” com os dedos polegar e indicador e posicioná-los acima da máscara, que, se tiver um lado mais estreito, este deve estar voltado para o nariz da vítima, e fa- zer pressão contra a face da vítima a fi m de vedá-la da melhor forma possível. Posicionar os outros três dedos na mandíbula para estabilizá-la e abrir as vias aéreas da vítima ( Figura 9). Pressionar a válvula durante 1 segundo para cada ventilação. Esse tempo costuma ser sufi ciente para produzir elevação do tórax e manter a oxigenação em pacientes sem respiração. Se estiver disponível oxigênio complementar, conectá-lo à bolsa-válvula-máscara assim que pos- sível, de modo que ofereça maior porcentagem de oxigênio para a vítima. Figura 5 Posicionamento para realização das compressões torácicas. Movimento ascendente Movimento descendente 5 cm 14 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Figura 6 Manobra de inclinação da cabeça e elevação do queixo. Figura 7 Manobra de elevação do ângulo da mandíbula. Figura 8 Dispositivo bolsa- -válvula-máscara. Figura 9 Ventilação utilizando bolsa-válvula-máscara. Sociedade Brasileira de Cardiologia 17 Su po rte b ás ico d e v id a no a du lto Figura 13 Posicionamento das pás do DEA no tórax da vítima. 6. A RCP deve ser iniciada pelas compressões torácicas imediatamente após o choque. A cada dois minutos, o DEA analisará o ritmo novamente, e poderá indicar novo choque, se necessário. Se não indicar choque, deve-se reiniciar a RCP imediatamente, caso a vítima não retome a consciência. 7. Mesmo se a vítima retomar a consciência, o aparelho não deve ser desligado e as pás não devem ser removidas ou desconectadas até que o SME assuma o caso. 8. Se não houver suspeita de trauma e a vítima já apresentar respiração normal e pulso, o socorrista poderá colocá-la em posição de recuperação; porém, deverá permanecer no local até que o SME chegue ( Figura 14). Figura 14 Posição de recuperação. Quanto ao posicionamento das pás do DEA, quatro posições são possíveis, sendo que todas elas têm a mesma efi cácia no tratamento de arritmias atriais e ventriculares: anterolateral, anteroposte- rior, esquerda-anterior infraescapular e direita-anterior infraescapular. Existem algumas situações especiais para a utilização do DEA: ƒ Portador de marca-passo ou cardioversor-desfi brilador implantável: se estiver na região indicada para aplicação das pás, afastá-las pelo menos 2,5 cm ou optar por outro posicionamento das pás (p. ex., anteroposterior), pois se estiverem muito próximas podem prejudicar a análise do ritmo pelo DEA ( Figura 15). 18 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado ƒ Pelos no tórax: remover o excesso de pelos somente da região onde serão posicionadas as pás, com uma lâmina que geralmente é encontrada no kit DEA; a alternativa é depilar a região com um esparadrapo, ou com as primeiras pás para, em seguida, aplicar um segundo jogo de pás. ƒ Tórax molhado: secar por completo o tórax da vítima; se ela estiver sobre uma poça d’água não há problema, porém se essa poça também envolver o socorrista, remover a vítima para outro local o mais rapidamente possível. ƒ Adesivos de medicamentos/hormonais: remover o adesivo se estiver no local onde serão aplica- das as pás do DEA. ƒ Crianças de 1 a 8 anos: utilizar o DEA com pás pediátricas e/ou atenuador de carga. Se o kit DEA possuir somente pás de adulto, utilizá-las; mas se o tórax for estreito, pode ser necessária a apli- cação de uma pá anteriormente (sobre o esterno) e outra posteriormente (entre as escápulas), para que não se sobreponham. As pás infantis não devem ser utilizadas em adultos, pois o cho- que aplicado será insufi ciente. ƒ Lactentes (0 a 1 ano): um desfi brilador manual é preferível, porém, se não estiver disponível, se- guir o procedimento indicado no item anterior para crianças de 1 a 8 anos. Nesse caso, o prejuízo para o miocárdio é mínimo e há bons benefícios neurológicos. O Algoritmo 1 resume as etapas do atendimento à PCR pelo profi ssional de saúde. Figura 15 Aparência do marca-passo sob a pele. Sociedade Brasileira de Cardiologia 19 Su po rte b ás ico d e v id a no a du lto Algoritmo 1 – Algoritmo central do TECA B Avaliar responsividade e respiração Realizar 1 ventilação a cada 5 segundos Reavaliar novamente a cada 2 minutos Iniciar as compressões torácicas (forte e rápido) e, se for capaz de realizar as ventilações, manter relação de 30:2 Chegada do DEA Verificar o ritmo Reiniciar a RCP pelas compressões por mais 2 minutos Administrar 1 choque e reiniciar a RCP pelas compressões por mais 2 minutos A cada 2 minutos o DEA reavaliará o ritmo Seguir as instruções do DEA Trocar o socorrista a cada 2 minutos para evitar fadiga Manter a RCP até que o SAV assuma ou que a vítima se movimente Manter o DEA ligado, com as pás conectadas Socorrista sozinho: acionar o SME primeiro e depois iniciar a RCP A exceção são os casos especiais Vítima não responde e não respira ou respiração anormal Acionar o SME e solicitar o DEA SAMU (192) ou Código de PCR Pulso ausente Chocável Não chocável Pulso presente Checar o pulso carotídeo (de 5 a 10 segundos), se profissional da saúde 22 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado 110,15 110,00 –10,00 PA 11,2032,31 PAo mmHg mmHg 1 = 1 2 = 5 –9,95 PPC = 21 mmHg Pressão da Ao Pressão do AD Figura 2 A pressão de perfusão coronariana é definida pelo gradiente entre a pressão na raiz da aorta e a pressão no átrio direito. Notar que a perfusão coronariana é mais evidente na fase de relaxamento com retorno do tórax à posição original. Figura 4 RCP com compressões torácicas contínuas. PSAo PDAo PAD 125 mmHg 0 mmHg 160 mmHg 80 mmHg 0 mmHg Aórtica Atrial direita Figura 3 Resposta hemodinâmica à compressão torácica ideal com somente 4 segundos para as ventilações. Sociedade Brasileira de Cardiologia 23 Fa to re s p ro gn ós tic os Ao analisar o tempo de colapso/desfi brilação, pode-se observar que a cada minuto do colapso do paciente até a aplicação da desfi brilação, a taxa de sobrevida é reduzida em 7 a 10% (Larsen et al., 1993). Ou seja, a cada 6 segundos que se passam até a vítima receber o atendimento adequado, 1% de chance de sobrevida é reduzido ( Figuras 5 e 6). A relação do tempo colapso-RCP com probabilidade de sobrevida dos pacientes em PCR também é marcante. Na Figura 7, pode-se observar a relação que o tempo-RCP e o tempo-desfi brilação exercem na sobrevida das vítimas. Existem curvas diferentes de probabilidade de sobrevida quando se inicia RCP com 1, 5, 10 ou 15 minutos a partir do colapso, em cada curva ainda é possível observar taxas decrescentes de probabilidade de sobrevida ao realizar desfi brilação com 5, 10, 15 e 20 minutos decorrentes do colapso da vítima. 0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 Após o 1o minuto, o sucesso diminui de 7 a 10% para cada minuto de atraso % su ce ss o Sucesso da desfibrilação depende da velocidade de aplicação Figura 5 Redução das taxas de sucesso da desfibrilação de 7 a 10% a cada minuto a partir do colapso. Fonte: Cummins et al., 1991. Figura 6 O relógio da sobrevida. Após 10 minutos para desfibrilação = chances mínimas de sobrevida A cada 6 segundos para desfibrilação = 1% menos de sobrevida A cada 60 segundos para desfibrilação = 10% menos de sobrevida 24 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Intervalo de tempo do colapso até a desfibrilação (minutos) Pr ob ab ilid ad e de so br ev id a 0 0 0,2 0,4 0,6 5 5 10 15 1 10 2015 Figura 7 Curvas de probabilidade de sobrevida com RCP iniciada em 1, 5, 10 e 15 minutos (eixo X) e desfibrilações realizadas aos 5, 10, 15 e 20 minutos (eixo Y). Fonte: adaptada de Valenzuela et al., 1997. As taxas de sobrevida com alta hospitalar são aumentadas quando a RCP é iniciada por teste- munhas e quando a RCP é associada à aplicação do desfibrilador externo automático (DEA), quase dobram. Políticas nacionais de acesso público à desfibrilação têm mostrado melhora importante das taxas de RCE com alta hospitalar, aumento da taxa de sobrevida em 30 dias e melhora do prognóstico neurológico. Outro fator que implica nas taxas de sucesso da desfibrilação é a pausa pré-choque. O tempo decorrente da interrupção das compressões até a administração do choque acima de 10 segundos pode reduzir a efetividade da desfibrilação (Edelson et al., 2006) ( Figura 8). Figura 8 Pausas nas compressões torácicas pré-desfibrilação acima de 10 segundos provocam redução de probabilidade de sucesso do choque. Pausa antecedendo o choque (segundos) ! 10 10,1 a 20 0 20 40 60 80 100 p = 0,002 94% n = 17 72% 60% n = 18 n = 10 38% n = 8 20,1 a 30 > 30 Su ce ss o do ch oq ue (% ) Sociedade Brasileira de Cardiologia 27 H ab ilid ad es p rá tic as Máscara com reservatório ƒ Características principais: alto fluxo e alta FiO 2 . ƒ FiO 2 fornecida: 6 lpm – 60%, 7 lpm – 70%, 8 lpm – 80%, 9 lpm – 90%, acima de 10 lpm – próximo de 100%. ƒ Limitações: não pode ser usada com fluxo baixo, pois ele deve ser suficiente para manter o reser- vatório totalmente inflado para evitar recirculação do ar expirado. Figura 4 Máscara com reservatório. Máscara laríngea ƒ Características principais: dispositivo avançado de vias aéreas, posicionamento supraglótico, inserção às cegas, via alternativa para via aérea difícil, pode ser utilizado por profissionais não médicos treinados. ƒ FiO 2 fornecida: variável. ƒ Limitações: não é considerada uma via aérea definitiva, não deve ser utilizada em pacientes ele- tivos com estômago cheio ou com risco elevado de broncoaspiração, obesidade mórbida ou alte- rações anatômicas supraglóticas. Figura 5 Máscara laríngea. 28 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Tubo esofagotraqueal ƒ Características principais: dispositivo avançado de vias aéreas, inserção às cegas, via alternativa para via aérea difícil e pode ser utilizado por profissionais não médicos treinados. ƒ FiO 2 fornecida: variável. ƒ Limitações: não é considerada via aérea definitiva quando está na posição esofágica, não pode ser inserido em pessoas com altura menor que 1,40 m, patologia esofageana conhecida ou histó- ria de ingestão de substâncias cáusticas. Figura 6 Tubo esofagotraqueal. Figura 7 Tubo traqueal. Tubo traqueal ƒ Características principais: via aérea definitiva. ƒ FiO 2 fornecida: variável. ƒ Limitações: intubação orotraqueal pode ser realizada apenas por médicos treinados e o procedi- mento pode ser realizado somente quando houver visualização direta das cordas vocais. Sociedade Brasileira de Cardiologia 29 H ab ilid ad es p rá tic as Dispositivo bolsa-válvula-máscara ƒ Características principais: fornece ventilações a pressão positiva; a máscara deve ser transparen- te; e a bolsa tem aproximadamente 1 a 1,5 L. ƒ FiO 2 fornecida: geralmente usada a 15 lpm, com FiO 2 de aproximadamente 100%. ƒ Limitações: necessita de treinamento para ser utilizada com a técnica adequada. Figura 8 Dispositivo bolsa- -válvula-máscara. Terapia elétrica A desfibrilação precoce é uma das intervenções relacionadas com aumento de retorno à circula- ção espontânea (RCE). O mecanismo de terapia elétrica é explicado pela despolarização do tecido envolvido no circuito de reentrada, tornando-o refratário, interrompendo a reentrada e impedindo que a arritmia continue. Esse é o mecanismo eletrofisiológico bem estabelecido para arritmias com um único circuito de reentrada, como flutter atrial, taquicardia por reentrada nodal e taquicardia ventricular monomórfica. O mecanismo eletrofisiológico pelo qual a terapia elétrica reverte arritmias com múltiplos circuitos de microrreentradas, como fibrilação atrial ou fibrilação ventricular, ainda não está bem estabelecido. Os fatores relacionados ao sucesso da terapia elétrica incluem: o tipo de onda utilizado; a posi- ção, o tamanho e o tipo de pás utilizadas; a quantidade de energia; a impedância do tórax e o tipo de arritmia do paciente; e o tempo de instalação da arritmia. Os desfibriladores disponíveis no mercado geralmente funcionam carregando um capacitor a uma determinada voltagem e aplicando uma quantidade de energia predeterminada em Joules (ener- gy-based). Outros desfibriladores, menos usados, permitem a seleção da corrente apropriada após medir a impedância torácica por meio de um teste de pulso com um capacitor a uma determinada voltagem (impedance-based). Existem ainda desfibriladores em que uma dose fixa de corrente é aplica- da, independentemente da impedância torácica e do peso corporal (current-based). Os desfibriladores podem ser classificados de acordo com os tipos de onda: monofásicos, bifá- sicos e multifásicos. Desfibriladores monofásicos Os desfibriladores monofásicos são categorizados em monofásico sinusoidal dampeado e mo- nofásico exponencial truncado. O monofásico sinusoidal dampeado tem retorno gradual ao zero, en- quanto o exponencial truncado retorna ao zero de forma abrupta. Atualmente, estão em desuso por 32 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Houve discreto aumento nas taxas de sucesso a favor de pás externas rígidas comparadas às pás adesivas na cardioversão sincronizada de pacientes com fibrilação atrial persistente. Não existem estudos comparativos com outros tipos de arritmias até o momento. Aumento significativo de corrente precisa ser utilizado para compensar a impedância torácica. Um estudo em animais mostra que até 82% da corrente é desviado para a caixa torácica, 14% para os pulmões e apenas 4% passaria pelo coração (Deale e Lerman, 1990). A impedância do tórax após choques sequenciais é minimamente reduzida e a redução acontece após alguns minutos. Durante a inspiração, a impedância do tórax aumenta em torno de 13% (Ewy e Taren, 1977). Geralmente, arritmias mais organizadas tendem a precisar de energias menores que arritmias mais desorganizadas. Isso pode ser explicado pela necessidade das arritmias mais desorganizadas precisarem de uma porção maior de miocárdio despolarizado para reversão da arritmia. Dessa for- ma, um flutter atrial precisaria de menos energia que uma fibrilação atrial para ser revertido; uma taquicardia ventricular monomórfica precisaria de energia menor que uma taquicardia ventricular polimórfica, e uma fibrilação ventricular precisaria de energia maior ainda. O tempo de instalação da arritmia seria inversamente proporcional à probabilidade de sucesso da terapia elétrica, ou seja, quanto maior o tempo de instalação da arritmia, menor a probabilidade de sucesso com cardioversão ou desfibrilação. Acesso intraósseo Os benefícios promovidos pela infusão das drogas durante reanimação cardiopulmonar (RCP) são inferiores aos benefícios das compressões torácicas e da desfibrilação. Portanto, as técnicas para estabelecer um acesso para infusão de drogas não devem atrapalhar a realização das compressões torácicas e a desfibrilação. A via preferencial para infusão de drogas é a endovenosa periférica. As drogas administradas em pacientes em parada cardiorrespiratória (PCR) devem ser seguidas de flush de 20 mL de soro fisiológi- co e o membro no qual o acesso venoso estiver localizado deverá ser suspenso por 30 a 60 segundos. As drogas só chegarão à circulação central se as compressões forem efetivas, e após 1 a 2 minutos a partir da infusão. Caso a via endovenosa periférica não esteja disponível, a primeira via alternativa é o acesso in- traósseo (IO). Os acessos intraósseos podem ser estabelecidos de forma rápida (30 a 60 segundos), segura e efetiva para infusão de drogas, cristaloides, coloides e sangue Existe aumento do uso do acesso IO, principalmente no ambiente pré-hospitalar, em situações como choque refratário, PCR, sepse, mal epilético, grandes queimados e politraumatizados. A via IO é possível por causa da presença de veias que drenam a região medular dos ossos longos, que não sofrem colapso em situações de hipovolemia, pois são sustentadas pela matriz óssea. Os acessos mais usados são a tíbia proximal (veia poplítea), fêmur distal (veia femoral), maléolo medial da tíbia (veia safena magna) e úmero proximal (veia axilar). Outros acessos menos utilizados incluem a região anterossuperior da espinha ilíaca, clavícula e rádio distal. Todos os tipos de medicamentos e fluidos administrados por via endovenosa podem ser adminis- trados por via IO. A única consideração é que a infusão da adenosina pode ser menos efetiva por essa via para reversão de arritmias. A velocidade de infusão é semelhante ao de um cateter 21G. Casos de infusão de contraste e trombolíticos por via IO já foram descritos na literatura. Após estabelecer o acesso, um flush com 20 mL de soro fisiológico também é necessário para otimizar o fluxo. Os flushes de 20 mL de soro fisiológico devem ser realizados antes e depois da infusão de medicamentos. Sociedade Brasileira de Cardiologia 33 H ab ilid ad es p rá tic as As principais contraindicações são: fraturas prévias ou acessos IO prévios nos locais de infusão; patologias ósseas, como osteogenesis imperfecta; presença de infecção; e cardiopatias congênitas com shunt direito-esquerdo (pelo risco de embolia de medula ou embolia gordurosa). Pacientes obesos também podem apresentar impossibilidade para obtenção de acesso IO caso haja excesso de tecido subcutâneo no local de punção, com impossibilidade da agulha chegar à medula. As complicações incluem extravasamento de medicações, fratura tibial, síndrome compartimen- tal, embolia gordurosa e osteomielite. As taxas de complicações após acesso IO são inferiores a 1% (Tocantins et al., 1941). Um estudo observacional prospectivo comparou o acesso IO (com dispositivo EZ-IO) com o aces- so venoso central (veias jugular interna e subclávia), todos os pacientes foram submetidos aos dois procedimentos. O acesso IO foi obtido na primeira tentativa de forma mais frequente (90 versus 60%) e de forma mais rápida (2 versus 10 minutos) (Leidel et al., 2009). O acesso venoso central guiado por ultrassonografia (USG) também obteve altas taxas de suces- so, mas também foi mais demorado que o acesso IO. Em crianças, o acesso IO manual é mais fácil em decorrência da fina espessura cortical. Em adul- tos, o córtex mais espesso e a cavidade medular menor tornam o acesso manual mais difícil. Para facilitar e agilizar o procedimento de acesso IO em adultos, vários dispositivos foram elaborados. Identificação de arritmias Este capítulo também possui a intenção de identificação, de forma rápida e fácil, das principais arritmias presentes nos algoritmos de suporte avançado de vida (SAV). De forma prática, pode-se seguir uma sequência de cinco perguntas para facilitar a sua identifi- cação ao avaliar o ritmo no monitor (p. ex. derivação DII), como mostra a Tabela 1. Tabela 1 Identificação de arritmias em cinco passos 1 Qual a frequência cardíaca? < 60 bpm (bradicardia) 60 a 100 bpm (normal) > 100 bpm (taquicardia) 2 Tem complexo QRS? Ele é estreito ou alargado? Estreito (origem do estímulo supraventricular) Largo (provável origem ventricular do estímulo) 3 Como é o ritmo? Regular Irregular 4 Tem onda P? 5 Caso tenha onda P, qual sua relação com o complexo QRS? Uma ou mais ondas P para cada QRS Intervalo PR: normal, aumentado, variável 34 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Figura 12 Ritmo sinusal (FC = 80 bpm). A Figura 12 mostra um ritmo com frequência cardíaca (FC) normal (FC = 80 bpm), que pode ser visualizada no monitor ou utilizando-se a fórmula: FC = 1.500/distância em milímetro entre duas ondas R de um ritmo regular. Figura 13 Bradicardia sinusal (FC = 40 bpm). Figura 14 Taquicardia sinusal (FC = 120 bpm). Observa-se que o complexo QRS é estreito, ou seja, tem sua duração menor que 120 ms (dado que cada milímetro do papel de eletrocardiograma corresponde a 40 ms, o complexo é considerado estreito se tiver duração menor que 3 mm), indicando origem supraventricular do estímulo. O ritmo é regular. Há uma onda P facilmente visível precedendo cada complexo QRS. Trata-se, portanto, de um ritmo sinusal. As Figuras 13 e 14 mostram ritmos semelhantes ao da Figura 12, porém com FC baixa na Figura 13 (bradicardia sinusal – BS) e alta na Figura 14 (taquicardia sinusal – TS). Deve-se lembrar que, na TS, é necessário tratar a causa que levou o paciente a apresentá-la (hipóxia, ansiedade, dor ou febre). Para a análise das taquiarritmias, pode-se dividi-las, inicialmente, de acordo com a origem pro- vável do estímulo, em taquicardias de complexo estreito (taquicardias supraventriculares – TSV) e de complexo largo (taquicardias de provável origem ventricular). As TSV podem, ainda, ser divididas nas de ritmo regular (intervalo RR constante) e irregular (intervalo RR variável). Figura 15 Taquicardia supraventricular regular (FC = 200 bpm). Na Figura 15, há um exemplo de taquicardia supraventricular regular, porém não é possível identificar, facilmente, a onda P nem a arritmia específica (taquicardia atrial ectópica, flutter atrial, taquicardia juncional ou taquicardia por mecanismo de reentrada). Para identificação mais precisa das taquicardias supraventriculares regulares, pode-se utilizar manobra vagal ou adenosina, com o intuito de diminuir a condução do estímulo pelo nó atrioventri- cular e facilitar a identificação específica do ritmo. Sociedade Brasileira de Cardiologia 37 H ab ilid ad es p rá tic as Figura 23 Taquicardia ventricular polimórfica tipo torção das pontas. Figura 24 Fibrilação ventricular. As taquicardias de complexo QRS largo regular podem ainda ser decorrentes de TSV com aber- rância de condução (p. ex. bloqueio de ramo previamente existente). Para pacientes com essa suspei- ta, a adenosina também é segura na ajuda da identificação precisa da arritmia. Entre as taquicardias de complexo irregular destaca-se a taquicardia ventricular polimórfica tipo torção das pontas ( Figura 23), associada a distúrbios hidreletrolíticos (p. ex. hipomagnesemia), canalopatias que causam QT longo congênito ou uso de drogas que prolongam o intervalo QT (exem- plos dessas drogas podem ser vistos no site http://www.qtdrugs.org). Apesar de seu ritmo eletricamente instável, a TV, mesmo polimórfica, apresenta sempre com- plexos QRS, podendo apresentar-se como TV com pulso – estando o paciente hemodinamicamente estável ou instável. Fibrilação ventricular Um dos principais ritmos a serem identificados é a fibrilação ventricular (FV). Trata-se de ritmo caótico, com ondulações irregulares e de frequência elevada, no qual não se identificam ondas P ou complexos QRS ( Figura 24). Na FV, a ausência de complexos QRS indica a ausência de sístole ventricular, portanto, ritmo in- compatível com pulso. Assim, imediatamente após sua identificação, compressões torácicas devem ser iniciadas, e a desfibrilação providenciada o mais rápido possível. Como a amplitude da oscilação da linha de base na FV é dependente dos estoques de ATP no miocárdio, a tendência, com a persistência de FV ao longo do tempo, é de que esta diminua pro- gressivamente, o que é chamado fibrilação ventricular fina ( Figura 25) que, se não tomados os devidos cuidados, pode ser confundida com assistolia. Dessa forma, ao deparar-se com uma linha isoelétrica (linha reta) no monitor, deve-se seguir a sequência de três passos (protocolo da linha reta – os três passos que podem ser lembrados pela regra mnemônica “CAGADA”): ƒ Checar os cabos: verificar se não houve desconexão de algum eletrodo do tórax do paciente ou da ligação do cabo ao monitor. ƒ Aumentar o ganho: no próprio monitor/desfibrilador, apertar o botão correspondente a ganho (size, tamanho em inglês) e aumentar até o máximo. ƒ Trocar a derivação: em geral, o paciente está monitorizado em DII, portanto, trocar para DI ou DIII para avaliar se houve aparecimento de FV. 38 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Figura 25 Fibrilação ventricular fina (sem aumento de ganho). Quando o paciente chega à sala de emergência em parada cardiocirculatória, a monitorização inicial deve ser feita utilizando-se as pás do desfibrilador manual, em razão da maior rapidez deste tipo de monitorização em comparação com a instalação de eletrodos. Nesse caso, a troca de deriva- ção é feita com a transposição das pás na rotação de 90 graus: passa-se da posição clavícula direita – ápice cardíaco – para a posição clavícula esquerda – porção inferior do hemitórax direito. Assim, possibilita-se a modificação do eixo de monitorização cardíaca. Durante a realização do protocolo da linha reta, pode haver aparecimento da FV ( Figura 26), com indicação imediata de desfibrilação, ou manutenção da linha reta com confirmação de assistolia ( Figura 27). Essa diferenciação é fundamental, pois, tanto a ausência de desfibrilação na FV quan- to a aplicação de desfibrilação na assistolia levam à piora significativa do prognóstico do paciente. Entre as bradicardias, destaca-se a de bloqueio atrioventricular (BAV). Figura 26 Linha isoelétrica (reta) e, após aumento do ganho, fibrilação ventricular. Figura 27 Linha isoelétrica (reta) inicialmente em derivação DII e, após checagem dos cabos, aumento do ganho e da troca de derivação (DIII), confirmação da assistolia. BAV 1o grau No BAV 1º grau, existe atraso constante na condução dos átrios para os ventrículos (intervalo PR > 20 ms), porém todas as ondas P são seguidas de complexo QRS, geralmente com intervalo RR regular ( Figura 28). Figura 28 Bloqueio atrioventricular de 1o grau. Sociedade Brasileira de Cardiologia 39 H ab ilid ad es p rá tic as Figura 29 Bloqueio atrioventricular de 2o grau Mobitz I. Figura 30 Bloqueio atrioventricular de 2o grau Mobitz II. Figura 31 Bloqueio atrioventricular de 3o grau (total). Figura 32 Ritmo de marca-passo. Figura 33 Ritmo idioventricular acelerado (RIVA). BAV 2o grau No BAV 2º grau, alguns estímulos atriais não são conduzidos para os ventrículos e algumas ondas P são bloqueadas e, portanto, não são sucedidas por complexo QRS. Geralmente apresenta intervalo RR irregular. Pode ser de dois tipos: ƒ Tipo I ou Mobitz I: presença do fenômeno de Wenckebach, com aumento progressivo do intervalo PR até que ocorra bloqueio da condução de uma onda P ( Figura 29). ƒ Tipo II ou Mobitz II: intervalo PR fixo e algumas ondas P são bloqueadas ( Figura 30). BAV 3o grau (BAV total) No BAV 3º grau (BAV total), existe dissociação atrioventricular. O intervalo entre as ondas P é constante, assim como o intervalo entre os complexos QRS, porém não existe relação entre ondas P e complexos QRS. Geralmente possui intervalo RR regular ( Figura 31). No ritmo de marca-passo, é possível visualizar espículas precedendo complexos QRS largos e intervalo RR regular ( Figura 32). O ritmo idioventricular acelerado (RIVA), uma das arritmias mais comuns após trombólise no infarto agudo do miocárdio, é um dos marcadores de reperfusão após o procedimento ( Figura 33). 42 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado quantificação do dióxido de carbono exalado no final da expiração em pacientes intubados (expresso em mmHg – PETCO 2 ), detectado pela capnografia quantitativa, pressão arterial diastólica e saturação venosa central ( Figuras 1 a 3). ET CO 2 ( m m H g) 0 40 Figura 1 Intubação esofágica. ET CO 2 ( m m H g) 0 40 Figura 2 Intubação com sucesso. 0 CO2 50 Figura 3 Retorno à circulação espontânea. Aumento abrupto da ETCO2 (fração expirada de CO2 de 15 para 35 mmHg). Existem evidências insuficientes para recomendar o momento específico e a sequência de obten- ção de acesso venoso e via aérea avançada. Muitas vezes, o momento dessas intervenções depende do número de socorristas envolvidos no atendimento, porém o atraso no início da administração de vasopressores para além dos primeiros cinco minutos de PCR, bem como a demora em instalar via aérea avançada podem estar associados a pior prognóstico. Durante a tentativa de reanimação, o socorrista deve tentar identificar a causa da PCR – diagnós- tico diferencial. Deve-se tentar obter dados, examinando o paciente ou conversando com os familia- res, que permitam definir a possível causa e a estratégia terapêutica, particularmente para as causas reversíveis de PCR. A maioria das causas de parada pode ser resumida na expressão mnemônica “5 H e 5 T”, como pode ser observado na Tabela 1. Detectar a causa da PCR pode ser difícil mesmo para profissional treinado, o que leva à necessida- de de reavaliação frequente do paciente, história e dados objetivos coletados antes do evento. Estudo que analisou a concordância entre o diagnóstico presumido pela equipe e a causa detectada em au- Sociedade Brasileira de Cardiologia 43 Su po rte a va nç ad o de vi da tópsia verificou congruência em 74,4% dos casos (Pokorna et al., 2011). Novos estudos são necessários para determinar o papel de novos instrumentos, como ecografia e ultrassonografia, durante a PCR. Tabela 1 Possíveis causas em todas as modalidades de PCR 5 H 5 T Hipóxia Tóxicos Hipovolemia Tamponamento cardíaco Hidrogênio (acidose) Tensão no tórax (pneumotórax hipertensivo) Hiper/hipocalemia Trombose coronariana (infarto agudo do miocárdio) Hipotermia Tromboembolismo pulmonar Após o RCE, os cuidados organizados pós-parada cardíaca dão ênfase a programas multidiscipli- nares com foco na otimização neurológica, hemodinâmica, ventilatória e metabólica com o objetivo de melhorar a sobrevida à alta hospitalar entre as vítimas que conseguem RCE após a parada cardía- ca dentro ou fora do hospital, como pode ser observado na Quadro 1. Quadro 1 Principais objetivos iniciais e subsequentes dos cuidados pós-PCR 1 Otimizar a função cardiopulmonar e a perfusão de órgãos vitais após o RCE 2 Transportar/transferir para um hospital apropriado ou UTI com sistema de tratamento completo pós-PCR 3 Identificar e tratar síndrome coronariana aguda e outras causas reversíveis 4 Controlar a temperatura para otimizar a recuperação neurológica 5 Prever, tratar e prevenir a disfunção múltipla de órgãos. Isso inclui evitar ventilação excessiva e hiperóxia Para o atendimento ideal da PCR, além de ênfase na RCP de boa qualidade, deve-se atentar ao papel de cada um na equipe de reanimação. O treinamento do atendimento de PCR em equipe mini- miza erros e é recomendado. Os dois princípios fundamentais do bom trabalho em equipe devem ser liderança e comunicação efetiva. Assim, a cada atendimento, deve haver um profissional que assuma o papel de líder na condução do caso. Essa pessoa deve garantir que todas as tarefas sejam compreendi- das e executadas pelos diferentes membros da equipe, incorporar novas informações, reavaliar o caso e centralizar a comunicação entre os membros da equipe. É seu papel, também, avaliar o desempenho dos colegas, garantindo RCP de boa qualidade, controle adequado da via aérea e segurança na manipu- lação do desfibrilador. Cada membro da equipe deve dominar o escopo de sua atuação, reconhecendo suas limitações. O ideal é que o líder coloque-se fora da ação, executando o mínimo de tarefas possível. A comunicação efetiva deve ser em “alça fechada”, ou seja, cada membro repete a ordem compre- endida antes de executá-la e sinaliza a ação após tê-la realizado. Intervenções construtivas pertinen- tes devem ser dirigidas ao líder, que, por sua vez, deve proporcionar aos membros da equipe espaço para sugestões durante o atendimento. Para otimizar o trabalho em equipe e o atendimento de urgências, deve-se, ao final de cada atendimento, retomar os pontos principais da condução com todos os membros, enfatizando erros e acertos, para aprimoramento con- tínuo da equipe. 44 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Tratamento da PCR conforme o ritmo FV/TVSP Quando a monitoração com desfibrilador manual revela ritmo de FV/TVSP, a prioridade deve ser a desfibrilação o mais precocemente possível, assim que disponível, uma vez que duração da arritmia é fator prognóstico para o sucesso da desfibrilação, sendo máximo se a desfibrilação ocorre em até 10 a 30 segundos do início da FV, pelo grau de organização do impulso elétrico. Considerando o am- biente intra-hospitalar, idealmente a desfibrilação deve ocorrer em até três minutos do início da PCR. As compressões torácicas devem ser mantidas até o dispositivo estar pronto para desfibrilar. O aviso para todos se afastarem deve ser claro. O socorrista que libera o choque deve certificar-se de que todos estejam realmente afastados antes de liberar a desfibrilação. As fontes de oxigênio devem ser desconectadas do paciente. Imediatamente após o choque, as compressões torácicas devem ser reiniciadas e mantidas continuamente por dois minutos, ao fim dos quais todos devem se afastar do paciente para que o ritmo seja reavaliado. Nesse momento de pausa para análise do ritmo, que não deve exceder 10 segundos, os socorristas responsáveis pelas compressões devem fazer rodízio a fim de manter a boa qualidade da RCP. Mantendo o paciente em ritmo chocável, ou seja, FV ou TVSP, nova desfibrilação deve ser aplicada, ao fim da qual as compressões devem ser retomadas por mais um ciclo de dois minutos. Durante a reanimação, devem ser consideradas drogas vasopressoras e antiarrítmicas, bem como identificar e tratar causas potencialmente reversíveis ( Algoritmo 2). Estratégias de desfibrilação Se um desfibrilador bifásico estiver disponível, a energia do choque deve ser entre 120 e 200 J, conforme as orientações do fabricante (classe I, nível de evidência B). Se o socorrista desconhece as orientações do fabricante, o choque deve ser administrado com a energia máxima disponível no apa- relho (classe IIb, nível de evidência C). Choques subsequentes devem ser com energia equivalente ou superior (classe IIb, nível de evidência B). Se um desfibrilador monofásico estiver disponível, o choque deve ser administrado com 360 J, assim como os choques subsequentes. Há duas possibilidades de posicionamento para as pás: anterolateral, posicionadas na projeção do ápice cardíaco e abaixo da clavícula direita; ou anteroposterior. Não existe tamanho ideal recomendado para a pá, mas uma super- fície maior da pá gera menor resistência e maior corrente, associando-se a menor lesão miocárdica. Não há prefe- rência de uso de pás autocolantes ou posicionadas com as mãos. Deve-se utilizar o tipo de pá que estiver disponível. Alguns estudos compararam o uso de desfibriladores com ondas bifásica e monofásica para desfibri- lação, demonstrando equivalência ou superioridade dos dispositivos de onda bifásica, sendo que, com este tipo de dispositivo, a carga de energia é menor, o que estaria associado a menor lesão miocárdica. Quanto à dose ideal de energia bifásica a ser aplicada, o estudo BIPHASIC (Stiell et al., 2007) avaliou desfibrilação de baixa energia contra alta energia bifásica em série de 221 pacientes. Obser- vou-se que os pacientes que necessitaram de múltiplos choques tiveram maior probabilidade de sucesso quando utilizadas doses mais altas. A frequência de pacientes que reverteram o ritmo após o primeiro choque foi semelhante nos dois grupos (37 e 38%). Não houve diferenças quanto a eventos adversos, como elevação de enzimas cardíacas e disfunção sistólica de ventrículo esquerdo. Recomenda-se manter as compressões torácicas enquanto se prepara o desfibrilador para o cho- que (classe I, nível de evidência B). Não há evidência suficiente para recomendar atrasar o primeiro choque para realização de RCP por 1,5 a 3 minutos (classe IIb, nível de evidência B), devendo-se realizar a desfibrilação assim que possível. Sociedade Brasileira de Cardiologia 47 Su po rte a va nç ad o de vi da AESP Retomar imediatamente as compressões torácicas Desfibrilação não indicada Linha reta no monitor Realizar protocolo para confirmar assistolia (protocolo da linha reta) Se assistolia confirmada, retomar imediatamente as compressões torácicas Desfibrilação não indicada A cada 2 minutos, nova análise do ritmo em, no máximo, 10 segundos: ƒ FV/TVSP: desfibrilação ƒ Se assistolia: retomar RCP Ritmo organizado: checar pulso ƒ Se ausente: retomar RCP. Protocolo AESP ƒ Se presente: cuidados pós- -reanimação Após retomar as compressões: monitoração com eletrodos Acesso venoso para infusão de drogas: considerar via aérea avançada Inserção não pode comprometer as manobras de RCP Checar posição clinicamente e com dispositivo secundário (capnografia quantitativa de onda) Fixar o dispositivo de vias aéreas Diagnóstico diferencial das causas que levaram à PCR Checar pulso carotídeo por 5 a 10 segundos Avaliar a responsividade da vítima Vítima irresponsiva, sem respiração ou respira anormalmente (gasping) Chamar ajuda – 192 – e solicitar DEA para ambiente extra-hospitalar Ativar o time de resposta rápida, solicitar carrinho de parada, se atendimento hospitalar Iniciar compressões torácicas de alta qualidade (mãos posicionadas no centro do tórax, frequência > 100/min, abaixar no mínimo 5 cm do tórax, permitir retorno à posição original) Após 30 compressões, abrir as vias aéreas e fazer 2 ventilações, elevando o tórax Retomar imediatamente as compressões, em ciclos de 30 compressões:2 ventilações Drogas: ƒ Adrenalina: 1 mg a cada 3-5 min Devem ser feitas em bolo, seguidas de flush de 20 mL de solução fisiológica A 1a ou 2a dose de adrenalina pode ser substituída por vasopressina 40 U Algoritmo 3 – Tratamento da PCR em assistolia ou AESP Assim que disponível, verificar o ritmo com o desfibrilador manual Afastar todos para análise do ritmo, utilizar inicialmente as pás, aplicando gel nelas 48 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Assistolia como ritmo inicial de parada está associada a prognóstico extremamente reservado, com cerca de 7% de alta hospitalar. Na maior parte das vezes, a assistolia é um evento secundário, na evolução tardia da FV, ou como via final de hipóxia prolongada, acidose ou necrose miocárdica. Uma vez que a amplitude do traçado da FV no monitor é dependente das reservas de ATP do miocárdio, a visualização de uma linha reta deve levantar duas hipóteses: assistolia ou FV fina. Como deixar de desfibrilar uma FV é inadmissível e desfibrilar assistolia piora ainda mais seu prognóstico, o diagnóstico de assistolia deve ser confirmado, verificando-se se os cabos de monitoração estão devidamente conectados, aumentando o ganho do aparelho (em ganho máximo, espera-se identificar com facilidade uma FV) e mudando a derivação de monitoração, seja no aparelho, seja mudando a po- sição das pás para abaixo da clavícula esquerda e paraesternal direita. Caso mantenha-se a linha reta, o ritmo é de assistolia. Todas essas manobras de confirmação na avaliação de uma linha reta devem ser feitas em menos de 10 segundos, pois se trata de um período em que as manobras de RCP estarão suspensas. Quando assistolia já é o ritmo em tratamento, pode-se checar apenas a posição dos cabos. Se no momento da checagem de ritmo, após dois minutos contínuos de RCP, houver um ritmo organizado no monitor, procede-se à checagem do pulso central carotídeo por 5 a 10 segundos. Caso não haja pulso palpável nesse período, identifica-se AESP. Medicações Para ritmo de assistolia ou AESP, um vasopressor, adrenalina ou vasopressina (classe IIb, nível de evidência A) pode ser administrado com o objetivo de incrementar o fluxo sanguíneo cerebral e miocárdico. O uso rotineiro de atro- pina não é recomendado (classe IIb, nível de evidência B). O benefício da adrenalina na assistolia não é bem sustentado por ensaios clínicos. Em estudo com 1.183 pacientes randomizados para receber RCP com e sem infusão de drogas, os que receberam drogas tiveram maiores taxas de sobrevida em curto prazo, mas tiveram taxas semelhantes de alta hospitalar e sobrevida em longo prazo (Olasveengen et al., 2009). O uso da vasopressina no lugar da primeira ou da segunda dose de adrenalina pode ser realizado, mas metanálise não demonstrou diferenças entre as duas para nenhum dos ritmos de PCR. Não há evidência clara de benefício terapêutico com uso rotineiro de atropina no tratamento da PCR em AESP. Numa coorte de 1.029 pacientes com PCR, considerou-se como desfecho o prognósti- co neurológico em 30 dias com uso de atropina associada à adrenalina em comparação à adrenalina isoladamente, não encontrando diferenças. Ao mesmo tempo, a sobrevida foi significativamente me- nor nos pacientes tratados com a combinação de atropina e adrenalina (SOS-KANTO, 2011). Para assistolia, em coorte de 6.419 pacientes, o RCE foi significativamente maior entre aqueles que utilizaram adrenalina e atropina (33 contra 19% com adrenalina isolada), porém a mortalidade e o prognóstico neurológico em 30 dias foram semelhantes entre os grupos. Tratamento para causas reversíveis AESP e assistolia podem ser causadas por condições reversíveis e tratadas com sucesso se essas condições forem detectadas. Durante os dois minutos de RCP, os socorristas devem pensar nos “5 H e 5 T”. Na AESP, quando existe a suspeita de tromboembolismo pulmonar a administração empírica de trombolíticos deve ser considerada (classe IIa, nível de evidência B). RCE após assistolia e AESP Iniciam-se protocolos de cuidados pós-reanimação, com reavaliação de exame clínico e monito- ração de parâmetros hemodinâmicos, ventilatórios, metabólicos e neurológicos. Sociedade Brasileira de Cardiologia 49 Su po rte a va nç ad o de vi da Cessação de esforços Não existe recomendação clara sobre momento de cessação dos esforços durante a RCP. A deter- minação de cessar esforços é difícil e deve se basear em consenso entre os membros da equipe. Al- guns instrumentos de monitoração, como ecografia durante a RCP e o valor da capnografia podem vir a ser utilizados como parâmetros para auxiliar tal decisão. Para PCR de atendimento intra-hospitalar, diversos fatores devem ser considerados: PCR presenciada ou não; estado pré-PCR; se RCE ocorreu em algum ponto do atendimento; tempo até iniciar RCP e tempo de RCP; ritmo inicial detectado. Não há regras determinadas e estas devem ser prospectivamente validadas antes de serem adotadas. Via aérea avançada Existem evidências insuficientes para definir o momento ótimo para colocação de uma via aérea avançada durante a RCP. Entretanto, existem algumas vantagens, como a eliminação de pausas das compressões torácicas para realização das ventilações e a melhora da oxigenação e da ventilação do paciente. Ainda, reduz o risco de aspiração, oferece a possibilidade de monitorar a qualidade de RCP e determinar o RCE, por meio da capnografia quantitativa de onda. Alguns estudos mostram melhor prognóstico com inserção precoce de via aérea avançada. As principais desvantagens são a provável interrupção das compressões torácicas durante a colo- cação e avaliação e o risco de intubação esofágica. Intervenções medicamentosas na RCP Diferentes intervenções medicamentosas (vasopressores, antiarrítmicos, atropina, cálcio, bicar- bonato de sódio, fibrinolíticos) e não medicamentosas (soco precordial e marca-passo) têm sido indicadas no manuseio da PCR há bastante tempo. A seguir, algumas dessas intervenções com base nas evidências científicas que lhes dão ou não suporte para o uso na RCP. Vasopressores O racional para o uso de vasopressores durante a RCP é aumentar a pressão de perfusão corona- riana, definida como a diferença entre a pressão aórtica e a pressão no átrio direito durante a fase de relaxamento (descompressão) torácico. Uma pressão de perfusão coronariana ! 15 mmHg é preditiva de RCE, correlacionando-se também com melhora da taxa de sobrevida de 24 horas em animais. No entanto, até o momento, nenhum estudo evidenciou que a administração de qualquer tipo de me- dicação vasopressora durante as manobras de RCP aumente as taxas de sobrevida na alta hospitalar com estado neurológico intacto. Adrenalina A adrenalina tem sido utilizada no manuseio da PCR, basicamente por causa de seus efeitos pres- sores alfa-adrenérgicos, possibilitando aumento das pressões de perfusão cerebral e coronariana. Contudo, apesar de seu uso de longa data e de aparentemente melhorar a sobrevida de curto prazo, não há evidências científicas de que a administração de adrenalina durante a PCR tenha efeitos fa- voráveis na sobrevida de longo prazo em seres humanos. Ademais, a dose ideal de adrenalina ainda não foi estabelecida. Assim, a adrenalina deve ser utilizada da seguinte forma durante as manobras de RCP: 52 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado estado metabólico tecidual. Ademais, o uso de bicarbonato pode ter alguns efeitos deletérios, como aumento na geração de CO 2 , exacerbando a acidose intracelular; efeito inotrópico negativo no mio- cárdio isquêmico; aumento da osmolaridade sérica e desvio da curva de dissociação da hemoglobina para a esquerda, entre outros. Maior número de estudos tem demonstrado que não existem benefícios com a administração rotineira de bicarbonato de sódio durante a PCR (classe III, nível de evidência B). Em situações espe- ciais, como acidose metabólica prévia, hipercalemia e intoxicação por antidepressivos tricíclicos, a administração de bicarbonato pode ser benéfica. Quando for usado para essas situações especiais, a dose inicial é de 1 mEq/kg (Blecic et al., 1991; Kette et al., 1991). Cálcio O cálcio tem papel importante no mecanismo celular de contração miocárdica e da musculatura lisa vascular. No entanto, embora introduzido no manuseio da PCR no início dos anos 1950, não há evidências científicas que dêem suporte ao seu uso rotineiro na RCP. Além disso, altos níveis séricos de cálcio EV podem ser deletérios para o miocárdio isquêmico, além de piorar a recuperação neuro- lógica. A administração rotineira de cálcio durante a PCR não é recomendada (classe III, nível de evidên- cia B). Seu uso pode ser considerado, na dose de 0,5 a 1 g (gluconato de cálcio 10%, 15 a 30 mL ou cloreto de cálcio 10%, 5 a 10 mL), nas seguintes condições de PCR: ƒ Hiperpotassemia. ƒ Hipocalcemia. ƒ Intoxicação por agentes bloqueadores dos canais de cálcio. Não utilizar soluções de cálcio e bicarbonato de sódio simultaneamente na mesma via de admi- nistração. Fibrinolíticos Os estudos iniciais com administração de trombolíticos durante a PCR foram promissores. En- tretanto, dois estudos clínicos não revelaram melhora na sobrevida quando administrados fibrino- líticos durante a PCR, em um deles houve inclusive aumento do risco de hemorragia intracerebral. Fibrinolíticos não devem ser administrados rotineiramente na PCR (classe III, nível de evidência B). Quando houver suspeita de embolia pulmonar ou essa for a causa da PCR, a terapêutica fibrino- lítica empírica pode ser considerada (classe IIa, nível de evidência B). Marca-passo Não existem estudos que demonstrem benefícios na sobrevida de pacientes em PCR com a colo- cação de marca-passo durante a PCR (classe III, nível de evidência B). Soco precordial O soco precordial pode ser considerado para finalização de taquicardia ventricular instável em pacientes monitorados, quando um desfibrilador não está imediatamente pronto para uso (classe IIb, nível de evidência B). Contudo, não se deve retardar a cardioversão elétrica. Não existem evi- dências para recomendar ou não o uso do soco precordial em pacientes em assistolia. As evidências disponíveis mostram que o soco precordial não é capaz de reverter FV. Sociedade Brasileira de Cardiologia 53 Su po rte a va nç ad o de vi da RCP de alta qualidade Compressões torácicas: frequência mín. 100/min; profundidade mín. 5 cm Permitir retorno completo do tórax à posição original Evitar interrupções Trocar compressor a cada 2 min Causas reversíveis Hipóxia Toxicidade Hipovolemia Pneumotórax hipertensivo Acidose (H+) Tamponamento cardíaco Hipo/hipercalemia Trombose coronariana Hipotermia Tromboembolismo pulmonar Algoritmo 4 – Algoritmo central do TECA A Chegada do desfibrilador RCE Cuidados pós-PCR Suporte ventilatório Suporte hemodinâmico Suporte neurológico Suporte metabólico Cateterismo precoce para suspeita de SCA Hipotermia terapêutica para pacientes comatosos Paciente não responsivo Não ventila/ventilações ineficientes Chamar por ajuda/Pedir desfibrilador Pré-hospitalar: SAMU – 192 Hospitalar: ativar código de PCR C: Checar pulso 5-10 s/iniciar compressões torácicas A: Abrir vias aéreas B: Ventilações compressões torácicas/ventilações = 30:2 (BVM) vias aéreas avançadas: 1 vent./6-8 s Analisar o ritmo Analisar o ritmo Chocável (FV/TV) Administrar desfibrilação Monofásico: 360 J Bifásico: 120-200 J Iniciar RCP (2 min) Epinefrina 1 mg 3-5 min Considerar amiodarona para FV/TV sem pulso refratárias Iniciar RCP (2 min) Protocolo da linha reta Epinefrina 1 mg 3-5 min Tratar causas reversíveis AESP Assistolia (realizar protocolo da linha reta) capítulo 7 54 Cuidados pós-parada cardiorrespiratória PONTOS-CHAVE 1. Evitar novos episódios de parada cardiorrespiratória (PCR). 2. Identificar e tratar as causas que levaram o paciente à PCR. 3. Promover suportes ventilatório, hemodinâmico, neurológico e metabólico. 4. Indução de hipotermia terapêutica para pacientes que conseguiram retorno à circulação espontânea, mas permanecem comatosos. 5. Indicação de cateterismo cardíaco para pacientes sem causa estabelecida de PCR quando um evento coronariano puder ser uma causa. Introdução Após uma parada cardiorrespiratória (PCR), pacientes que conseguem retorno à circulação es- pontânea (RCE) são considerados de altíssimo risco, com taxas de mortalidade hospitalar em torno de 63 a 90% (Herlitz et al., 2006; Keenan et al., 2007; Mashiko et al., 2002; Nadkarni et al., 2006; Stiell et al., 2004). As possíveis causas que levaram o paciente à PCR precisam ser identifi cadas e corrigi- das, com o objetivo de evitar sua recorrência. Embora o fator agressor inicial seja a isquemia, que ocorre no momento da PCR, lesões ocorrem durante e após a reperfusão. A síndrome pós-PCR é defi nida como um estado fi siopatológico complexo constituído pela com- binação de três situações principais: ƒ Lesões cerebrais pós-PCR. ƒ Lesões e disfunções miocárdicas pós-PCR. ƒ Resposta isquêmica/reperfusional de múltiplos órgãos. Programas de tratamento proativos devem ser implementados por equipes multidisciplinares em unidades de cuidados intensivos com suportes ventilatório, hemodinâmico, neurológico e metabó- lico otimizados. Sociedade Brasileira de Cardiologia 57 Cu id ad os p ós -p ar ad a ca rd ior re sp ira tó ria dos pacientes). Ambos são efetivos e sua vantagem sobre os métodos mais simples consiste no con- trole mais preciso e menos trabalhoso da temperatura. Uma vez atingida a temperatura selecionada, variações de temperatura devem ser evitadas, pois aumentam o risco de complicações, que podem incluir: coagulopatias, arritmias, hiperglicemia, pneumonia, sepse e hemorragias, entre outras. Sedação, bloqueio neuromuscular e medicações para prevenção de tremores devem fazer parte do protocolo. Pacientes comatosos em protocolo de indução de hipotermia podem ser levados ao laboratório de hemodinâmica. Durante hipotermia, alguns parâmetros dos exames laboratoriais podem necessitar de correções. Se a temperatura do paciente for de 33 °C, a PaCO 2 pode estar de 6 a 7 mmHg mais baixa que o valor obtido pelo equipamento. Suporte metabólico O controle glicêmico no paciente após RCE ainda é controverso. Recomenda-se que a monitora- ção glicêmica deva ser realizada de forma frequente e a hipoglicemia deve ser evitada. As estratégias de controle e os níveis que requerem o uso de insulina devem ser instituídos de acordo com a polí- tica local de cada instituição. Um alvo aceitável seria a manutenção de níveis glicêmicos buscando o objetivo de 144 mg/dL. As estratégias de controle rigoroso da glicemia falharam em mostrar be- nefícios quando comparadas a estratégias de controle glicêmico mais tolerante, provavelmente por causa dos efeitos negativos da maior incidência de hipoglicemia. Os distúrbios do potássio e magnésio devem ser prontamente corrigidos. As alterações do po- tássio estão na lista de causas reversíveis mais frequentes da PCR. A hipocalemia é frequente e au- menta a incidência de arritmias, necessitando frequentemente de reposição para manter os níveis de potássio acima de 3,5 mEq/L. A hipomagnesemia pode estar relacionada com aumento do intervalo QT e torção das pontas. A busca de um estado de euvolemia pode ser um desafio complexo em alguns pacientes. Insufi- ciência renal aguda é frequente e deve ser identificada de forma precoce. As indicações para terapia dialítica nos pacientes pós-PCR são as mesmas indicações de pacientes graves em geral. A função cardíaca pode estar deprimida após uma PCR e a reposição volêmica nem sempre é bem tolerada. Medidas profiláticas Medidas profiláticas para prevenção de pneumonia associada à ventilação mecânica, profilaxia para prevenção de úlceras de estresse e profilaxia para tromboembolismo venoso devem ser estimu- ladas. capítulo 8 58 Introdução Os sistemas de resposta rápida (SRR) ou times de resposta rápida (TRR) estão sendo cada vez mais adotados em instituições em todo o mundo, principalmente nos países mais desenvolvidos. Es- ses programas foram criados após estudos mostrarem que pacientes internados apresentam sinais fi siológicos de deterioração clínica horas antes de uma parada cardiorrespiratória (PCR) (Schein et al., 1990; Kause et al., 2004). Objetivo O objetivo dos SRR é identifi car sinais de alerta e promover o tratamento dos pacientes antes que a piora clínica aconteça, evitando a PCR. Uma vez que esta ocorra, mesmo em ambiente intra-hos- pitalar e em hospitais com expertise em atendimento de emergências, a mortalidade pode ultrapassar 80% (Peberdy et al., 2003; Ehlenbach et al., 2009). Acredita-se que a implantação de SRR possa reduzir o número de PCR e a transferência inespera- da de pacientes para unidades de cuidados intensivos, principalmente quando os SRR são associa- dos a programas de educação continuada dos profi ssionais e melhorias na rotina de monitoração de pacientes internados fora das unidades de cuidados intensivos. Sistemas de resposta rápida PONTOS-CHAVE 1. Pacientes apresentam sinais fisiológicos de deterioração clínica horas antes de apresentarem parada cardiorrespiratória (PCR). 2. Uma vez que a PCR acontece, a mortalidade pode ultrapassar 80%. 3. A estruturação dos sistemas de resposta rápida pode reduzir as taxas de PCR, apesar de não existirem evidências de redução de mortalidade hospitalar. Sociedade Brasileira de Cardiologia 59 Si ste m as d e r es po sta rá pi da Equipes A estruturação das equipes deve ser realizada de acordo com as necessidades e os objetivos de cada instituição. O sistema deve estar disponível 24 horas por dia, sete dias por semana e a resposta inicial do sistema deve acontecer em até 15 minutos. Geralmente, a equipe é composta por pelo me- nos um médico e um enfermeiro. O funcionamento do sistema é composto pelo componente aferen- te (como é feita a ativação do sistema) e pelo componente eferente (como é a resposta do sistema). A ativação do sistema pode ser desencadeada por ação do enfermeiro (nurse-led) ou do médico (physician-led). Não existem estudos comparativos entre os dois formatos. O formato com médico é um sistema com mais recursos de tratamento, mas é significativamente mais dispendioso. O sistema com enfermeiro costuma ser mais rápido e barato, no entanto, apresenta mais limitações terapêuti- cas, mais restrição de procedimentos e necessita de consultas adicionais a outros profissionais com mais frequência. Os critérios de ativação ainda não estão bem estabelecidos, e devem ser individualizados para cada instituição. Geralmente envolvem alterações básicas, como alterações de frequências cardíaca e respiratória, pressão arterial, saturação arterial de oxigênio e alterações do nível de consciência, presença de arritmias ou dor torácica. A equipe deve estar treinada para diagnosticar o problema, iniciar o tratamento emergencial e ter autonomia para solicitar transferência para unidades de cuidados mais intensivos. Considerações finais Vários estudos demonstraram redução das taxas de PCR, mas ainda não existem evidências rela- cionadas à redução de mortalidade (Hillman et al., 2005; Bellomo et al., 2004). Revisões sistemáticas e metanálises confirmaram a redução de PCR em setores fora das unidades de cuidados intensivos, mas também falharam em mostrar redução de mortalidade (Chan et al., 2010). Os pontos negativos incluem, principalmente, o custo alto e a demanda de grande quantidade de tempo dos profissionais envolvidos, com questionamentos relacionados à custo-efetividade desses programas. Também existe a possibilidade de os programas induzirem a sensação de diminuição de responsabilidade das equipes de profissionais dos setores cobertos pelos sistemas, com situações conflitantes e dúvidas relacionadas a respeito de quem é responsável pelos pacientes. 62 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Exame físico O exame físico é frequentemente normal nos pacientes com SCA, sendo mais importante para estabelecer gravidade e auxiliar em seu diagnóstico diferencial. Deve ser realizado simultaneamente com a adoção das primeiras medidas para tratamento das SCA. Provavelmente, o principal diagnós- tico diferencial a ser realizado é a dissecção aguda de aorta, na qual o tratamento anticoagulante ou com múltiplos antiplaquetários pode ser bastante danoso. A pesquisa de diferença de pulsos radiais ou de membros inferiores em relação aos superiores é de fundamental importância para identificar essa condição em alguns casos, antes mesmo da realização de exames adicionais. Durante um episódio de dor anginosa podem ser flagrados: estertores pulmonares e terceira bulha; sinais de disfunção ventricular esquerda transitória; bem como sopro sistólico transitório de regurgitação mitral, resultado da isquemia dos músculos papilares. Esses achados, quando positi- vos, indicam maior gravidade e pior prognóstico. O achado de quarta bulha, resultante de transitória disfunção diastólica, está presente em mais de 90% dos casos na vigência de isquemia aguda, embo- ra não guarde relação com prognóstico. Exames complementares Eletrocardiograma O paciente com dor torácica deve realizar um ECG em, no máximo, 10 minutos a partir de seu contato com a equipe de saúde. É particularmente importante realizá-lo durante a presença de sin- tomas. O ECG é o exame central que dividirá a SCA em SCAcsST ou SCAssST. Nele, buscam-se prin- cipalmente as seguintes alterações: ƒ Desvios significativos do segmento ST em relação ao espaço PR. ƒ Ondas T invertidas. ƒ Presença de ondas Q patológicas. Quaisquer dessas alterações devem estar presentes em duas ou mais derivações contíguas, de modo a caracterizar uma parede ventricular. As ondas Q não sugerem isquemia aguda, mas indicam IAM prévio. Como mencionado anteriormente, as SCA são divididas em dois subtipos, conforme a presença ou a ausência de elevação de segmento ST. Considera-se SCAssST a elevação em 1 mm nas deriva- ções periféricas ou 2 mm nas derivações precordiais, em duas ou mais derivações contíguas. Adicio- nalmente, considera-se IAMcsST a presença de bloqueio completo de ramo esquerdo (BRE) novo ou supostamente novo. A identificação do IAMcsST modifica a prioridade do tratamento, como será mostrado adiante. Ainda que existam critérios que permitam diferenciação do BRE antigo àquele ligado ao IAM, não é recomendada essa diferenciação em ambiente de emergência. Assim, todo paciente apresen- tando dor precordial típica com BRE novo ou supostamente novo deve ser considerado como tendo IAMcsST, com semelhante prioridade em abrir a artéria culpada. Localização da parede afetada É possível identificar ao ECG a parede provavelmente acometida e sua artéria culpada ( Ta- bela 1). Sempre que for flagrado um supradesnivelamento de parede inferior (D2, aVF e D3), faz-se necessário realizar um ECG com as derivações precordiais direitas (V3R e V4R) para identificar um Sociedade Brasileira de Cardiologia 63 Sí nd ro m es co ro na ria na s a gu da s possível IAM de ventrículo direito, o que contraindica o uso de algumas medicações e traz uma pre- ocupação adicional ao emergencista sobre o estado da pré-carga do ventrículo esquerdo. Pode ser útil também realizar as derivações V7, V8 e V9, com intuito de identificar IAM de parede posterior, especialmente se o supradesnivelamento do segmento ST de parede inferior estiver acompanhado de infradesnivelamento de parede septal. IAMssST Todo paciente com quadro clínico de SCA que não apresente supradesnivelamento conforme des- crito e não apresente BRE novo ou supostamente novo deve ser considerado como tendo SCAssST e, assim, deve ser tratado como tal. Qualquer outra alteração sugestiva de isquemia reforça a hipótese diagnóstica, mas é importante frisar que, com frequência, o ECG não mostra alterações típicas de isquemia, o que não afasta SCA, uma vez que a dor precordial define a síndrome. A existência de um ECG prévio para comparação é bastante útil em algumas situações, principal- mente nos casos de pseudonormalização do supradesnivelamento de ST e onda T e nos casos de BRE prévio. Outro conceito importante que todos os profissionais que lidam com pacientes com possível isquemia devem ter em mente é a necessidade de repetir o ECG com alguma frequência para flagrar o momento de alteração eletrocardiográfica isquêmica, especialmente quando há dor recorrente. Tabela 1 Relação entre paredes, derivações e artérias acometidas Parede Derivações Provável artéria Inferior DII, aVF e DIII Coronária direita Anterior V1-4 Anterior Anterior extensa V1-6 Anterior Lateral V5, V6, DI e aVL Circunflexa Lateral alta DI e aVL Circunflexa Septal V1 e V2 Anterior Ventrículo direito V3R ou V4R Coronária direita Marcadores de necrose miocárdica Estes marcadores distinguem AI de IAM e podem quantificar tecido miocárdico que sofreu ne- crose, além de estimar prognóstico. Existem dezenas de tipos e subtipos de marcadores de necrose miocárdica (MNM), sendo CK-MB e troponinas os mais importantes. É necessário interpretar os valores desses marcadores a partir do momento de início da dor. CK-MB A CK-MB é o marcador mais amplamente disponível. Eleva-se após 4 a 6 horas, atinge o pico em cerca de 12 a 24 horas e normaliza-se em 48 horas. Pode ser medida a atividade da CK-MB ou, com mais acurácia, a massa de CK-MB. Quando testada a atividade de CK-MB é necessário mensurar também a CPK total. A relação CK-MB atividade/CPK entre 4 e 25% sugere IAM. A CK-MB atividade é menos específica para necrose miocárdica que as troponinas, uma vez que pode estar discretamente elevada em alguns indivíduos sadios e pode se elevar em casos de lesões musculares esqueléticas, de útero, cérebro, entre outros. A CK-MB massa tem maior acurácia, assim como as troponinas. 64 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Troponinas As troponinas disponíveis para aplicação clínica são as troponinas I e T cardioespecíficas. Em geral, nenhuma delas é detectada em indivíduos sadios. O critério universal para definição de IAM é o padrão de elevação e/ou queda de concentração de troponina, com pelo menos um valor acima do percentil 99 de uma população de referência normal, na presença de características clínicas compa- tíveis com a SCA. As troponinas elevam-se a partir de 4 a 6 horas após IAM, com pico em torno de 14 a 24 horas e com normalização em 5 a 10 dias para troponina I e 10 a 14 dias para troponina T. O tra- tamento de SCA não deve ser postergado em função da espera pela elevação dos MNM. Além disso, um supradesnivelamento do segmento ST mantido em paciente com achados clínicos compatíveis praticamente confirma tratar-se de IAMcsST. A troponina é o mais sensível marcador cardíaco, servindo principalmente para prognóstico em caso de valores aumentados em 72 horas nos pacientes com IAMcsST. Nos pacientes com IAMssST e angina instável, ela se torna muito importante tanto para o diagnóstico como para o prognóstico. A recomendação de tempo de coleta da amostra de sangue, de realização do exame em laboratório central e de recebimento do resultado não deve ultrapassar mais que 60 minutos, caso contrário a indicação deve ser a utilização de aparelhos portáteis de avaliação tipo point of care na beira leito. A troponina T ultrassensível já disponível é capaz de encurtar o tempo de detecção para menos de 3 ho- ras do início dos sintomas, facilitando o diagnóstico do IAMssST e da angina instável ( Figura 1). Tempo (dias) Co nc en tra çã o de m ar ca do re s c ar dí ac os 100 x ULRR 50 x ULRR 0 1 2 3 4 5 6 7 140 Mioglobina CK-MB Troponina I Troponina T LDH DHL Figura 1 Cinética dos marcadores cardíacos. Fonte: French et al., 2004. Outros exames Outros exames laboratoriais, como hemograma com plaquetas, função renal, eletrólitos, coagu- lograma e glicemia também devem ser obtidos, pois são importantes no manejo terapêutico subse- quente do paciente com SCA. Evita-se a coleta de exames que possam requerer punção arterial, uma vez que o tratamento dessa condição requer algumas medicações antitrombóticas. Radiografia de tórax A radiografia de tórax é útil para identificar possíveis diagnósticos diferenciais da SCA, como dissecção aguda de aorta, pneumotórax espontâneo, tromboembolia pulmonar e pneumonia. Um Sociedade Brasileira de Cardiologia 67 Sí nd ro m es co ro na ria na s a gu da s Quadro 2 Escore TIMI para SCAssST Variáveis (1 ponto para cada) Idade ! 65 anos Presença de 3 ou mais fatores de risco para DAC Estenose coronariana significativa conhecida Desvio de pelo menos 0,5 mm do segmento ST Dois ou mais episódios anginosos nas últimas 24 horas Elevação de MNM Uso de ácido acetilsalicílico nos últimos 7 dias Risco de morte, novo IAM ou necessidade de revascularização em 14 dias, conforme número de pontos 0 ou 1 " 4,7% 2 " 8,3% 3 " 13,2% 4 " 19,9% 5 " 26,2% 6 ou 7 " 40,9% Tratamento Medidas gerais A primeira abordagem terapêutica ao paciente com suspeita de SCA deve ser, além de mantê-lo em repouso – se possível, em decúbito horizontal – realizar monitoração de ECG, pressão arterial não invasiva e oximetria. Deve-se, também, oferecer oxigênio e obter um acesso venoso antecubital, além de continuar colhendo, de forma dirigida, detalhes da história e do exame físico ( Quadro 3). Quadro 3 Primeira abordagem ao paciente grave: MOVE M Monitor (de ECG, PA não invasiva e oximetria de pulso) O Oxigênio V Veia (acesso venoso periférico antecubital) E Exame clínico sumário (anamnese e exame físico dirigidos à condição aguda) Quanto ao tratamento medicamentoso comum a SCAcsST ou SCAssST, pode ser útil a lembrança do acrônimo MONABCH ( Quadro 4). Muitos novos antiagregantes e antitrombóticos estão em estudo para aplicação ao tratamentos das SCA, alguns já com fase III concluída. As recomendações presentes neste capítulo restringem-se às medicações já amplamente disponíveis no Brasil. É recomendada a sedação leve para pacientes com SCA que estejam tensos ou inquietos, se não houver contraindicações, preferencialmente com benzodiazepínicos em dose baixa (p. ex., diazepam, 5 mg, a cada 8 horas). 68 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Quadro 4 Tratamento comum das SCA: MONABCH M Morfina O Oxigênio N Nitrato/nitroglicerina A Ácido acetilsalicílico B Betabloqueador C Clopidogrel (ou outros antiplaquetários) H Heparina (ou outros antitrombóticos) Obs.: a administração de medicações não necessariamente deve seguir essa ordem, além de nem sempre todos esses componentes serem indicados Oxigênio Todos os pacientes sintomáticos devem receber oxigênio durante a fase inicial do tratamento, para se obter a saturação arterial acima de 90%. Questiona-se o uso de oxigênio suplementar entre os pacientes normoxêmicos; porém, as diferentes diretrizes sugerem uso de oxigênio por cateter nasal em fluxo baixo nesses casos durante as primeiras horas. Nos casos de edema agudo de pulmão, deve ser feita breve tentativa de ventilação não invasiva com pressão positiva. Se houver comprometimento respiratório importante mantido ou colapso he- modinâmico, deve-se optar por ventilação mecânica invasiva por meio de tubo orotraqueal. Nitratos A utilização de nitratos permite a redução da pré-carga, da tensão na parede do ventrículo es- querdo e, consequentemente, do consumo miocárdico de oxigênio. Além disso, promove discreta va- sodilatação coronariana. Quando a SCA é decorrente de vasoespasmo (como na angina de Prinzme- tal), a dor e a alteração eletrocardiográfica podem resolver-se rapidamente. Não há demonstração de redução de mortalidade com o uso de nitratos; no entanto, eles são altamente eficazes e constituem o grupo de escolha para o controle inicial da dor isquêmica, hipertensão e congestão pulmonar. São ainda úteis para identificação de alterações eletrocardiográficas dinâmicas. Dinitrato de isossorbida pode ser administrado inicialmente por via sublingual, em doses de 5 mg. Assim que um acesso venoso for obtido, se persistir dor ou hipertensão, nitroglicerina pode ser iniciada em lenta vazão (5 a 10 mcg/minuto com incrementos de 5 a 10 mcg, a cada 5 minutos, até alívio da dor, pressão sistólica menor do que 100 mmHg ou diminuição de 30% na pressão sistólica inicial em hipertensos, ou 10% em normotensos). Após 24 a 48 horas, o tratamento endovenoso (EV) pode ser convertido para fármacos orais, com administração assimétrica ao longo do dia, no sentido de evitar tolerância (p. ex., às 8, 14 e 20 horas). Nitratos podem causar cefaleia e hipotensão. É importante destacar que nitratos não devem ser indicados a pacientes que utilizaram inibidores da fosfodiesterase (sildenafil, tadalafil ou vardenafil) para tratamento de disfunção erétil nas últimas 24 a 48 horas, já que essa asso- ciação pode levar à hipotensão prolongada e grave, com risco de hipofluxo coronariano, piora da angina e infarto. Sociedade Brasileira de Cardiologia 69 Sí nd ro m es co ro na ria na s a gu da s Morfina Trata-se de um potente analgésico, com potencial ação vasodilatadora, sobretudo no leito venoso. Ainda que exista análise de registro sugerindo que o uso da morfina possa aumentar a mortalidade, essa análise é sujeita a importantes vieses, de modo que sua utilização é recomendada quando há per- sistência de dor após o uso de nitrato sublingual. O fármaco promove redução de pressão arterial, da pré-carga, do consumo miocárdico de oxigênio e dos sintomas congestivos, sendo, portanto, de grande valor nos casos de congestão pulmonar associada. Há ainda o desejado efeito ansiolítico, fundamental no cenário das SCA. Doses de 2 a 4 mg podem ser administradas e repetidas conforme necessário. Não deve ser utiliza- da em pacientes hipotensos ou bradicárdicos. Os principais efeitos colaterais são depressão respira- tória, rebaixamento do nível de consciência, hipotensão e bradicardia. Seu antagonista é o naloxone. No caso de pacientes que utilizam qualquer anti-inflamatório não esteroidal, seu uso deve ser interrompido imediatamente. Betabloqueadores A perfusão coronariana ocorre especialmente durante a diástole, já que durante a sístole a vigo- rosa contração miocárdica impede o adequado fluxo sanguíneo por esses vasos. Os betabloquea- dores aumentam o período diastólico e, consequentemente, a perfusão coronariana, diminuem o consumo miocárdico e os sintomas isquêmicos, além de facilitar o controle da hipertensão e das taquiarritmias associadas à isquemia aguda do miocárdio. Os betabloqueadores podem ser administrados por via oral (VO) ou venosa. Com os resultados do estudo COMMIT, tem sido adotada maior cautela em não reduzir muito rapidamente a frequên- cia cardíaca e evitá-los em pacientes com congestão pulmonar ou sinais de insuficiência cardíaca (IC). Assim, restringe-se o uso dos betabloqueadores venosos a pacientes com sintomas isquêmicos persistentes após uso de nitrato e morfina, importante elevação pressórica ou arritmias ventricula- res recorrentes. Prefere-se que o tratamento seja EV, com fármacos de curta duração (por exemplo, esmolol EV contínuo, na dose de 50 a 300 mcg/kg/minuto, ou metoprolol em bolo de 5 mg, seguido de doses suplementares a cada 5 minutos, até o máximo de 15 mg, se necessário). Nos demais pa- cientes, a medicação pode ser administrada VO (p. ex., propranolol, VO, na dose de 20 a 80 mg, a cada 6 a 8 horas). Contraindicações Os betabloqueadores não são indicados a pacientes com broncoespasmo, bradicardia, congestão pulmonar, bloqueio atrioventricular, pressão arterial sistólica menor do que 90 mmHg ou redução de 30 mmHg em relação à pressão basal. A doença arterial periférica não costuma ser uma contraindi- cação nesse cenário, em que o uso desse medicamento é tão importante. Os bloqueadores de canais de cálcio podem substituir os betabloqueadores quando estes forem contraindicados por broncoespasmo ou em casos de angina de prinzmetal. Além disso, podem ser úteis como adjuvantes no controle pressórico ou em raros casos de isquemia refratária. Os não di-hi- dropiridínicos (diltiazem e verapamil) agem inibindo inotropismo e cronotropismo cardíacos e, por isso, são priorizados nas SCA. Verapamil e diltiazem, no entanto, devem ser evitados em pacientes com bradicardia ou bloqueio atrioventricular. Se houver disfunção sistólica do ventrículo esquerdo, amlodipina é a opção mais segura. Nenhum bloqueador dos canais de cálcio deve ser utilizado em pacientes hipotensos. 72 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado SC, conforme descrita para SCAssST. Antes de procedimentos cirúrgicos de grande porte, como re- vascularização do miocárdio, deve ser suspensa com antecedência de 12 horas. Um ajuste de dose é sugerido para pacientes com mais de 75 anos (0,75 mg/kg a cada 12 horas) e nefropatas graves com clearance de creatinina menor do que 30 mL/minuto (1 mg/kg a cada 24 horas). Fondaparinux O fondaparinux é um inibidor direto do fator Xa. Sua dose em IAMcsST, quando a opção for por trombólise, é de 2,5 mg, EV, seguida da mesma dose, SC, ao dia durante a hospitalização – a dose terapêutica é a mesma dose profilática de trombose venosa profunda. Em SCAssST não é necessária a administração EV. Aparenta ser uma droga segura quanto à redução de sangramentos maiores. No entanto, apresenta risco de trombose de cateter quando realizada intervenção percutânea e, por isso, deve receber reforço com HNF (50 a 60 U/kg, em bolo) antes desse procedimento. Não deve ser usado na angioplastia primária. Terapia de reperfusão (exclusivo para IAMcsST) Quanto mais precocemente for restaurado o fluxo sanguíneo coronariano no IAMcsST, menor será o grau de disfunção ventricular e instabilidade elétrica, minimizando o desenvolvimento de IC e o risco de morte. O limite de 12 horas após o início dos sintomas é clássico e bastante conhecido para indicação de reperfusão. Esse limite, porém, deve ser usado com cautela, já que por vezes o pa- ciente pode apresentar ciclos repetidos de reperfusão espontânea e reoclusão, manifestados clinica- mente como dor precordial reentrante, além de ser possível indicação de reperfusão (especialmente mecânica) em pacientes com sintomas mantidos entre 12 e 24 horas após o início de sintomas. Ainda existem controvérsias quanto à escolha da melhor estratégia de reperfusão nos pacientes com IAMcsST, o que reflete os avanços contínuos das terapêuticas. Para pacientes que apresentam tempo de sintomas menor do que três horas, e não havendo atraso para qualquer das estratégias, não existe evidência de superioridade em mortalidade de estratégia específica; porém, a estratégia invasiva mostra-se superior à farmacológica em apresentações mais tardias, provavelmente por con- ta da menor eficácia da fibrinólise em trombos coronarianos mais maduros. Idealmente, deve-se iniciar a administração do agente fibrinolítico em 30 minutos após a chegada do paciente ao hospital (tempo porta-agulha < 30 minutos). Por outro lado, o tempo porta-balão a ser cumprido para realização da angioplastia primária deve ser de 90 minutos. Quando o tempo previsto entre o contato médico e a angioplastia da artéria culpada for menor do que 90 minutos, dá-se preferência à estratégia invasiva. Atrasos maiores favorecem a estratégia farmacológica em termos de mortalidade, especialmente porque diversos estudos mostram benefício da trombólise pré-hospitalar em ambulâncias avançadas, o que certamente é uma boa estratégia em cidades com dificuldades de cumprir adequadamente o tempo porta-balão. Os pacientes que apresentam maior risco de mortalidade pelo IAM (como aqueles em choque cardiogênico ou Killip ! 3), ou com mais de três horas de apresentação de sintomas, obtêm maior benefício em termos de mortalidade com a intervenção percutânea, se esta não for atrasada. Quando há risco aumentado de sangramento ou contraindicações para a terapêutica fibrinolítica ( Tabela 3 e Quadro 5), também há preferência pela estratégia invasiva. Raciocínio semelhante deve ser feito quando há dúvida em relação ao diagnóstico preciso de IAMcsST, momento em que a estratégia inva- siva pode ser a preferida. O maior impedimento para a implantação de estratégia invasiva de rotina é o atraso no transporte dos pacientes para uma unidade especializada e com experiência em intervenção percutânea. Sociedade Brasileira de Cardiologia 73 Sí nd ro m es co ro na ria na s a gu da s Pacientes com IAMcsST candidatos à reperfusão geralmente são submetidos à fibrinólise ou à angioplastia primária. São indicações de revascularização cirúrgica de urgência: isquemia persisten- te ou instabilidade hemodinâmica após angioplastia ou complicações do IAM (insuficiência mitral aguda com rotura ou comunicação interventricular, por exemplo). É válido mencionar que o risco de uma cirurgia de urgência é muito maior do que uma operação eletiva, sendo que esse risco eleva-se exponencialmente na presença de isquemia ativa ou choque cardiogênico. Tabela 3 Agentes fibrinolíticos Agentes fibrinolíticos Doses Estreptoquinase 1.500.000 unidades em 60 minutos Alteplase 15 mg em bolo, seguido por 0,75 mg/kg (máximo de 50 mg) durante 30 minutos, seguido por 0,5 mg/kg (máximo de 35 mg) durante 60 minutos Tenecteplase 30 a 50 mg, em bolo, conforme peso Quadro 5 Contraindicações ao uso de fibrinolíticos Contraindicações absolutas Passado de hemorragia intracraniana em qualquer época Lesão estrutural cerebral conhecida (p. ex., malformação arteriovenosa) Neoplasia maligna intracraniana conhecida (primária ou metastática) AVE isquêmico nos últimos 3 meses (exceto AVE isquêmico agudo com menos de 3 horas de duração) Suspeita de dissecção aórtica Sangramento ativo ou diátese hemorrágica Traumatismo craniano fechado ou facial significativos nos últimos 3 meses Contraindicações relativas História de hipertensão crônica, grave ou mal controlada Hipertensão grave não controlada na apresentação (PA sistólica > 180 mmHg ou PA diastólica > 110 mmHg) História de AVE isquêmico há mais de 3 meses, demência ou patologia intracraniana não incluída nas contraindicações Reanimação cardiopulmonar traumática ou prolongada (> 10 minuto) ou cirurgia extensa (há menos de 3 semanas) Sangramento interno recente (nas últimas 2 a 4 semanas) Punções vasculares não compressíveis Para estreptoquinase/anistreplase: exposição prévia (há mais de 5 dias) ou alergia prévia a esses agentes Gravidez Úlcera péptica ativa Uso atual de anticoagulantes: quanto maior a razão normalizada internacional (RNI), maior o risco de sangramento 74 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Estratégia conservadora versus estratégia invasiva precoce (exclusivo para SCAssST) A estratégia invasiva precoce define-se pela realização rotineira de cineangiocoronariografia nas primeiras 48 horas de sintomas, mais frequentemente nas primeiras 24 horas, a fim de intervir pre- cocemente na lesão culpada. Já a estratégia conservadora consiste em manter tratamento clínico e somente seguir para cateterismo se houver recorrência de isquemia ou após um teste para estrati- ficação não invasiva. Habitualmente, a estratégia invasiva precoce é realizada entre pacientes com SCAssST estratificados como risco elevado ou intermediário, enquanto a estratégia conservadora costuma ser reservada a pacientes estratificados como de baixo risco. A cineangiocoronariografia precoce pode se tornar de indicação imediata entre pacientes com SCAssST caso ocorra uma destas três condições, a despeito de tratamento otimizado: dor refratá- ria ou recorrente; instabilidade hemodinâmica; ou instabilidade elétrica, caracterizada por arritmias ventriculares complexas. Tratamento adjuvante A terapia adjuvante não é exatamente o foco da primeira hora de atendimento do emergencista. Entretanto, como alguns pacientes permanecem por um longo período no pronto-socorro, é conve- niente que todos os emergencistas conheçam alguns princípios básicos que serão sugeridos pelo cardiologista que acompanhará o paciente. Inibidores da enzima de conversão da angiotensina (iECA) são recomendados a pacientes porta- dores de disfunção sistólica do ventrículo esquerdo, hipertensão, diabetes ou doença vascular peri- férica (cerebrovascular ou de membros inferiores). Nessa população, os iECA são capazes de redu- zir a incidência de infarto, AVE e mortalidade; portanto, devem ser introduzidos precocemente. Na presença de intolerância aos iECA (tosse persistente ou angioedema), bloqueadores dos receptores de angiotensina-II são a opção de escolha. Devem ser indicados ainda nas primeiras 24 horas após realizado todo o tratamento inicial proposto e mantida a estabilidade clínica. Deve-se iniciar por uma dose baixa, com progressiva elevação nos dias posteriores. O PROVE-IT foi um dos diversos estudos que evidenciaram o benefício da introdução de estatinas em altas doses pouco tempo após o evento agudo (atorvastatina 80 mg comparada com pravastatina 40 mg), com 16% de redução do risco combinado de morte, infarto, angina instável, revascularização e AVE (p < 0,005). No entanto, ainda não existem fortes evidências de que as estatinas devam ser iniciadas o quanto antes possível. Ainda assim, por sugestões de especialistas, recomenda-se a in- trodução de estatina nas primeiras 24 horas, de modo independente ao valor basal de LDL-c. Outras medidas específicas, como inibidores da aldosterona, podem ser necessárias fora de um contexto agudo. capítulo 10 77 Introdução A bradicardia é defi nida como a frequência cardíaca (FC) inferior a 60 batimentos por minuto (bpm). Sintomas de baixo débito cardíaco geralmente são causados por bradicardias com FC inferio- res a 50 bpm. Esse limite é individual e frequências menores do que as citadas podem ser considera- das fi siológicas para alguns pacientes e inadequadas para outros. Os pacientes assintomáticos não devem receber tratamento, pois ele é indicado somente nos ca- sos em que a bradicardia, independentemente de seu tipo ou causa, provoque redução signifi cativa da pressão arterial sistêmica com sinais clínicos de baixo débito cardíaco. As causas não cardíacas incluem uso de drogas; causas metabólicas ou endócrinas, especialmen- te na tireoide; distúrbio eletrolítico; fatores neurológicos e refl exos autonômicos; fatores situacio- nais, como repouso prolongado no leito; e autoimunidade. As causas de origem cardíaca incluem doença cardíaca isquêmica aguda ou crônica, doença car- díaca vascular, doença cardíaca valvar ou doença degenerativa primária elétrica. PONTOS-CHAVE 1. Pacientes assintomáticos com bradiarritmias devem ser monitorados e observados. 2. Sinais e sintomas de baixo débito incluem alteração do nível de consciência, hipo- tensão ou choque, congestão pulmonar e dor torácica anginosa. 3. Pacientes com sinais ou sintomas de baixo débito causados pela bradiarritmia de- vem ser tratados. 4. O tratamento medicamentoso das bradiarritmias inclui atropina, dopamina e epinefrina. 5. Em casos refratários a tratamento medicamentoso ou em bloqueios de alto grau, estimulação artificial com marca-passo transcutâneo ou transvenoso provisório pode ser necessária. Bradiarritmias 78 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Sinais e sintomas As bradicardias podem causar sintomas e sinais importantes. Alguns dos sintomas encontrados são síncope ou pré-síncope, tontura, sensação de cabeça vazia, fraqueza, fadiga, diminuição do nível de consciência, falta de ar e desconforto ou dor torácica. Os sinais incluem sudorese, congestão pulmonar detectada ao exame físico ou por radiografia, hipotensões ortostática e arterial, insuficiência cardíaca evidente ou edema pulmonar e taquicardia ventricular (TV) ou complexos ventriculares prematuros (CVP) frequentes relacionados à bradicardia. Os sintomas e sinais podem ser leves e os pacientes assintomáticos não necessitam de trata- mento. Os pacientes devem ser monitorados, à procura de sinais de deterioração. Deve-se fornecer terapia imediata para pacientes com hipotensão, convulsões e outros sinais de choque relacionados à bradicardia. Diagnóstico Do ponto de vista eletrocardiográfico, os bloqueios atrioventriculares (BAV) podem ser divididos de acordo com a gravidade e são chamados de: ƒ BAV de primeiro grau. ƒ BAV de segundo grau: – Tipo I, Mobitz I ou fenômeno de Wenckebach. – Tipo II ou Mobitz tipo II. – Avançado, tipo 2:1, 3:1 etc. ƒ BAV total (BAVT) ou de terceiro grau. BAV de primeiro grau Caracteriza-se pelo retardo na chegada do estímulo aos ventrículos. A relação atrioventricular permanece 1:1, ou seja, uma onda P para um complexo QRS. O intervalo PR é fixo, medindo mais de 0,2 segundo (200 ms). A maioria localiza-se no nó atrioventricular (NAV) e, ocasionalmente, nos átrios, raramente sen- do infranodal. É observado em indivíduos com aumento do tônus vagal, como atletas e crianças, e no caso de vômitos, manobra de Valsalva ou estímulo retal. A síndrome coronariana aguda (SCA) envolvendo a artéria coronariana direita pode afetar a circulação para o NAV, levando à isquemia e retardando a condução atrioventricular (AV). Agentes que atuam no NAV, como betabloqueadores, digitálicos e bloqueadores dos canais de cálcio, podem prolongar o intervalo PR. Em geral, os pacientes são assintomáticos e não necessitam de maiores cuidados ou de investigação mais aprofundada. Se sinais e sintomas surgirem, deve-se procurar uma causa alternativa para o bloqueio. BAV de segundo grau No BAV de segundo grau, ocorre a interrupção na condução do estímulo para os ventrículos, al- terando a relação P:QRS usual, de 1:1. No eletrocardiograma (ECG), surgem ondas P isoladas, ditas bloqueadas, também chamadas de “descasadas” pelos franceses, porque aparecem isoladas, sem o complexo QRS correspondente. Sociedade Brasileira de Cardiologia 79 Br ad ia rri tm ia s BAV de segundo grau tipo I – Mobitz I ou Wenckebach Eletrocardiograficamente, caracteriza-se pelo aumento progressivo do intervalo PR, acarretando uma onda P bloqueada, ou isolada, gerando pausa no traçado. Em torno de 85 a 90% desses blo- queios localizam-se no NAV, o restante é infranodal. Ocorre nas situações em que há aumento importante do tônus vagal, como no atleta bem condi- cionado, nas crianças e durante o repouso. Nesses casos, observa-se desaparecimento do bloqueio durante o exercício, quando o tônus simpático é aumentado e o vagal diminuído. Os fármacos que atuam no NAV, como betabloqueadores, bloqueadores dos canais de cálcio, agentes da classe III (amiodarona) e da classe IC (propafenona), prolongam sua velocidade de con- dução, causando BAV de segundo grau tipo I. O digitálico, por sua ação vagomimética e sua ação in- direta no NAV, também pode causar esse tipo de alteração. Deve-se ter atenção na associação desses fármacos, principalmente nos idosos, em função da ação sinérgica sobre o NAV. No ECG, nota-se aumento progressivo do intervalo PR e o surgimento de pausa causada por onda P bloqueada. Verifica-se a existência de agrupamentos de batimentos no ECG, separados por pausas. Isso é observado sempre que ocorre o fenômeno de Wenckebach, em qualquer nível do sistema de condução. A pausa caracteriza-se por ser menor que dois ciclos básicos menores, sendo que o PR pós-pausa é sempre igual ou menor que o intervalo PR do início de cada sequência. Sequências variadas podem ocorrer, como 3:2, 4:3 e 5:4, significando que há sempre um complexo QRS a menos, uma vez que sempre existe uma onda P bloqueada, sem o QRS correspondente. Quando o BAV é acompanhado por bloqueio de ramo, como de ramo direito ou esquerdo, a pos- sibilidade de ser uma lesão no sistema His-Purkinje é maior; ao contrário do QRS estreito, que apon- ta alteração em nível nodal. Vale ressaltar que existem exceções, ou seja, nem todo BAV de segundo grau com QRS largo está localizado no sistema His-Purkinje, e nem todo BAV com QRS estreito se origina no NAV. Tratamento Nos casos em que haja predominância do tônus vagal, como em crianças, atletas e indivíduos assintomáticos, não é necessário tratamento. Se ocorrer o bloqueio por efeito de medicamentos, como digitálicos, deve-se apenas observar e, caso se torne sintomático, retirar o agente causador. Quando o BAV ocorre em indivíduos com cardiopatia de base e durante atividades diárias, nas quais o tônus vagal é menor, a indicação de marca-passo é controversa. Nos pacientes sintomáticos, com tonturas e síncope, está indicado marca-passo. BAV de segundo grau tipo II – Mobitz tipo II É considerado de maior gravidade que o do tipo I, com mortalidade elevada. Caracteriza-se pelo aparecimento de ondas P bloqueadas, sem alteração no intervalo PR, que se mantém constante. Em geral, acompanha-se de complexo QRS largo, entretanto, pode ocorrer com QRS estreito. Localiza-se abaixo do NAV, e a evolução para o BAVT é muito frequente, conferindo prognóstico ruim. Pode localizar-se dentro do feixe de His, sendo o QRS estreito nesses casos. Quando está lo- calizado abaixo do feixe de His, o QRS é largo. A presença desse tipo de bloqueio significa doença avançada do sistema de condução. Tratamento A presença de BAV de segundo grau tipo II indica doença do sistema His-Purkinje e, mesmo as- sintomático, sua evolução para o BAVT é inevitável. Sendo assim, marca-passo cardíaco é indicado, mesmo para os pacientes assintomáticos. 82 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado Bradicardia Avaliar a estabilidade da condição clínica Identificar e tratar a causa subjacente ƒ Manter a via aérea patente; auxiliar a respiração conforme a necessidade ƒ Oxigênio (se SatO2 ! 94%) ƒ Monitor cardíaco para identificar ritmo; monitorar pressão arterial e oximetria ƒ Acesso venoso ƒ ECG de 12 derivações, se disponível; não retardar o tratamento Bradicardia persistente causando: ƒ Hipotensão/choque? ƒ Alteração aguda do estado mental? ƒ Dor torácica isquêmica? ƒ Insuficiência cardíaca aguda? ƒ Síncope? Sim Considerar: ƒ Consulta a especialista ƒ Marca-passo transvenoso Não Monitoração e observação Atropina Se atropina ineficaz: ƒ Marca-passo transcutâneo ou ƒ Infusão de dopamina ou ƒ Infusão de adrenalina Algoritmo 1 – Bradicardia Sociedade Brasileira de Cardiologia 83 Br ad ia rri tm ia s de alto grau. A atropina é útil para tratar a bradicardia sinusal sintomática e pode ser benéfica para qualquer tipo de BAV em nível nodal. A dose recomendada para a atropina na bradicardia é de 0,5 mg, EV, a cada 3 a 5 minutos, com dose máxima total de 3 mg. As doses de atropina menores que 0,5 mg, paradoxalmente, podem cau- sar lentificação adicional da FC. A administração de atropina não deve retardar a aplicação de um marca-passo transcutâneo nos pacientes com baixa perfusão. Deve utilizar-se atropina cautelosamente na presença de síndrome coronariana aguda; o aumen- to da FC pode piorar a isquemia ou aumentar a área do infarto. A atropina provavelmente será inefi- caz em pacientes que se submeteram a transplante cardíaco, pois o coração transplantado não tem inervação vagal e pode causar BAV de alto grau. Drogas alternativas Embora não sejam agentes de primeira linha para o tratamento sintomático de bradicardia, do- pamina e adrenalina são drogas alternativas que devem ser levadas em consideração quando a bra- dicardia não responder à atropina e como medida transitória, enquanto se aguarda a disponibilidade de marca-passo. Dopamina O cloridrato de dopamina tem ações alfa e beta-adrenérgicas (classe IIb, nível de evidência B). A infusão é de 2 a 10 mcg/kg/minuto, e pode ser associada à adrenalina ou administrada isoladamente. A dose deve ser titulada de acordo com a resposta do paciente e é necessário avaliar o volume intra- vascular e dar suporte, caso necessário. Adrenalina A adrenalina pode ser usada em pacientes com bradicardia sintomática ou pressão baixa e após o fracasso do uso de atropina ou de marca-passo (classe IIb, nível de evidência B). Deve-se começar a infusão à velocidade de 2 a 10 mcg/minuto e titular de acordo com a resposta do paciente. É preciso avaliar o volume intravascular e dar suporte, caso necessário. Marca-passo provisório O conhecimento da técnica de estimulação cardíaca artificial temporária é essencial para os en- volvidos no atendimento de pacientes em unidade coronariana, pós-operatório e emergência cardio- lógica, incluindo o conhecimento de indicações, técnicas, vias de acesso, cuidados pós-operatórios e risco-benefício para cada paciente, tudo isso é fundamental para uma estimulação segura e confiável. O marca-passo transcutâneo é uma intervenção para o tratamento da bradicardia sintomática. Sua aplicação deve ser considerada de forma imediata para pacientes instáveis, principalmente aqueles com bloqueio de alto grau: de segundo grau tipo II ou de terceiro grau (classe IIa, nível de evidência B). Se os sintomas cardiovasculares não forem causados pela bradicardia, o paciente pode não apre- sentar melhoras, mesmo com a colocação de um marca-passo. O marca-passo transcutâneo não é invasivo. Deve-se iniciar sua colocação imediatamente se não houver resposta à atropina, ou caso se acredite que esta não terá eficácia ou, ainda, se o paciente apresentar sintomas graves. Se o marca-passo transcutâneo não for eficaz, se não houver captura mecânica ou se causar dor não controlável, deve-se colocar um marca-passo transvenoso e considerar a possibilidade de solici- tar a avaliação de um especialista. capítulo 11 84 Taquiarritmias PONTOS-CHAVE 1. Sinais e sintomas de baixo débito incluem alteração do nível de consciência, hipoten- são ou choque, congestão pulmonar e dor torácica anginosa. 2. Pacientes com sinais ou sintomas causados pela taquiarritmia devem ser considera- dos instáveis e ser submetidos à cardioversão elétrica sincronizada imediata. 3. Taquiarritmias estáveis estreitas regulares podem ser tratadas com manobras vagais, adenosina, betabloqueadores ou bloqueadores de canais de cálcio. 4. Taquiarritmias estáveis estreitas irregulares podem ser tratadas com betabloqueado- res, bloqueadores de canais de cálcio ou antiarrítmicos (amiodarona ou propafenona). 5. Taquiarritmias estáveis largas regulares podem ser tratadas com amiodarona. Ade- nosina pode ser utilizada nos casos em que não se consegue diferenciar taquicardia ventricular (TV) monomórfica de taquicardia supraventricular com aberrância de condução. Cardioversão elétrica sincronizada pode ser considerada. 6. Taquiarritmias estáveis largas irregulares podem necessitar de avaliação de especialis- tas para o tratamento adequado de arritmias como fibrilação atrial com Wolff-Par- kinson-White (WPW) ou com aberrância de condução, TV polimórfica ou torção de pontas. Introdução Ritmo taquicárdico é aquele cuja frequência é superior a 100 batimentos por minuto (bpm). O espectro de apresen- tação das taquicardias é amplo, de casos completamente assintomáticos, identificados durante investigação para outra queixa clínica, até eventos com instabilidade hemodinâmica que podem ser fatais caso nenhuma intervenção seja realizada. A menos que esteja presente disfunção ventricular significativa, ritmos abaixo de 150 bpm raramente causam sintomas de comprometimento hemodinâmico. Em indivíduos assintomáticos, ampla gama de taquiarritmias pode ser identifi cada sem necessi- dade de qualquer tratamento específi co imediato, já que não determinam alterações clínicas. Devem, contudo, ser documentadas de modo a permitir reavaliação posterior para defi nição diagnóstica e conduta terapêutica apropriada. Para pacientes sintomáticos, o primeiro passo é defi nir se há comprometimento do débito cardía- co com consequente instabilidade hemodinâmica. Sociedade Brasileira de Cardiologia 87 Ta qu ia rri tm ia s Taquicardia QRS estreito Estável Instável QRS regular Monitoração do eletrocardiograma, pressão arterial e oximetria de pulso Oxigênio (se hipoxêmico) Acesso venoso Se sinais de instabilidade hemodinâmica Manobra vagal Se não houver reversão com a manobra vagal: ƒ 1a escolha – adenosina 6 mg em bolo ƒ 2a dose – adenosina 12 mg em bolo Se não houver reversão: ƒ 1a escolha: verapamil e diltiazem ƒ Outros: betabloqueadores/amiodarona Se cardiopatia estrutural ou disfunção ventricular: amiodarona Utilizar apenas uma droga antiarrítmica até sua dose máxima Cardioversão elétrica sincronizada ECG de 12 variações QRS irregular FA/ Flutter* * Ver texto para o tratamento da fibrilação e flutter atriais Algoritmo 1 – Abordagem terapêutica na taquicardia supraventricular 88 Treinamento de Emergências Cardiovasculares Avançado quêmico transitório (AIT) prévios (exceto se exame de imagem de carótidas não apresentar doença aterosclerótica), infarto agudo do miocárdio (IAM) nos últimos seis meses e história de arritmia ven- tricular grave (taquicardia ventricular [TV]/fibrilação ventricular [FV]). Realiza-se uma pressão estável em região inferior ao ângulo da mandíbula, na altura da cartilagem tireóidea, perto do pulso arterial carotídeo (localização do seio carotídeo) por 5 a 10 segundos. Se não houver resposta positiva, pode- -se repetir a manobra do outro lado, após dois minutos. A MSC é, em geral, segura e bem tolerada. Porém, podem ocorrer algumas complicações: hipo- tensão significativa, bradicardia com bloqueio atrioventricular (BAV) avançado e síncope, AVE, AIT e arritmias. Assim, toda MSC deve ser realizada sob monitoração eletrocardiográfica e pressórica. Por se tratar de uma resposta fisiológica do tipo “tudo ou nada”, recomenda-se que a massagem seja interrompida assim que for observado o início da redução na frequência cardíaca (FC). Adenosina A adenosina é uma droga que diminui a condução pelo NAV e promove vasodilatação coronaria- na. Possui meia-vida inferior a 5 a 10 segundos, tendo assim efeito fugaz, porém efetivo no término da maioria das taquicardias de QRS estreito. Efeitos colaterais podem ocorrer em até 60% dos casos, sendo que os principais estão listados no Quadro 2. É importante orientar previamente o pa- ciente para o fato de que poderá apresentar opressão torácica importante com sensação de “morte iminente” e informar que tais efeitos são transitórios. Quadro 2 Efeitos colaterais da adenosina Cardiovasculares Flush facial (18%) Palpitações Hipotensão Dor torácica Bradicardias (BAV de qualquer grau) Taquicardias Extrassístoles ventriculares, TV não sustentada, TV monomórfica e polimórfica (torção das pontas) Respiratórios Dispneia (12%) Hiperventilação Broncoespasmo Sistema nervoso central Cefaleia (8 a 25%) Tonturas e vertigens (20%) Parestesias As contraindicações absolutas à adenosina são: ƒ BAV de 2º ou 3º graus. ƒ Disfunção do nó sinusal. ƒ FA pré-excitada. Sociedade Brasileira de Cardiologia 89 Ta qu ia rri tm ia s Diagnóstico diferencial das taquicardias de QRS estreito A MSC e a adenosina podem produzir quatro resultados em pacientes com taquicardia de QRS estreito ( Algoritmo 2): ƒ Diminuição da atividade do nó sinusal, causando diminuição transitória da atividade atrial (pa- cientes com taquicardia sinusal). Nesses casos, a onda P fi ca evidente no traçado eletrocardio- gráfi co e o retorno da FC aos níveis basais sugere que a taquicardia seja decorrente de resposta fi siológica. ƒ O alentecimento da condução pelo NAV pode levar a BAV, podendo revelar a atividade atrial (TA e fl utter) não sinusal. ƒ Término da taquicardia por interrupção do circuito de reentrada nas taquicardias dependentes do NAV (TRN e TAV). ƒ Ausência de resposta. O diagnóstico diferencial das taquiarritmias de QRS estreito deve ser feito de forma mandatá- ria com um registro de ECG de 12 derivações e uma tira de ritmo longa. Algoritmos que levam em consideração os dados eletrocardiográfi cos de regularidade do intervalo RR, presença ou ausência de onda P, frequência atrial, morfologia de atividade atrial, intervalo RP e relação átrio-ventrículo au- xiliam no diagnóstico da taquiarritmia. Para o clínico emergencista, a conduta clínica independe do diagnóstico preciso, mas o registro eletrocardiográfi co de 12 derivações obtido previamente poderá auxiliar o cardiologista a programar investigações e tratamento posteriores. A taquicardia de QRS estreito e regular mais frequente é a TRN, que corresponde a mais de 50% dos casos; em seguida, a TAV e a TA. Algoritmo 2 – Diagnóstico diferencial das taquicardias com QRS estreito de acordo com a resposta à infusão de adenosina Administração incorreta? TV fascicular? Taquicardia sinusal TRN TAV Flutter TA Nenhuma mudança Diminuição da FC Frequência atrial maior que ventricular Término súbito Adenosina Taquicardia QRS estreiro regular
Docsity logo



Copyright © 2024 Ladybird Srl - Via Leonardo da Vinci 16, 10126, Torino, Italy - VAT 10816460017 - All rights reserved