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Genética de População humana, Notas de estudo de Genética

Genética de População humana

Tipologia: Notas de estudo

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Baixe Genética de População humana e outras Notas de estudo em PDF para Genética, somente na Docsity! BERNARDO BEIGUELMAN Genética de Populações Humanas Beiguelman , Bernardo GENÉTICA DE POPULAÇÕES HUMANAS. / Bernardo Beiguelman - Ribeirão Preto: SBG, 2008. 239p. ISBN - 978-85-89265-06-5 I. Autor. II. Título. © 2008, dos autores Direitos reservados desta edição Sociedade Brasileira de Genética Editora SBG Sociedade Brasileira de Genética Ribeirão Preto, SP Ilustração da capa: William Smellie, A Sett of Anatomical Tables, 1754. “Courtesy of Historical Collections & Services, Claude Moore Health Sciences Library, University of Virginia.” Capa cubo multimidia Coeficiente de consangüinidade e risco de anomalias recessivas. .....................................................................101 Coeficiente de endocruzamento. ..........................................................................................................................105 Coeficiente médio de endocruzamento. ...............................................................................................................108 Coeficiente de endocruzamento e genes do cromossomo X. .............................................................................. 110 Probabilidade de os filhos de casais consagüíneos serem homozigotos. ........................................................... 112 O equilíbrio de Wright. .......................................................................................................................................... 116 Componente panmíctico e componente fixo da população. ................................................................................ 119 O cálculo da proporção de filhos de casais consangüíneos entre homozigotos. .................................................121 Cálculo da proporção de filhos de casais de primos em primeiro grau entre homozigotos quando não se conhece o coeficiente médio de endocruzamento da população. .........................................................................................126 Equivalente letal. ..................................................................................................................................................130 Os casamentos consangüíneos e o aconselhamento genético. ..........................................................................132 O efeito Wahlund. .................................................................................................................................................134 Questões e respostas...........................................................................................................................................139 Referências. .........................................................................................................................................................146 CAPÍTULO 6. OS FATORES EVOLUTIVOS .......................................................................................................149 1.Mutação e seleção. ...........................................................................................................................................149 Mutações espontâneas e induzidas. ....................................................................................................................150 Mutações somáticas e gaméticas. .......................................................................................................................150 Valor adaptativo e coeficiente seletivo. ................................................................................................................151 Genes letais..........................................................................................................................................................152 Persistência média. ..............................................................................................................................................153 O equilíbrio entre mutação e seleção. ..................................................................................................................154 O cálculo da taxa de mutação. .............................................................................................................................156 Seleção contra anomalias dominantes monogênicas. .........................................................................................159 Seleção contra anomalias recessivas monogênicas. ...........................................................................................160 Seleção contra anomalias recessivas poligênicas. ..............................................................................................162 Seleção contra anomalias incompletamente recessivas. .....................................................................................164 Seleção contra heterozigotos. ..............................................................................................................................165 Seleção a favor de heterozigotos. ........................................................................................................................167 A manutenção dos polimorfismos genéticos neutros. ..........................................................................................168 A manutenção dos polimorfismos adaptativos. ....................................................................................................171 2. A deriva genética. .............................................................................................................................................176 3. Fluxo gênico de populações migrantes. ...........................................................................................................180 Mistura racial e heredopatias recessivas. ............................................................................................................184 4. O tamanho dos isolados. ..................................................................................................................................185 Questões e respostas...........................................................................................................................................187 Referências. .........................................................................................................................................................194 CAPÍTULO 7. EFEITO DA PREVENÇÃO DE DOENÇAS GENÉTICAS SOBRE AS FREQÜÊNCIAS GÊNICAS .............................................................................................................................................................197 Doenças autossômicas. .......................................................................................................................................198 Doenças ligadas ao sexo. ....................................................................................................................................202 Comentários. ........................................................................................................................................................208 Referência. ...........................................................................................................................................................210 CAPÍTULO 8. MOLÉSTIAS INFECCIOSAS E CONSTITUIÇÃO GENÉTICA DO HOSPEDEIRO ..................... 211 Suscetibilidade e resistência genética a infecções. .............................................................................................212 Quando é permissível supor um componente genético importante do hospedeiro que condiciona resistência a uma infecção? ..............................................................................................................................................................215 1. Ocorrência de indivíduos com resistência ao contágio. ...................................................................................216 2. Associação familial. ..........................................................................................................................................219 3. Maior concordância da moléstia infecciosa em gêmeos monozigóticos do que em dizigóticos. .....................224 4. Risco empírico de contrair a moléstia infecciosa correlacionado ao coeficiente de consangüinidade entre o co- municante e o foco. ..............................................................................................................................................227 5. Variação racial da prevalência ou da incidência da moléstia infecciosa. .........................................................227 6. Possibilidade de sobrepor os resultados da experimentação em animais a observações na espécie humana.................................................................................................................................................................230 7. Associação entre polimorfismos e moléstias infecciosas. ...............................................................................231 O estudo de alguns modelos. ...............................................................................................................................233 Referências. .........................................................................................................................................................236 Genética de Populações Humanas 2 3. A população está em panmixia, isto é, todos casam e os casamentos ocorrem aleatoriamente, não existindo, por conseguinte, casamentos preferenciais entre indivíduos por causa de seu genótipo, fenótipo, estratificação social ou consangüinidade. Aliás, por serem os casamentos realizados aleatoriamente, os casamentos consangüíneos podem existir, desde que ocorram aleatoriamente. 4. Todos os casais da população são igualmente férteis e geram o mesmo número de filhos. 5. Não há sobreposição de gerações na população, isto é, elas não se imbricam ao longo do tempo, porque todos os indivíduos devem ter a mesma idade ao casar. 6. Os genes da população não sofrem mutação. 7. A população não está sob pressão de seleção natural, porque todos os indivíduos são igualmente viáveis, não existindo fatores que aumentem ou diminuam a sobrevivência de indivíduos com determinado genótipo. 8. A população não recebe nem emite um fluxo gênico capaz de alterar a sua composição gênica original, porque ela não sofre miscigenação com uma população imigrante que apresenta freqüências gênicas diferentes da dela, nem há emigração diferencial, isto é, a saída de grupos de indivíduos com freqüência gênica distinta do resto da população. Consideremos, agora, que, nessa população teórica, os genótipos AA, Aa e aa, decorrentes de um par de alelos autossômicos A,a, se distribuem com a mesma freqüência nos indivíduos de ambos os sexos. As freqüências dos alelos A e a podem ser calculadas facilmente se tomarmos como ponto de partida os gametas que produziram os indivíduos da geração atual dessa população. Assim, o número de gametas com o alelo A deve ser igual ao dobro do número de indivíduos homozigotos AA dessa geração somado ao número de indivíduos heterozigotos Aa, pois cada indivíduo AA foi originado por dois gametas com o alelo A e cada indivíduo Aa foi formado por um gameta com o gene A e outro com o seu alelo a. Por raciocínio análogo conclui-se que o número de gametas com o alelo a que produziram os indivíduos da geração em estudo é igual ao dobro do número de indivíduos aa somado ao número de indivíduos heterozigotos Aa. Em vista do exposto, se chamarmos as freqüências dos alelos A e a na população respectivamente de p e q =1 - p, e simbolizarmos as freqüências dos indivíduos com 10 3 genótipos AA, Aa e aa por AA, Aa e aa, poderemos escrever que as freqüências p e q dos alelos A e a na geração em estudo são: p Aa)(2aaAa)(2AA Aa2AA +++ + = q = Aa)(2aaAa)(2AA Aa2aa +++ + Visto que o denominador dessas fórmulas, que representa a freqüência total dos alelos, isto é, A + a, pode ser escrito como 2(AA+Aa+aa), e considerando que AA+Aa+aa = 1 ou 100%, pode-se escrever, também, que: p Aa 2 1 AA 2 Aa2AA += + = q = Aa 2 1 aa 2 Aa2aa += + ou q = 1 - p Assim, por exemplo, se na geração inicial dessa população teórica os genótipos em discussão tivessem freqüências AA = 0,30, Aa = 0,50 e aa = 0,20, as freqüências p do gene A e q de seu alelo a, nessa geração, seriam iguais, respectivamente, a 55% e 45%, pois: p = 0,30 + 0,25 = 0,55 q = 0,20 +0,25 = 0,45 ou q = 1 – 0,55 = 0,45 Evidentemente, a freqüência do alelo A também pode ser obtida pela simples contagem dos indivíduos estudados. Assim, se somarmos o dobro do número de indivíduos que são homozigotos AA ao número de indivíduos que são heterozigotos Aa e dividirmos o resultado pelo dobro do total de indivíduos estudados (AA+Aa+aa), pois estamos contando genes, também obteremos a freqüência p do alelo A. A freqüência q do alelo a poderá ser obtida por intermédio de q = 1 - p ou, é claro, pela soma do dobro do número de indivíduos homozigotos aa ao número de heterozigotos Aa, que deve ser dividida pelo dobro do total de indivíduos estudados. Tomemos um exemplo numérico, considerando uma amostra de 100 indivíduos dos quais 30 têm genótipo AA, 50 genótipo Aa e 20 genótipo aa. As freqüências p e q dos alelos A e a também poderiam ser calculadas por intermédio de: p = 200 50)302( +× = 0,55 q = 200 50)202( +× = 0,45 Consideremos, agora, uma população que, na geração inicial, tem os genótipos AA, Aa e aa, respectivamente, com as freqüências 30%, 60% e 10%, o que significa 11 4 que, nessa geração inicial, A = p = 0,60 e a = q = 0,40. Considerando, ainda, que, por hipótese, a população teórica em apreço está em panmixia, as freqüências dos diferentes tipos de casais segundo os genótipos AA, Aa e aa serão aquelas calculadas na segunda coluna da Tabela 1.1-A. Por outro lado, levando em conta que todos os casais dessa população são, por hipótese, igualmente férteis, as proporções genotípicas esperadas entre os filhos dos diferentes tipos de casais são aquelas expressas nas três últimas colunas da Tabela 1.1-A, as quais mostram um total de 36% de indivíduos AA, 48% de indivíduos Aa e 16% de indivíduos aa. Esses totais permitem concluir pela validade de uma parte da lei de Hardy e Weinberg, isto é, daquela que diz que as freqüências gênicas se mantêm constantes ao longo das gerações de uma população teórica como a que estamos considerando. Tabela 1.1. Demonstração da equação do equilíbrio de Hardy e Weinberg partindo de uma população teórica panmíctica na qual, na geração inicial, os genótipos AA, Aa e aa ocorrem com freqüências iguais, respectivamente, a 30%, 60% e 10%. 1.1.A .Distribuição genotípica após uma geração de panmixia. Casais (geração inicial) Primeira geração filial Tipo Freqüência AA Aa aa AA × AA 0,30 × 0,30 = 0,09 0,09 - - AA × Aa 2× 0,30 × 0,60 = 0,36 0,18 0,18 - AA × aa 2× 0,30 × 0,10 = 0,06 - 0,06 - Aa × Aa 0,60 × 0,60 = 0,36 0,09 0,18 0,09 Aa × aa 2× 0,60 × 0,10 = 0,12 - 0,06 0,06 aa × aa 0,10 × 0,10 = 0,01 - - 0,01 Total 1,00 0,36 0,48 0,16 1.1.B. Distribuição genotípica na segunda geração filial em panmixia. Casais (1a. geração filial) Segunda geração filial Tipo Freqüência AA Aa aa AA × AA 0,36 × 0,36 = 0,1296 0,1296 - - AA × Aa 2× 0,36 × 0,48 = 0,3456 0,1728 0,1728 - AA × aa 2× 0,36 × 0,16 = 0,1152 - 0,1152 - Aa × Aa 0,48 × 0,48 = 0,2304 0,0576 0,1152 0,0576 Aa × aa 2× 0,48 × 0,16 = 0,1536 - 0,0768 0,0768 aa × aa 0,16 × 0,16 = 0,0256 - - 0,0256 Total 1,0000 0,36 0,48 0,16 Lembrete: Para o cálculo da freqüência de casais com genótipos diferentes (AA × Aa, AA × aa e Aa × aa), multiplicamos por dois o produto das freqüências desses genótipos porque temos que levar em conta o sexo dos cônjuges. Assim, por exemplo, no caso dos casais AA × Aa temos que levar em conta a probabilidade de o casal ser composto por marido AA e mulher Aa, bem como a probabilidade de o casal incluir marido Aa e mulher AA. De fato, é fácil verificar que na geração filial as freqüências p e q dos alelos A e a continuam iguais às da geração inicial, apesar de as freqüências genotípicas terem sido 12 7 Em outras palavras, se houvesse essa obediência, as populações humanas mostrariam uma fixidez genética, isto é, uma inércia evolutiva, pois não estariam sujeitas a uma série de fatores que serão estudados em detalhe em capítulos vindouros. Tais fatores são os fatores evolutivos, ou seja, aqueles capazes de alterar as freqüências gênicas (mutações, seleção natural, fluxo gênico de populações migrantes e deriva genética) e os fatores que causam o aumento de homozigose (endocruzamento ou, como nos referimos na espécie humana, casamentos consangüíneos, e subdivisão da população em grandes isolados). Evidentemente, as oito condições estabelecidas para a obtenção do equilíbrio de Hardy e Weinberg não são satisfeitas completamente por nenhuma população real, seja ela humana ou não. Aliás, o que torna possível explicar o processo evolutivo dos seres vivos em termos mendelianos é, justamente, essa desobediência ao modelo teórico apresentado no tópico anterior. Apesar de nenhuma população humana obedecer às premissas enumeradas no tópico anterior, a prática tem demonstrado, num aparente paradoxo, em numerosas populações humanas e em relação a um grande número de caracteres monogênicos que não suscitam casamentos preferenciais, como é o caso dos grupos sangüíneos, que os genótipos se distribuem de acordo com a lei de Hardy e Weinberg. Para exemplificar, tomemos os dados obtidos em amostras de cinco populações humanas a respeito dos grupos sangüíneos M (genótipo MM), MN (genótipo MN) e N (genótipo NN) do sistema MNS (Tabela 3.1). Tabela 3.1. Comparação entre as proporções genotípicas do sistema sangüíneo MNS observadas com o emprego de dois anti-soros (anti-M e anti-N) em várias amostras de populações e as esperadas em equilíbrio de Hardy e Weinberg. Os valores percentuais foram registrados entre parênteses. GENÓTIPOS FREQÜÊNCIAS GÊNICAS No. ESPERADO AMOSTRA MM MN NN Total p q σ np2 n2pq nq2 χ2(1) Ref.* Norte- Americanos 125 (31,7) 193 (49,0) 76 (19,3) 394 (100) 0,562 0,438 0,018 124,5 193,8 75,7 0,006 0,90<P<0,95 1 Holandeses 52 (27,1) 88 (45,8) 52 (27,1) 192 (100) 0,500 0,500 0,026 48 96 48 1,354 0,20<P<0,30 2 Ingleses 363 (28,4) 634 (49,6) 282 (22,0) 1279 (100) 0,532 0,468 0,010 362 637 280 0,031 0,80<P<0,90 3 Xavantes 41 (51,9) 30 (38,0) 8 (10,1) 79 (100) 0,709 0,291 0,036 39,7 32,6 6,7 0,501 0,30<P<0,50 4 Brasileiros 30 (30) 50 (50) 20 (20) 100 (100) 0,550 0,450 0,035 30,25 49,5 30,25 0,011 0,90<P<0,95 5 * 1- Wiener e Wexler, 1958; 2- Saldanha et al., 1960; 3-Race e Sanger, 1962; 4- Neel et al., 1964; 5- Beiguelman, dados não publicados. 15 8 As freqüências dos alelos M e N das cinco amostras reunidas na Tabela 3.1 podem ser estimadas a partir dos percentuais assinalados nessa tabela ou por contagem dos indivíduos. Assim, por exemplo, no caso da população norte-americana mencionada nessa tabela, a freqüência p e q dos alelos M e N pode ser obtida por intermédio de: p = MM + ½ MN = 0,317 + 0,245 = 0,562 q= NN + ½ MN = 0,193 + 0,245 = 0,438 ou q = 1 – 0,562 = 0,438 ou, por intermédio de: p = 3942 193)1252( × +× = 0,562 q = 3942 193)762( × +× = 0,438 O desvio padrão desses alelos é calculado por intermédio de σ = 2n pq onde n é o número de indivíduos, sendo, portanto, 2n o total de alelos. Obtidas as freqüências esperadas de indivíduos com grupos sangüíneos M, MN e N na hipótese de equilíbrio de Hardy e Weinberg por intermédio de p2, 2pq e q2, respectivamente, pode-se calcular o número esperado de pessoas com cada um desses grupos sangüíneos. Para tanto, basta multiplicar cada percentual pelo tamanho da amostra (n), ou seja, calcular np2, n2pq e nq2 e aplicar um teste de qui-quadrado (χ2) para averiguar se a diferença entre os números observados e os esperados é significativa ou não. Assim, por exemplo, no caso da amostra de índios xavantes da Tabela 3.1 faríamos o cálculo abaixo: Valores M MN N Total Observados (o) 41 30 8 79 Esperados (e) 39,7 32,6 6,7 79 e e)(o 2− 0,042 0,207 0,252 χ2(1) = 0,501 0,30<P<0,50 Os valores de χ2 calculados para cada uma das amostras da Tabela 3.1 tornam evidente que as diferenças entre números observados e esperados não são significativas, podendo todas as amostras serem consideradas como extraídas de populações em equilíbrio de Hardy e Weinberg quanto aos genótipos MM, MN e NN. Aqui é importante chamar a atenção do leitor para o fato de os qui-quadrados da Tabela 3.1 terem apenas um grau de liberdade, apesar de existirem três classes esperadas. É que para o cálculo das classes esperadas são necessárias duas informações, isto é, o tamanho da amostra e a freqüência de um dos alelos. Sabendo-se que o número 16 9 de graus de liberdade do qui-quadrado é igual ao número de classes esperadas menos o número necessário de informações da amostra para o cálculo das proporções nessas classes, tem-se, no caso presente, que esse número é igual a um, pois 3 - 2 = 1. Os exemplos apresentados nas Tabela 3.1, aliados a uma infinidade de outros mencionados na literatura pertinente, servem para demonstrar de modo inequívoco que, apesar de a lei de Hardy e Weinberg ser baseada em um modelo teórico, ela descreve suficientemente bem o que ocorre com grande número de genótipos nas populações reais, pelo menos em um determinado intervalo de tempo. Evidentemente, quando não se consegue demonstrar que uma amostra representa uma população em equilíbrio de Hardy e Weinberg, somos obrigados a investigar a(s) causa(s) desse desvio entre os fatores evolutivos e entre aqueles que alteram as freqüências genotípicas, como é o caso dos casamentos consangüíneos. O aparente paradoxo da aceitação da hipótese de equilíbrio de Hardy e Weinberg nas populações humanas, apesar de elas estarem sabidamente expostas a fatores que deveriam afetar esse equilíbrio, encontra explicação na acomodação relativamente rápida dessas populações em um novo equilíbrio genético, toda a vez que elas são expostas à atuação de fatores evolutivos. Por outro lado, considerando que as taxas de mutação são bastante baixas, é de se prever que, durante um intervalo relativamente longo, a maioria das características monogênicas que não servem para estimular casamentos preferenciais deve mostrar equilíbrio de Hardy e Weinberg em grandes populações, que vivem em um ambiente relativamente estável, não sujeitas a migrações intensas, nem apresentando alta taxa de casamentos consangüíneos. ESTIMATIVA DAS FREQÜÊNCIAS GÊNICAS E DE HETEROZIGOTOS DE GENES AUTOSSÔMICOS QUANDO EXISTE RELAÇÃO DE DOMINÂNCIA ENTRE OS FENÓTIPOS A comprovação da validade da lei de Hardy e Weinberg para numerosos caracteres mendelianos sem relação de dominância permite admitir que aqueles com esse tipo de relação também devem obedecer essa lei em grandes populações que vivem em um ambiente relativamente estável, não sujeitas a migrações intensas e que não apresentam alta taxa de casamentos consangüíneos. Tal extrapolação tem um valor prático notável, pois, com base nela, se conhecermos a freqüência populacional de indivíduos com fenótipo recessivo, poderemos estimar as freqüências gênicas e, por 17 12 P(Dd|D_).P(Dd|D_). 4 1 = q 2q +1 . q 2q +1 . 4 1 = 2 2 q1 q )( + = 2 1        + q q de modo que, em relação à população em apreço, essa probabilidade é igual a 5,49%, pois 2 3061 3060       , , = 0,0549. Se quiséssemos saber qual a probabilidade de um casal constituído por um cônjuge D-positivo e outro D-negativo gerar uma criança D-negativo, teríamos que levar em conta a probabilidade de o cônjuge D-positivo ser heterozigoto Dd dado que ele é D-positivo (D_). De fato, sabemos que entre os casais D-positivo × D-negativo somente podem gerar crianças D-negativo (dd), com probabilidade 2 1 , aqueles cujo cônjuge D-positivo é heterozigoto Dd. Portanto, a probabilidade de um casal composto por um cônjuge D-positivo e outro D-negativo gerar uma criança D-negativo é estimada a partir da expressão: P(Dd|D_). 2 1 = q q q 2q + =⋅ + 12 1 1 de sorte que, em relação à população de nosso exemplo, essa probabilidade é igual a 23,4%, pois 3061 3060 , , = 0,234. Quando lidamos com caracteres recessivos raros, como é o caso das heredopatias recessivas com transmissão monogênica, e sabemos que a taxa de casamentos consangüíneos na população em estudo é tão pequena que pode ser desprezada, o cálculo da probabilidade de encontro de um indivíduo heterozigoto nessa população ou entre os indivíduos normais a ela pertencentes é bem mais simples. Tomemos um exemplo para demonstrar a veracidade dessa afirmação. Consideremos que, dentre 100.000 nascimentos ocorridos em um determinado período em uma certa população caucasóide, com taxa de casamentos consangüíneos desprezível, 5 foram de crianças com o erro inato do metabolismo decorrente da falta de hidroxilase de fenilalanina, ou seja, com fenilcetonúria clássica. Como se sabe, esse erro inato do metabolismo recessivo autossômico, quando não detectado e tratado precocemente com uma dieta pobre em fenilalanina provoca deficiência mental grave. Pode-se, pois, estimar que a freqüência da fenilcetonúricos entre os recém- nascidos da população estudada (incidência) é de 5:100.000 ou 1:20.000. Visto que a 20 13 fenilcetonúria é recessiva autossômica, podemos simbolizar o genótipo por aa e escrever: aa = q2 = 00020 1 . q = 00020 1 . ≅ 141 1 ≅ 0,0071 o que permite estimar a freqüência p do alelo “normal” como sendo p = 1 – q = 141 140 e obter um desvio padrão muito pequeno (σ = 0,0016). Levando em conta que 141 140 é semelhante à unidade, a freqüência de heterozigotos Aa poderá ser estimada pelo dobro da estimativa da freqüência do alelo a, isto é, Aa = 2q ≅ 70 1 . Em outras palavras, por causa da freqüência muito alta do alelo A, não é necessário calcular 2pq = 141 1 141 140 2 ⋅⋅ para estimar a freqüência de heterozigotos, já que, calculando Aa = 2q = 141 1 2 ⋅ o resultado que se obtém é, praticamente, o mesmo, isto é, semelhante a 70 1 . O valor obtido por intermédio de 2q também serve para estimar a probabilidade de um indivíduo normal da população ser heterozigoto de um gene raro que, em homozigose, determina uma anomalia. Em outras palavras, para estimar essa probabilidade não é necessário calcular a probabilidade condicional P(Aa|A_) = q1 2q + , porque, por intermédio dessa fórmula, chegar-se-á a uma estimativa semelhante àquela que é dada por 2q. De fato, empregando os dados de nosso exemplo sobre fenilcetonúria clássica, tem-se que, se a probabilidade de um indivíduo normal da população for calculada a partir de P(Aa|A_) = q1 2q + , obter-se-á um número muito semelhante a 70 1 : 71 1 142 2 141 1 1 141 2 == + AS RELAÇÕES ENTRE AS FREQÜÊNCIAS ALÉLICAS E GENOTÍPICAS EM POPULAÇÕES EM EQUILÍBRIO DE HARDY E WEINBERG A discussão feita no tópico anterior a respeito da estimativa da freqüência de heterozigotos de genes autossômicos serve, também, para ressaltar que, à medida que 21 14 diminui a freqüência do alelo determinador do fenótipo recessivo, maior se torna a razão entre a freqüência de heterozigotos e homozigotos recessivos, isto é, a razão aa Aa . Realmente, no exemplo sobre a freqüência de fenilcetonúricos podemos verificar que a proporção de heterozigotos do gene da fenilcetonúria clássica é, praticamente, 286 vezes maior do que a de fenilcetonúricos, pois, dentre cada 70 indivíduos da população em estudo, um é heterozigoto, enquanto que a proporção de fenilcetonúricos é de um em cada 20.000 indivíduos. Já em relação aos indivíduos D-positivo e D-negativo de nosso outro exemplo pode-se constatar que a freqüência de heterozigotos Dd é apenas cerca de 4,5 vezes maior do que a de homozigotos dd, pois os primeiros ocorrem com freqüência igual a 42,47% e os últimos com freqüência igual a 9,37%. A Fig.1.1 mostra, graficamente, as relações entre as freqüências p e q de dois alelos autossômicos designados por A e a, e as freqüências genotípicas (AA, Aa e Aa) em populações em equilíbrio de Hardy e Weinberg. Essa figura deixa claro que, se uma população estiver em equilíbrio de Hardy e Weinberg, a freqüência máxima de heterozigotos (Aa) é de 50% ou 0,5, e que isso ocorre quando os dois alelos têm a mesma freqüência, isto é, p = q = 0,5. Nessa situação, os homozigotos têm a mesma freqüência, que é igual a 25% (AA = aa = 0,25). Por aí se vê que, a respeito da geração inicial do exemplo dado na Tabela 1.1, podemos dizer, de imediato, que ela não representa uma população em equilíbrio de Hardy e Weinberg, já que nela, os heterozigotos Aa aparecem com freqüência igual a 60%. Nesse exemplo da Tabela 1.1, a distribuição dos genótipos AA : Aa : aa :: 30% :60% :10% foi proposital, para deixar claro que uma única geração de panmixia é suficiente para que a população passe a mostrar equilíbrio de Hardy e Weinberg. 22 17 QUESTÕES E RESPOSTAS Q 1. O sangue de 200 indivíduos coletados aleatoriamente em uma população foi estudado eletroforeticamente no intuito de determinar os tipos de haptoglobina, tendo-se observado as seguintes freqüências genotípicas: Hp 1 Hp 1 = 32%; Hp1Hp2 = 46%; Hp2Hp2 = 22% Com base nesses dados estimar as freqüências dos alelos autossômicos Hp1 e Hp 2 na população representada por essa amostra e o desvio padrão. R 1. Hp1 = p = 0,32 + 0,23 = 0,55 Hp 2 = q = 1 – 0,55 = 0,45 σ = 0,025 Q 2. A amostra da questão anterior pode ser considerada como representativa de uma população em equilíbrio de Hardy e Weinberg? R 2. Sim, porque χ2 (1) = 0,999; 0,30<P<0,50. Q 3. Qual o percentual de casais heterozigotos Hp1Hp2 × Hp1Hp2 que devemos esperar na população representada pela amostra da questão número 1? R 3. 24,5%, pois: Hp 1 Hp 2 = 2pq = 2 × 0,55 × 0,45 = 0,495 Hp 1 Hp 2 × Hp1Hp2 = 0,495 × 0,495 = 0,245 Q 4. Em uma população 70% dos indivíduos apresentam o genótipo AA e 30% o genótipo aa, sendo os alelos A e a genes autossômicos. Com base nesses dados pergunta-se: a) Qual a freqüência dos alelos A e a ? b) A população está em equilíbrio de Hardy e Weinberg? c) Qual a distribuição genotípica esperada em equilíbrio de Hardy e Weinberg? R 4. a) A = p = 0,70; a = q = 0,30 b) Não e nem é preciso fazer qualquer teste para demonstrar isso, porque essa população não apresenta heterozigotos. c) AA = 0,49; Aa = 0,42 ; aa = 0,09. Q 5. Com o emprego dos anti-soros anti-M e anti-N foram determinados os grupos sangüíneos M, MN e N de uma amostra aleatória de 100 indivíduos de uma população, encontrando-se a seguinte distribuição: M = 20%; MN = 64%; N = 16% 25 18 Visto que esses grupos sangüíneos são caracteres autossômicos e correspondem aos genótipos MM, MN e NN quer-se saber quais as estimativas das freqüências dos alelos M e N a partir dessa amostra e o seu desvio padrão. R 5. M = p = 0,52; N = q = 0,48; σ = 0,035 Q 6. Pode-se considerar que a amostra da questão anterior representa uma população em equilíbrio de Hardy e Weinberg quanto aos grupos sangüíneos M, MN e N? R 6. Não, porque χ2(1) = 7,955; P< 0,01. Q 7. Ao estudar a distribuição dos grupos sangüíneos M, MN e N em uma amostra aleatória de indivíduos de uma população verificou-se a relação NM MN × = 2. O que significa essa relação? R 7. Essa relação significa que as freqüências observadas correspondem exatamente às esperadas em equilíbrio de Hardy e Weinberg, pois 22 qp 2pq × = pq 2pq = 2. Q 8. Em uma amostra de 200 pacientes com tuberculose pulmonar verificou-se que 128 eram acetiladores lentos de isoniazida, que, pelos métodos bioquímicos comuns, é um fenótipo recessivo em relação ao da acetilação rápida desse medicamento empregado no tratamento da tuberculose. Com base nesses dados estimar a freqüência do alelo que determina a acetilação lenta da isoniazida e o desvio padrão. R 8. Se q2 = 200 128 = 0,64, tem-se q = 640, = 0,80 e σ = 800 6401 ,− = 0,021. Q 9. A freqüência de indivíduos Rh-negativo (dd) em uma população é estimada em 9%. Qual a estimativa da freqüência de mulheres Rh-positivo heterozigotas (Dd) nessa mesma população? R 9. 42%, porque sendo d = q = 090, = 0,30 e D = p = 1 – 0,30 = 0,70, tem-se que Dd = 2pq = 2 ×0,70 ×0,30 = 0,42. Q 10. Em uma população cuja freqüência de indivíduos Rh-negativo (dd) é estimada em 16%, quer-se saber qual a probabilidade de um casal Rh-positivo ter um filho Rh negativo? R 10. 8,16%, porque q = 160, = 0,40 e P(Dd|D_).P(Dd|D_). 4 1 = 2 401 400       , , = 0,0816. Q 11. Em uma cidade constituída basicamente por caucasóides de origem européia mediterrânea estima-se que 1% das crianças manifestam anemia de Cooley (talassemia β homozigótica). Sabendo-se que, nessa população, a taxa de casamentos 26 19 consangüíneos é desprezível, quer-se saber, sem fazer o rastreamento de heterozigotos, qual a estimativa da freqüência, nessa população : a) do gene da talassemia β? b) de heterozigotos desse gene? c) de casais heterozigotos da talassemia β? R 11. a) q = 010, = 0,10 ou 10% b) 2pq = 0,18 ou 18%. c) 4p 2 q 2= 0,324 ou 32,4%. Q 12. Ao estudar uma amostra de 2.520 brasileiros afro-descendentes adultos não se assinalou nenhum caso de anemia falciforme (homozigose do gene da hemoglobina S, isto é, SS), mas constatou-se que 202 apresentavam o traço siclêmico. Quer-se saber: a) Qual a estimativa da freqüência do gene da hemoglobina S na população representada por essa amostra? b) Qual a incidência de anemia falciforme por 100.000 crianças afro-descendentes, que se espera nessa população, se ela estiver em equilíbrio de Hardy e Weinberg? R 12. a) S = q = 52022 202 .× = 0,04. b)160: 100.000, pois SS = q2 = 0,0016 ou P(AS ×AS) 4 1 = 0,08 ×0,08 ×0,25 = 0,0016. Q 13. A freqüência de hiperplasia congênita das supra-renais por deficiência de 11-β- hidroxilase foi estimada em 1: 10.000 entre as crianças de uma cidade. Se a taxa de casamentos consangüíneos na população dessa cidade for desprezível, qual será a estimativa da freqüência: a) do gene determinador da deficiência de 11-β -hidroxilase? b) de heterozigotos desse gene? R 13. a) q = 0,01. b)2q = 0,02. Q 14. Numa população altamente miscigenada, com predomínio do componente africano, a incidência de anemia falciforme na população é estimada em 16 por 10.000 nascimentos. Qual o risco que correm os(as) irmãos(ãs) clinicamente normais desses pacientes de gerar uma criança com anemia falciforme se vierem a casar com uma pessoa clinicamente normal da mesma população. R 14. O risco é estimado em cerca de 1 : 78. De fato, sabemos que um(a) irmão(ã) clinicamente normal de um paciente com anemia falciforme tem, a priori, a 27 22 aa1 =2qr =2 × 0,10 × 0,60 = 0,12 Tabela 1.2. Distribuição dos genótipos decorrentes de trialelismo após uma única geração de uma população teórica em panmixia. A geração inicial é constituída por indivíduos homozigotos AA (30%), aa (10%) e a1a1 (60%). Casais (geração inicial) Primeira Geração Filial Tipo Freqüência AA aa a1a1 Aa Aa1 aa1 AA × AA 0,30× 0,30 = 0,09 0,09 - - - - - AA × aa 2× 0,30× 0,10 = 0,06 - - - 0,06 - - AA × a1a1 2× 0,30× 0,60 = 0,36 - - - - 0,36 - aa × aa 0,10×0,10 = 0,01 - 0,01 - - - - aa × a1a1 2× 0,10× 0,60 = 0,12 - - - - - 0,12 a1a1 × a1a1 0,60× 0,60 = 0,36 - - 0,36 - - - Total 1,00 0,09 (p2) 0,01 (q2) 0,36 (r2) 0,06 (2pq) 0,36 (2pr) 0,12 (2qr) A Tabela 2.2 mostra a distribuição de famílias em uma população teórica que está em equilíbrio de Hardy e Weinberg em relação aos genótipos decorrentes de três alelos autossômicos A, a e a1 com freqüências p, q e r. Tabela 2.2. Distribuição das famílias em uma população teórica que está em equilíbrio genético em relação aos genótipos determinados por três alelos autossômicos A, a e a1 cujas freqüências são p, q e r. Casais F i l h o s Tipo Freqüência AA aa a1a1 Aa Aa1 aa1 AA× AA p2.p2 = p4 p4 - - - - - AA× aa 2p2.q2 =2p2q2 - - - 2p2q2 - - AA × a1a1 2p2.r2 =2p2.r2 - - - - 2p2.r2 - AA× Aa 2p2.2pq=4p3q 2p3q - - 2p3q - - AA× Aa1 2p2.2pr=4p3r 2p3r - - - 2p3r - AA× aa1 2p2.2qr=4p2qr - - - 2p2qr 2p2qr - aa× aa q2.q2 =q4 - q4 - - - - aa× a1a1 2 q2.r2 =2q2r2 - - - - - 2q2r2 aa× Aa 2 q2.2pq =4pq3 - 2pq3 - 2pq3 - - aa× Aa1 2 q2.2pr=4pq2r - - - 2pq2r - 2pq2r aa× aa1 2 q2.2qr=4q3r - 2q3r - - - 2q3r a1a1× a1a1 r2.r2 = r4 - - r4 - - - a1a1× Aa 2 r2. 2pq=4pqr2 - - - - 2pqr2 2pqr2 a1a1× Aa1 2 r2. 2pr=4pr3 - - 2pr3 - 2pr3 - a1a1× aa1 2 r2. 2qr=4qr3 - - 2qr3 - - 2qr3 Aa× Aa 2pq. 2pq=4p2q2 p2q2 p2q2 - 2p2q2 - - Aa× Aa1 2.2pq. 2pr=8p2qr 2p2qr - - 2p2qr 2p2qr 2p2qr Aa× aa1 2.2pq. 2qr=8pq2r - 2pq2r - 2pq2r 2pq2r 2pq2r Aa1× Aa1 2pr. 2pr=4p2r2 p2r2 - p2r2 - 2p2r2 - Aa1× aa1 2.2pr. 2qr=8pqr2 - - 2pqr2 2pqr2 2pqr2 2pqr2 aa1× aa1 2qr. 2qr=4q2r2 - q2r2 q2r2 - - 2q2r2 Total (p+q+r)4 =1 p2 q2 r2 2pq 2pr 2qr 30 23 CÁLCULO DA FREQÜÊNCIA GÊNICA EM CASOS DE POLIALELISMO AUTOSSÔMICO QUANDO EXISTE CODOMINÂNCIA Nos casos de polialelismo em que não existe relação de dominância e recessividade entre os fenótipos, as freqüências gênicas podem ser facilmente calculadas por contagem. Assim, por exemplo, num caso de trialelismo, levando em conta os alelos A, a e a1, teríamos que considerar a existência de seis genótipos AA, aa, a1a1, Aa, Aa1, aa1. Em uma amostra de n indivíduos podemos calcular as freqüências de um gene após somar o número de vezes em que ele aparece nos diferentes genótipos e dividir a soma pelo número total de genes, isto é, por 2n. Tem-se, desse modo, que as freqüências p, q e r dos alelos A, a e a1 podem ser obtidas por intermédio de: p = 2n AaAa2AA 1++ q = 2n aaAa2aa 1++ r = 2n aaAaa2a 1111 ++ Se em vez de trabalhar com o número de genótipos quisermos trabalhar com a sua freqüência relativa, assinaladas em negrito, o denominador dessas fórmulas se reduzirá ao número 2, porque, nesse caso, o total da amostra passa a ser a unidade. Nesse caso, as freqüências p, q e r dos alelos A, a e a1 são obtidas por intermédio de: p = 2 AaAa2AA 1++ q = 2 aaAa2aa 1++ r = 2 aaAaa2a 1111 ++ Tomemos um exemplo numérico a respeito da fosfatase ácida eritrocitária, cujos alelos mais freqüentes são os genes Pa, Pb e Pc responsáveis pelos fenótipos A, B, C, AB, AC e BC os quais correspondem, respectivamente, aos genótipos PaPa, PbPb, PcPc, P a P b , P a P c , P b P c. Assim, consideremos que numa amostra de 480 indivíduos caucasóides observou-se a seguinte distribuição fenotípica, com as freqüências em porcentagem assinaladas entre parênteses: A = 35 (7,3); B = 256 (53,3); C = 0 (0); AB =161 (33,5); AC = 8 (1,7); BC = 20 (4,2) 31 24 Se levássemos em conta o número de indivíduos, as freqüências p, q e r dos alelos Pa, Pb e Pc seriam calculadas como abaixo. p = P a = 4802 8161)352( × ++× = 0,249 ou 24,9% q = P b = 4802 20161)2562( × ++× = 0,722 ou 72,2% r = P c = 4802 208 × + = 0,029 ou 2,9% Levando em conta as freqüências relativas dos fenótipos, que correspondem aos genótipos, chegaríamos aos mesmos resultados a partir das operações abaixo: p = P a = 2 01703350)07302( ,,, ++× = 0,249 ou 24,9% q = P b = 2 04203350)53302( ,,, ++× = 0,722 ou 72,2% r = P c = 2 04200170 ,, + = 0,029 ou 2,9% Para investigar se a amostra estudada representa uma população em equilíbrio de Hardy e Weinberg basta calcular o número de indivíduos nas seis classes fenotípicas esperadas segundo A = np2; B = nq2; C = nr2; AB = n2pq; AC = n2pr; BC = n2qr. O qui-quadrado resultante tem três graus de liberdade, porque para calcular as seis classes esperadas são necessárias três informações, ou seja, o total da amostra e a freqüência de dois dos três alelos, visto que, conhecendo as freqüências de dois deles, a do terceiro alelo será automaticamente conhecida, pois p+q+r = 1. Em decorrência do qui-quadrado obtido (2,396) com três graus de liberdade, pode-se concluir que a amostra analisada representa uma população em equilíbrio de Hardy e Weinberg quanto aos genótipos da fosfatase ácida eritrocitária. Valor A B C AB AC BC Total Observado (o) 35 256 0 161 8 20 480 Esperado (e) 29,8 250,2 0,4 172,6 6,9 20,1 480 e e)(o 2− 0,907 0,134 0,4 0,780 0,175 0,0005 χ2(3) = 2,396 0,30<P <0,50 CÁLCULO DA FREQÜÊNCIA GÊNICA EM CASOS DE POLIALELISMO AUTOSSÔMICO QUANDO EXISTE DOMINÂNCIA E RECESSIVIDADE Dentre os casos de polialelismo autossômico, a situação que parece mais interessante para ser aqui discutida é a de trialelismo, com um dos alelos se manifestando apenas em homozigose, como ocorre no sistema sangüíneo ABO clássico. Nesse sistema levamos em conta os alelos A, B e O, sendo que o gene A determina a 32 27 Para verificar se a distribuição dos fenótipos na amostra estudada está de acordo com a hipótese genética, isto é, se a amostra representa, realmente, uma população em equilíbrio de Hardy e Weinberg, existe a alternativa de calcular um qui-quadrado a partir da razão entre o quadrado do desvio D e a sua variância. Visto que a variância do desvio D é σ2(D) =       + pq r n 12 1 onde n é o tamanho amostral, o qui-quadrado pode ser obtido como abaixo: χ2 = 2D12       + pq r n Esse qui-quadrado terá apenas um grau de liberdade porque existem quatro classes fenotípicas (grupos A, B, AB e O) e são necessárias três informações da amostra para calcular os valores esperados nessas classes, isto é, o tamanho da amostra e as freqüências de dois genes. É importante salientar que nessa fórmula de qui-quadrado não é necessário empregar as estimativas corrigidas das freqüências gênicas, podendo- se partir das estimativas preliminares. Usando as estimativas preliminares das freqüências dos alelos A, B e O da amostra caucasóide de nosso exemplo obtemos a indicação de que ela representa uma população em equilíbrio de Hardy e Weinberg, pois: χ2 = 2 × 2.571       × + 0689,02418,0 6911,0 1 0,00000324 = 0,707; 1 G.L.; 0,30<P<0,50. Uma outra alternativa é a de calcular um qui-quadrado depois de comparar os números observados com os esperados em cada classe, isto é, a partir de: χ2 = [ ] [ ] ( ) ( ) nr nr pqn pqn nqrq nqrq nprp nprp 2 222 2 22 2 22 -O 2 2AB )2( )2(B )2( )2(A + − + + +− + + +− onde A, B, AB e O são os números observados de indivíduos em cada um desses grupos sangüíneos. Assim, teríamos: χ2 = 51,1220 )51,12201228( 86,85 )86,8592( 70,256 )70,256250( 93,1007 )93,10071001( 2222 − + − + − + − = 0,707 Como se pode constatar, os dois valores de qui-quadrado obtidos são idênticos, o que indica que qualquer das duas alternativas para calcular o qui-quadrado pode ser aceita. A primeira alternativa é menos trabalhosa, mas, nos casos em que a amostra não representa uma população em equilíbrio genético, a segunda alternativa é melhor do que a primeira porque permite detectar qual(ais) o(s) grupo(s) sangüíneo(s) que mostram 35 28 uma diferença significativa entre o observado e o esperado. Assim, por exemplo, se a amostra estudada não estivesse em equilíbrio por causa de um excesso de indivíduos do grupo sangüíneo AB, a aplicação da fórmula da primeira alternativa indicaria apenas que a amostra não representa uma população em equilíbrio genético, mas nada informaria a respeito do número excessivo observado de indivíduos do grupo sangüíneo AB. Um bom expediente para facilitar o cálculo do qui-quadrado usando a segunda alternativa é o de trabalhar apenas com as freqüências relativas, deixando de multiplicá- las pelo tamanho da amostra (n) mas não se deve esquecer, ao final das operações, de multiplicar o valor do qui-quadrado obtido pelo tamanho amostral, porque o valor obtido é igual ao do qui-quadrado dividido por n. Assim, usando os dados de nosso exemplo, teríamos: 4747,0 )4747,04776,0( 0334,0 )0334,00358,0( 0998,0 )0998,00972,0( 3920,0 )3920,03893,0( 2222 − + − + − + − = 0,000276 e, multiplicando esse resultado por 2.571, obtém-se um valor de qui-quadrado muito próximo aos calculados anteriormente, pois 0,000276 × 2.571 = 0,7096; 0,30<P<0,50. Quando os subgrupos sangüíneos A1, A2, A1B e A2B são levados em conta, o sistema ABO passa a incluir seis fenótipos explicados à custa de dez genótipos que, numa população em equilíbrio genético se distribuem como na Tabela 4.2. Tabela 4.2. Freqüências genotípicas e fenotípicas do sistema ABO em uma população em equilíbrio genético, quando se consideram os subgrupos A1, A2, A1B e A2B. Fenótipo Genótipo Freqüência Genotípica Freqüência Fenotípica A1 A1A1 A1A2 A1O p1 2 2p1p2 2p1r p1 2 +2p1(p2+r) A2 A2A2 A2O p2 2 2p2r p2(p2+2r) B BB BO q 2 2qr q(q+2r) A1B A1B 2p1q 2p1q A2B A2B 2p2q 2p2q O OO r2 r2 As freqüências preliminares p1’, p2’, q’ e r’ dos alelos A1, A2, B e O são estimadas a partir das freqüências fenotípicas A1, A2, A2B e O como abaixo: p1’ = OBABA1 22 +++− p2’ = OBOBABA 22 +−+++ q’ = OAA1 21 ++− 36 29 r’= O Depois de determinar o desvio (D) entre a unidade e a soma das estimativas preliminares, isto é, depois de calcular: D = 1 – (p1’+ p2’+ q’+ r’) as estimativas corrigidas p1, p2 e q das freqüências dos genes A1, A2 e B serão obtidas pela multiplicação das estimativas preliminares p1’, p2’ e q’ por       + 2 D 1 . A estimativa corrigida r do alelo O pode ser obtida simplesmente pela diferença 1 – (p1+p2+q) ou calculando       +      +′ 2 D 1 2 D r . Para estimar as freqüências dos genes do sistema ABO em populações com o alelo Aint pode-se fazer o cálculo das estimativas preliminares como abaixo: p1’ = OBABABAA1 2int2int +++++− p’int = OBABAOBABABAA 222int2int +++−+++++ p2’ = OBOBABA 22 +−+++ q’ = OAAA1 int21 +++− r’ = O Depois de calcular o desvio D = 1 (p1’+ p’int + p2’+ q’+ r’), todas as estimativas corrigidas, com exceção de r, serão obtidas pela multiplicação das estimativas preliminares por       + 2 D 1 . A estimativa corrigida r será obtida por intermédio de 1 – (p1+ pint+ p2+q) ou por intermédio de       +      +′ 2 D 1 2 D r . ANOMALIAS RECESSIVAS E CÁLCULO DAS FREQÜÊNCIAS GÊNICAS Não é raro termos que lidar com anomalias recessivas resultantes da homozigose ou heterozigose de diferentes mutações. Em outras palavras, não é raro nos depararmos com várias mutações, que poderemos designar por a, a1, a2, a3 etc. de um gene “normal” A e que tanto os homozigotos aa, a1a1, a2a2 ou a3a3 quanto os heterozigotos aa1, aa2, aa3, a1a2, a1a3 ou a2a3 determinem um quadro patológico semelhante. Em situações como essa, em que os diferentes genótipos podem ser detectados por técnicas de genética molecular, mas que, do ponto de vista clínico, resultam em um quadro semelhante, podemos, para fins de epidemiológicos, reunir os homozigotos aa, a1a1, 37 32 probabilidade será 10 8290, = 0,0829. Tais valores serão representados graficamente na mesma escala utilizada para indicar os valores de p e de q . Tabela 7.2. Elementos para o cálculo de raios de círculos equivalentes que incluem 80% e 95% de probabilidade em função da freqüência r do gene O do sistema ABO. r 80% 95% 0,5 0,581 0,793 0,6 0,596 0,813 0,7 0,607 0,829 0,8 0,617 0,842 0,9 0,626 0,854 1,0 0,634 0,865 Se o valor de r não estiver representado na Tabela 7.2, poder-se-á fazer uma interpolação para obter o raio do círculo equivalente. Assim, por exemplo, se em uma amostra de 100 indivíduos o valor de r for estimado em 0,65 considerar-se-á que, quando r é igual a 0,6 o valor tabulado para obter o raio do círculo de 80% de probabilidade é 0,596, sendo igual a 0,607 quando r é igual a 0,7. Assim, a um aumento de 0,1 no valor de r corresponde um aumento de 0,011 no valor tabulado. Portanto, o valor 0,0055 deve corresponder a um aumento de 0,05, isto é, à diferença entre 0,65 e 0,6. Desse modo, o raio do círculo equivalente de 80% de probabilidade será 10 005505960 ,, + = 0,0602. No caso de se querer obter o raio do círculo equivalente de 95% de probabilidade sendo o valor de r igual a 0,65 ter-se-ia, pelos mesmos motivos 10 00808130 ,, + = 0,0821. Do ponto de vista prático, contudo, as interpolações para a obtenção dos valores dos raios dos círculos equivalentes constituem apenas refinamentos. Portanto, do ponto de vista prático, quando r não estiver representado na Tabela 7.2 bastará tomar o seu valor mais próximo. Para entender melhor a aplicação do método de Stevens (1950), consideremos os dados apresentados na Tabela 8.2 a respeito de cinco amostras, distribuídas segundo os grupos sangüíneos do sistema ABO clássico (Beiguelman e Marchi, 1962; Beiguelman, 1963). Os dados dessa tabela permitem obter os elementos necessários à construção dos círculos equivalentes, de modo que, a partir deles pode-se preparar uma outra tabela como a Tabela 9.2 e desenhar os gráficos das Figuras 1.2 e 2.2. 40 33 Tabela 8.2. Distribuição de cinco amostras segundo os grupos sangüíneos do sistema ABO clássico e estimativas corrigidas das freqüências dos alelos A, B e O. Entre parênteses estão assinalados os valores em porcentagem. 1. Brasileiros caucasóides com ancestrais brasileiros até bisavós; 2. brasileiros negróides; 3. italianos e brasileiros descendentes não-miscigenados de italianos; 4. espanhóis e brasileiros descendentes não miscigenados de espanhóis; 5. japoneses e descendentes não miscigenados de japoneses. Amostra A B AB O Total p q r 1 228 (37,44) 52 (8,54) 15 (2,46) 314 (51.56) 609 (100) 0,225 0,057 0,718 2 56 (31,11) 23 (12,78) 8 (4,44) 93 (51,67) 180 (100) 0,196 0,090 0,714 3 276 (38,76) 69 (9,69) 33 (4,64) 334 (46,91) 712 (100) 0,247 0,074 0,679 4 47 (35,60) 13 (9,85) 5 (3,79) 67 (50,76) 132 (100) 0,221 0,071 0,708 5 111 (37,00) 68 (22,67) 40 (13,33) 81 (27,00) 300 (100) 0,293 0,198 0,509 Tabela 9.2. Elementos para a construção dos círculos equivalentes de 80% e 95% de probabilidade das amostras descritas na Tabela 7. Amostra p q n Raio (80%) Raio (95%) 1 0,474 0,239 24,678 0,025 0,034 2 0,443 0,300 13,416 0,046 0,062 3 0,497 0,274 26,683 0,023 0,031 4 0,470 0,266 11,489 0,054 0,072 5 0,713 0,455 17,321 0,034 0,046 Fig.1.2. Círculos equivalentes de 95% de probabilidade das cinco amostras relacionadas na Tabela 8.2. 41 34 Fig.2.2. Círculos equivalentes de 80% de probabilidade das cinco amostras relacionadas na Tabela 8.2. A análise da Fig.1.2 permite concluir que, no concernente às freqüências gênicas do sistema ABO, as amostras 1, 2, 3 e 4 não diferem significativamente entre si, mas todas elas são bem diferentes da amostra 5, constituída por japoneses e seus descendentes não miscigenados. Um analista mais rigoroso construiria o gráfico da Fig.2.2 e, com base nos círculos equivalentes de 80% de probabilidade aceitaria que a amostra 2 difere da amostra 1 e da amostra 5, e que as amostras 1, 3 e 4 não diferem entre si, mas diferem da amostra 5. 42 37 Q 5. As hemácias de 862 indivíduos da população de Monte Negro, RO, foram tratadas com os anti-soros anti-Fya e anti- Fyb do sistema sangüíneo Duffy, tendo sido observado o seguinte resultado: Fenótipo Fy(a+b-) Fy(a-b+) Fy(a+b+) Fy(a-b-) Genótipo FyaFya ou Fy a Fy Fy b Fy b ou Fy b Fy Fy a Fy b FyFy No. 236 328 243 55 % 27,38 38,05 28,19 6,38 Quer-se saber as estimativas das freqüências dos alelos Fya, Fyb e Fy e se a amostra estudada representa uma população em equilíbrio genético. R 5. Aplicando o método de Bernstein para a análise dos dados do sistema Duffy, obtemos, inicialmente, as estimativas preliminares p’, q’ e r’ dos alelos Fya, Fyb e Fy, bem como o desvio D: p’ = 0,3334 q’ = 0,4190 r’ = 0,2526 D = 1 – 1,005 = - 0,005 Com esses elementos obtemos as estimativas corrigidas p, q e r : p= 0,3326 q= 0,4180 r = 0,2494 e, pelo baixo valor do qui-quadrado (χ2(1) = 0,120; 0,70<P<0,80) concluímos que a amostra de Monte Negro representa uma população em equilíbrio genético em relação aos grupos sangüíneos do sistema Duffy. REFERÊNCIAS Beiguelman, B. Grupos sangüíneos e lepra. Rev. Bras. Lepr. 31: 34-44, 1963. Beiguelman, B. & Marchi, A. Blood groups among Japanese in Brazil. Am. J. Phys. Anthrop. 20: 29-31, 1962 Bernstein, F. Ergebnisse einer biostatistischen zusammenfassenden Betrachtung über die erblichen Blutstrukturen des Menschen. Klin. Wschr. 3: 1495-1497, 1924. Bernstein, F. Zusammenfassende Betrachtungen über die erbliche Blutstrukturen des Menschen. Z. indukt. Abstamm. u. VererbLehre. 37: 237-270, 1925. Bernstein, F. Fortgesetzte Untersuchungen aus der Theorie der Blutgruppen. Z. indukt. Abstamm. u. VererbLehre 56: 233-237, 1930. Cabello, P.H. & Krieger, H. Genioc. Sistema para análises de dados de Genética. Publicação Técnica, Departamento de Genética, Instituto Oswaldo Cruz-FIOCRUZ, Rio de Janeiro, 1997. 45 38 Cook, P.J., Robson, E.B., Buckton, K.E., Slaughter, C.A., Gray, J.E., Blank, C.E., James, F.E., Ridler, M.A., Insley, J. & Hulten, M. Segregation of ABO, AK(1) and ACONs in families with abnormalities of chromosome 9. Ann. Hum. Genet.41: 365-378, 1978. Narahara, K., Takahashi, Y., Kikkawa, K., Wakita, Y., Kimura, S. & Kimoto, H. Assignment of ABO locus to 9q31.3qter by study of a family in which an intrachromosomal shift involving chromosome 9 is segregating. Japan. J. Hum. Genet.31: 289-296, 1986. Stevens, W.L. Estimation of blood-group gene frequencies. Ann. Eugenics 8: 362-375, 1938. Stevens, W.L. Statistical analysis of the ABO blood groups. Human Biol. 22:191-217,1950. 46 39 CAPÍTULO 3. OUTROS TIPOS DE EQUILÍBRIO GENÉTICO As considerações feitas nos capítulos anteriores a respeito de dialelismo e polialelismo autossômico não podem ser estendidas aos caracteres ligados ao sexo, nem aos caracteres poligênicos, nem a genes em ligação, como teremos oportunidade de verificar no presente capítulo. GENES DO CROMOSSOMO X Na espécie humana, a esmagadora maioria das mulheres tem dois cromossomos X em seu cariótipo, de modo que, quando a população atinge equilíbrio genético, apenas elas podem apresentar os genótipos se distribuindo segundo (p + q)2 = 1, nos casos de dialelismo, ou segundo (p + q + r + ...+ x)2 = 1 nos casos de polialelismo. Isso não pode acontecer nos homens, visto que eles, na esmagadora maioria, possuem cariótipo com um único cromossomo X, de modo que os genes desse cromossomo ficam em hemizigose. Como teremos oportunidade de constatar neste capítulo, se houver equilíbrio genético em relação aos caracteres monogênicos ligados ao sexo, as freqüências dos genótipos na população masculina deverão ser iguais às dos alelos que os determinam. Um outro ponto interessante que deve ser levado em conta é que a estabilidade da distribuição genotípica em relação a genes do cromossomo X somente é atingida após uma única geração em panmixia quando, na geração inicial, as freqüências genotípicas dos homens correspondem às freqüências gênicas da população. Se isso não ocorrer serão necessárias várias gerações em panmixia para que a estabilidade da distribuição genotípica seja alcançada. Para ilustrar essas afirmações consideremos um par de alelos A,a do cromossomo X e uma amostra de 110 mulheres e 100 homens de uma população teórica que apresente na geração inicial a seguinte distribuição genotípica: M u l h e r e s H o m e n s Valor XAXA XAXa XaXa TOTAL XAY XaY TOTAL No. 56 20 34 110 60 40 100 % 50,9 18,2 30,9 100 60 40 100 As freqüências p e q dos alelos A e a do cromossomo X nessa população podem ser calculadas a partir da contagem do número de cromossomos X com esses alelos nos gametas que serviram para constituir essa geração inicial. Assim, para estimar a freqüência p do gene A poderemos, inicialmente, fazer a soma do número de homens que têm o genótipo XAY com o número de mulheres que possuem o genótipo heterozigoto XAXa e com o dobro do número de mulheres com o genótipo homozigoto XAXA, pois os dois cromossomos do cariótipo dessas últimas apresentam esse alelo. Em seguida, dividimos o resultado dessa contagem pelo número total de 47 42 o equilíbrio genético não seria atingido após uma única geração de panmixia, como se pode verificar na Tabela 2.3. Tal equilíbrio demoraria a ser atingido porque, apesar de as freqüências dos alelos A e a serem as mesmas da população anterior, isto é, p = 3 860240700 ,,, ++ = 0,60 e q = 1 - 0,60 = 0,40, elas diferem das freqüências genotípicas observadas nos homens da geração inicial. Tabela 2.3. Demonstração de que a distribuição genotípica estável não é alcançada após panmixia de uma geração inicial composta por homens XAY (70%) e XaY (30%) e mulheres XAXA (43%), XAXa (24%) e XaXa (33%). Casais (geração inicial) Primeira Geração Filial Tipo Freqüência XAXA XAXa XaXa XAY XaY XAXA × XAY 0,301 0,1505 - - 0,1505 - XAXA × XaY 0,129 - 0,0645 - 0,0645 - XAXa × XAY 0,168 0,0420 0,0420 - 0,0420 0,0420 XAXa × XaY 0,072 - 0,0180 0,0180 0,0180 0,0180 XaXa × XAY 0,231 - 0,1155 - - 0,1155 XaXa × XaY 0,099 - - 0,0495 - 0,0495 Total 1,000 0,1925 0,2400 0,0675 0,2750 0,2250 Freqüência em relação a cada sexo 0,3850 0,4800 0,1350 0,5500 0,4500 Freqüência esperada em equilíbrio genético 0,3600 (p2) 0,4800 (2pq) 0,1600 (q2) 0,6000 (p) 0,4000 (q) A Tabela 3.3, por sua vez, generaliza o que foi discutido acima ao mostrar a distribuição familial em uma população teórica que está em equilíbrio genético em relação aos genótipos decorrentes de um par de alelos A,a do cromossomo X, com freqüências p e q = l - p. Tabela 3.3. Distribuição das famílias de uma população teórica que está em equilíbrio genético estável em relação aos genótipos determinados por um par de alelos A,a do cromossomo X, que ocorrem com freqüências p e q = 1 - p, respectivamente. Casais Filhas Filhos Tipo Freqüência XAXA XAXa XaXa XAY XaY XAXA × XAY p2.p = p3 p3 - - p3 - XAXA × XaY p2.q= p2q - p2q - p2q - XAXa × XAY 2pq.p =2p2q p2q p2q - p2q p2q XAXa × XaY 2pq.q =2pq2 - pq2 pq2 Pq2 pq2 XaXa × XAY q2.p =pq2 - pq2 - - pq2 XaXa × XaY q2q =q3 - - q3 - q3 Total p+q = 1 p2 2pq q2 p q Nos casos de polialelismo ligados ao sexo que não mostram relações de dominância a estimativa das freqüências gênicas também pode ser feita levando em conta a contagem do número 50 43 de cromossomos X com esses alelos nos gametas que serviram para constituir essa geração inicial ou a freqüência dos genótipos. Assim, num caso de trialelismo em que são analisados os alelos A, a e a1 de um loco do cromossomo X, poderemos estimar a freqüência p, q e r desses alelos a partir de: p = F2M XX2XXXXYX + +++ AAaAaAA 1 q = F2M XX2XXXXYX + +++ aaaaaAa 1 r = F2M XX2XXXXYX + +++ 11111 aaaaaAa ou r = 1 – (p+q) Se levarmos em conta as freqüências relativas dos diferentes genótipos, essas freqüências gênicas poderão ser estimadas a partir das fórmulas baixo, onde os símbolos em negrito indicam as freqüências relativas: p = 3 2 AAaAaAA 1 XXXXXXYX +++ q = 3 2 aaaaaAa XXXXXXYX 1 +++ r = 3 2 11111 aaaaaAa XXXXXXYX +++ ou r = 1 – (p+q) TESTE DA HIPÓTESE DE EQUILÍBRIO GENÉTICO Quando, em um estudo de uma amostra, levamos em conta apenas um par de alelos codominantes do cromossomo X e queremos saber se a distribuição dos genótipos determinados por esses alelos é estável, isto é, representa uma população em equilíbrio genético poderemos comparar as proporções observadas com as esperadas nos homens (Mp e Mq) e nas mulheres (Fp2, F2pq e Fq2) por intermédio de um teste de qui-quadrado. Esse qui-quadrado terá dois graus de liberdade, porque para calcular as cinco classes esperadas (duas masculinas e três femininas) valemo-nos de três informações, a saber, o número de homens, o número de mulheres e a freqüência de um dos alelos. Para exemplificar, consideremos que a desidrogenase de 6-fosfato de glicose (G-6PD) foi estudada eletroforeticamente numa amostra de 210 homens e 200 mulheres de origem européia mediterrânea e que, dentre os homens, 198 (94,3%) apresentaram a variante normal (B+) e 12 (5,7%) mostraram a variante deficiente (B-) dessa enzima. Nas mulheres foi possível distinguir 182 (91%) com variante normal (B+), uma (0,5%) deficiente (B-) e 17 (8,5%) com atividade intermediária, por serem heterozigotas. Para facilitar a notação, indiquemos os genótipos masculinos por B+ e B- e os femininos por B+B+, B+B- e B-B-. 51 44 Com base nesses dados podemos calcular as freqüências gênicas e as freqüências genotípicas esperadas para compará-las com as observadas, obtendo: p = B + = 3 820108509430 ,,, ++ = 0,949 q = B- = 1- p = 1 – 0,949 = 0,051 σ = 0,009 Mulheres Homens Valores B + B + B+B- B-B- Total B+ B- Total Observados (o) 182 17 1 200 198 12 210 Esperados (e) 180,1 (Fp2) 19,4 (F2pq) 0,5 (Fq2) 200 199,3 (Mp) 10,7 (Mq) 210 e e)(o 2− 0,020 0,297 0,5 0,008 0,158 χ 2 (2) = 0,983 0,50<P<0,70 O valor do qui-quadrado com dois graus de liberdade (0,983) permite-nos, pois, concluir que a amostra representa uma população em equilíbrio genético quanto aos genótipos estudados. Consideremos, agora, um exemplo de trialelismo ligado ao sexo, analisando os resultados de estudos eletroforéticos de G-6PD em africanos (141 homens e 100 mulheres), nos quais se observou a seguinte distribuição: Homens: A+ = 31 (22%), B+ =79 (56%), A- = 31 (22%) Mulheres: A+= 4, B+ = 31, A- = 4, A+B+ = 28, A+A- = 10, A-B+ = 23. Com essas dados podemos calcular as freqüências p, q e r dos alelos A+, B+ e A- e as freqüências genotípicas esperadas para compará-las com as observadas, como abaixo: p = A+ = 3 080100280220 ,,,, +++ = 0,227 q = B+ = 3 620230280560 ,,,, +++ = 0,563 r = A- = 1 – (0,227+0,563) = 0,210 M u l h e r e s H o m e n s Valores A+A+ B+B+ A-A- A+B+ A+A- A-B+ Total A+ B+ A- Total Obs. (o) 4 31 4 28 10 23 100 31 79 31 141 Esp. (e) 5,2 31,7 4,4 25,6 9,5 23,6 100 32 79,4 29,6 141 e e)(o 2− 0,277 0,015 0,036 0,225 0,026 0,015 0,031 0,002 0,066 χ2(5) =0,693 0,98<p<0,99 O valor do qui-quadrado obtido (0,693) com cinco graus de liberdade, pois são necessárias quatro informações (a freqüência de dois alelos e os totais de homens e de mulheres) para calcular as nove classes esperadas, permite concluir que as amostras de homens e mulheres estudadas representam uma população em equilíbrio genético quanto aos genótipos estudados. 52 47 Com base nessas estimativas podemos dizer que o número esperado de mulheres heterozigotas na amostra estudada é igual à freqüência 2pq multiplicada pelo total de mulheres, isto é F2pq = 1.069 × 0,4388 = 469,1. Além disso, podemos dizer, também que o dizer que o número esperado de homens e mulheres com os grupos sangüíneos Xg(a+) e Sg(a-) deve ser calculado como abaixo: Homens Xg(a+) = Mp = 1.013 ×0,6749 = 683,7 Homens Xg(a-) = Mq = 1.013 ×0,3251 = 329,3 Mulheres Xg(a+)= F(p2+2pq) = 1.069 ×0,8943 = 956 Mulheres Xg(a-) = Fq2 = 1.069 ×0,1057 = 113 Esses números esperados permitem pôr à prova a hipótese nula de que a amostra estudada pode ser considerada como extraída de uma população em equilíbrio genético por intermédio de um qui-quadrado com um grau de liberdade. Isso porque existem quatro classes esperadas e são três as informações da amostra necessárias para calculá-las (o total de homens, o total de mulheres e a freqüência de um dos alelos). A análise dos dados de nosso exemplo feita na Tabela 4.3 permite concluir pela aceitação dessa hipótese, já que o qui-quadrado obtido (2,453) indica que as diferenças entre as proporções observadas e esperadas não são significativas. Tabela 4.3. Verificação de que a amostra estudada por Noades et al. (1966) pode ser considerada como extraída de uma população em equilíbrio genético. Sexo Grupo Sangüíneo Número Observado Número Esperado e eo 2)( − Xg(a+) 667 683,7 0,408 Masculino Xg(a-) 346 329,3 0,847 Xg(a+) 967 956 0,127 Feminino Xg(a- 102 113 1,071 Total 2.082 2.082 χ2(1) = 2,453 0,10<P<0,20 ESTIMATIVA DAS FREQÜÊNCIAS DE GENES DO CROMOSSOMO X QUANDO EXISTE RELAÇÃO DE DOMINÂNCIA EM RELAÇÃO A UM FENÓTIPO RARO Do mesmo modo que em relação aos genes autossômicos é bem mais simples estimar a freqüência de heterozigotas de genes do cromossomo X quando o fenótipo recessivo é raro. Quando isso acontece, aceitamos que a população está em equilíbrio genético, de modo que consideramos a freqüência dos homens que exibem o fenótipo recessivo raro em estudo como sendo a estimativa da freqüência q do alelo que o determina. Não há a necessidade de levar em conta o número de mulheres homozigotas desse gene porque a sua ocorrência eventual, como é sabido, pode ser desprezada. Em vista do exposto, tem-se que, em uma população como a de Porto Alegre, RS, na qual a freqüência de homens com hemofilia A, que apresentam deficiência do fator VIII de coagulação 55 48 (globulina anti-hemofílica), foi estimada em 1: 10.000 (Roisenberg, 1968), pode-se aceitar ser esse valor a estimativa da freqüência q do gene da hemofilia A, ou melhor, das diferentes mutações tomadas em conjunto, que resultam na hemofilia A (q = 0,0001). A freqüência das mulheres heterozigotas do gene alterado em Porto Alegre pode, pois, ser estimada em 1: 5.000 seja a partir de Aa = 2pq ou de Aa = 2q, pois a freqüência p = 1- q do alelo que condiciona níveis normais do fator VIII é, praticamente, a unidade (p = 0,9999). Em outras palavras, em relação a um alelo raro do cromossomo X, a proporção de mulheres portadoras desse alelo (heterozigotas) será, praticamente, o dobro da freqüência dos homens que possuem tal alelo em populações em equilíbrio genético. EQUILÍBRIO GENÉTICO E HERANÇA POLIGÊNICA Quando lidamos com caracteres que dependem de mais de um par de alelos (herança poligênica) pode-se demonstrar que, se a população obedecer as oito condições estabelecidas para as populações teóricas em equilíbrio de Hardy e Weinberg, os genótipos decorrentes de cada par de alelos do conjunto poligênico atingem, isoladamente, distribuição estável após uma única geração de panmixia, isto é, os genótipos decorrentes de cada par de alelos obedecerão a lei de Hardy e Weinberg. Entretanto, os genótipos que incluem todo o conjunto poligênico necessitarão de várias gerações de casamentos aleatórios para alcançar uma distribuição genotípica estável, a menos que a geração inicial seja composta exclusivamente por heterozigotos de todos os alelos do conjunto poligênico. Entretanto, o número de gerações necessárias para que a população atinja o equilíbrio genético em relação aos caracteres poligênicos não depende apenas da composição genética inicial, mas também do número de pares de alelos implicados. De fato, se o caráter depender de dois pares de alelos o equilíbrio genético será atingido quando (p1+q1) 2(p2+ q2) 2= 1, mas se ele depender de três pares de alelos o equilíbrio genético somente será alcançado quando tivermos (p1+q1) 2(p2+q2) 2(p3+q3) 2 = 1. Para generalizar, pode-se escrever que, para os caracteres poligênicos, o equilíbrio genético é atingido quando (p1+q1) 2(p2+ q2) 2(p3+q3) 2 ......(px+qx) 2 = 1 Para exemplificar, consideremos apenas dois pares de alelos autossômicos A,a e B,b com freqüências A = p1 = 0,5; a = q1 = 0,5; B = p2 = 0,5; b = q2 = 0,5. Se a geração inicial de uma população for composta apenas por indivíduos com genótipos AABB, AaBb e aabb, cujas freqüências são iguais, respectivamente, a 25%, 50% e 25%, ela estará em equilíbrio em relação aos genótipos decorrentes dos alelos A, a e dos alelos B,b considerados separadamente, mas não em relação aos dois pares de alelos considerados simultaneamente. De fato, quando se consideram esses dois pares de alelos ao mesmo tempo é necessário que os genótipos se distribuam segundo (p1+q1) 2(p2+ q2) 2 = 1 para que o equilíbrio genético seja 56 49 alcançado. Em outras palavras, é necessário que os nove genótipos possíveis ocorram com as freqüências abaixo, as quais foram calculadas levando em conta que, sendo p1 = p2= 0,50 e q1 = q2= 0,50 é possível escrever p1 = p2= p e q1 = q2= q. AABB = p 2 . p 2 = p 4 = 0,0625 AABb = p 2 . 2pq = 2 p 3 q = 0,1250 AAbb = p 2 . q 2 = p 2 q 2 = 0,0625 AaBB = 2 pq . p 2 = 2 p 3 q = 0,1250 AaBb = 2 pq .2pq= 4p 2 q 2 = 0,2500 Aabb = 2pq . q 2 = 2pq 3 = 0,1250 aaBB = q 2 . p 2 = p 2 q 2 = 0,0625 aaBb = q 2 . 2pq = 2pq 3 = 0,1250 aabb = q 2 . q 2 = q 4 = 0,0625 Na Tabela 5.3 pode-se constatar que a primeira geração filial, resultante da panmixia da geração inicial em discussão, continua em equilíbrio apenas em relação a cada par de alelos considerados isoladamente, mas não em relação aos dois pares analisados em conjunto. Assim, os genótipos AA, Aa e aa continuam se distribuindo segundo 25%, 50% e 25%, o mesmo ocorrendo com os genótipos BB, Bb e bb. Na distribuição genotípica levando em conta os dois pares de alelos verifica-se na Tabela 5.3 que certos genótipos aparecem com freqüência menor que as esperadas em equilíbrio genético, ocorrendo o inverso com outros. Mais algumas gerações em panmixia serão necessárias, portanto, para que a distribuição genotípica estável seja alcançada. Tabela 5.3. Demonstração de que a distribuição genotípica estável em relação a caracteres poligênicos não é alcançada após una única geração em panmixia se ela não for iniciada exclusivamente por heterozigotos. Para essa demonstração foram considerados apenas dois pares de alelos autossômicos (A,a e B,b) e a existência de três genótipos na geração inicial, AABB (25%), AaBb (50%) e aabb (25%). Geração Inicial Primeira Geração Filial Casais Freq. AABB AABb AAbb AaBB AaBb Aabb aaBB aaBb aabb AABB × AABB 0,0625 0,062500 - - - - - - - - AABB × AaBb 0,2500 0,062500 0,062500 - 0,062500 0,062500 - - - - AABB × aabb 0,1250 - - - - 0,125000 - - - - AaBb × AaBb 0,2500 0,015625 0,031250 0,015625 0,031250 0,062500 0,031250 0,015625 0,031250 0,015625 AaBb × aabb 0,2500 - - - - 0,062500 0,062500 - 0,062500 0,062500 aabb × aabb 0,0625 - - - - - - - - 0,062500 Total 1,0000 0,140625 0,093750 0,015625 0,093750 0,312500 0,093750 0,015625 0,093750 0,140625 Freqüência esperada em equilíbrio genético 0,0625 0,1250 0,0625 0,1250 0,2500 0,1250 0,0625 0,1250 0,0625 EQUILÍBRIO GENÉTICO E GENES LIGADOS Se dois pares de alelos A,a e B,b pertencerem a um mesmo grupo de ligação e ocorrerem com freqüências p1, ql e p2, q2, poderemos supor que na geração inicial de uma população teórica somente existissem indivíduos com os genótipos AB/AB, AB/ab e ab/ab. Se esses dois pares de 57 52 freqüências gênicas foram estimadas em uma certa população Fya = 0,43 e Fyb = 0,57 no sistema Duffy, e D = 0,60 e d = 0,40 no sistema Rh. Se a população em apreço estiver em equilíbrio genético qual será a freqüência esperada de indivíduos duplamente heterozigotos FyaD/Fybd e Fy a d/Fy b D ? R 6. A freqüência esperada de cada tipo de heterozigotos deve ser 11,76% pois deve-se ter 2(p1p2) (q1q2) = 2(p1q2) (p2q1), isto é, 2 (0,43×0,60)(0,57×0,40) = 2 (0,43×0,40)(0,57×0,60) = 0,1176. Q 7. As freqüências dos genes M e N determinadores dos grupos sangüíneos M, MN e N foram estimadas em 60% e 40% em uma população. Nessa mesma população as freqüências dos genes Lua e Lub, responsáveis pela produção dos antígenos Lua e Lub do sistema sangüíneo Lutheran foram estimadas, respectivamente, em 6% e 94%. Na hipótese de equilíbrio genético, qual a porcentagem de indivíduos com o fenótipo MN Lu(a+b+), isto é, com genótipo MN LuaLub que se espera nessa população? R 7. 5,41% pois (2 × 0,60 × 0,40) (2 × 0,06 × 0,94) = 0,0541. REFERÊNCIAS Neel, J.V. & Schull,W.J. Human Heredity. Univ. Chicago Press, Chicago, 1a. ed., 1954. Noades, J., Gavin, J., Tippett, P., Sanger, R. & Race, R.R. The X-linked blood group system Xg. Tests on British, Northern American and Northern European unrelated people and families. J. Med. Genet. 3: 162-168, 1966. Roisenberg, I. Hemofilia e estados hemofilóides no Rio Grande do Sul. Tese de Doutoramento, Univ. Fed. R.G.do Sul, 1968. 60 53 CAPÍTULO 4. A ANÁLISE FAMILIAL DE POLIMORFISMOS Atualmente aceita-se que um gene com freqüência entre 1% e 99% deve ser classificado como gene polimorfo, aquele com freqüência inferior a 1% deve ser denominado gene idiomorfo, enquanto um gene com freqüência superior a 99% deve ser classificado como gene monomorfo (Morton, 1976/1977). Entretanto, é conveniente deixar bem claro que um loco polimórfico pode incluir entre os alelos a ele pertencentes um ou vários genes idiomorfos. Assim, por exemplo, se os alelos A, a e a1 de determinado loco tiverem freqüências gênicas iguais, respectivamente, a 0,600, 0,395 e 0,005 diremos que os alelos A e a são polimorfos, enquanto o alelo a1 será dito idiomorfo. Por sua vez, os caracteres que resultam de locos que incluem pelo menos dois alelos polimórficos são denominados polimorfismos genéticos ou sistemas genéticos polimórficos. No presente capítulo discutiremos os métodos clássicos de análise familial de caracteres polimórficos para testar uma hipótese monogênica que explique a associação familial de um par de fenótipos alternativos, um dos quais mostra dominância sobre o outro. O final deste capítulo será dedicado a uma abordagem da metodologia utilizada para o estudo familial de caracteres complexos. DISTRIBUIÇÃO FAMILIAL DE POLIMORFISMOS AUTOSSÔMICOS Para acompanhar melhor os métodos clássicos de análise da distribuição familial de um caráter polimórfico nada melhor do que partir de um exemplo concreto. Assim, consideremos os dados apresentados na Figura 1.4 a respeito de 50 famílias, cujos componentes foram classificados segundo a presença ou ausência na saliva de substâncias grupo-específicas hidro-solúveis do sistema ABO. Suponhamos que não se soubesse que a capacidade de secretar ou não essa substância sob a forma hidro-solúvel na saliva e em outros líquidos do corpo é um caráter autossômico monogênico. Nesse caso, a observação da Figura 1.4 nos permitiria dizer, apenas, que os fenótipos secretor e não-secretor mostram uma associação familial, pois a proporção de indivíduos com o fenótipo não-secretor entre os filhos de casais secretor × secretora (14 em 83 ou 16,9%) foi menor do que entre os filhos de casais 61 54 secretor(a) × não-secretor(a) (20 em 47 ou 42,6%), enquanto que todos os 11 filhos de casais não-secretor × não-secretora (100%) manifestaram o fenótipo não-secretor. Em outras palavras, a proporção de indivíduos secretores e não-secretores na geração filial depende do fenótipo dos genitores como se depreende do alto valor de qui-quadrado com dois graus de liberdade, calculado como no quadro abaixo, onde os valores esperados na hipótese de ausência de associação familial estão entre parênteses: F i l h o s Casais Secretor Não-Secretor Total Secretor × Secretora 69 (56,5) 14 (26,5) 83 Secret. × Não-Secret. 27 (32,0) 20 (15,0) 47 Não-Secret.× Não-Secret. - ( 7,5) 11 ( 3,5) 11 Total 96 45 141 (χ2(2)= 34,680; P<0,001) Visto que a capacidade de secretar substâncias grupo-específicas do sistema ABO sob a forma hidro-solúvel é uma característica endógena, é permissível supor que a associação familial observada nos dados da Fig. 1.4 tem determinação genética. Nesse caso, deve-se admitir que o fenótipo não-secretor é recessivo, já que dos casais não-secretor × não-secretora nasceram apenas filhos não-secretores. Por outro lado, pode-se propor uma hipótese monogênica autossômica para explicar a transmissão hereditária desses caracteres. Assim, é permissível supor que o fenótipo não-secretor resulta de um gene autossômico se Fig. 1.4. Dados a respeito de 50 famílias cujos elementos foram classificados segundo a capacidade de secretar substâncias grupo- específicas do sistema ABO na saliva. Os indivíduos secretores estão representados por símbolos escuros e os não-secretores por símbolos claros. 62 57 Portanto, quando se trabalha com uma amostra de famílias, o primeiro passo para pôr à prova uma hipótese monogênica autossômica, a fim de explicar a associação familial de um par de fenótipos alternativos, um dos quais mostrando dominância sobre o outro, consiste em comparar a distribuição observada de casais com aquela esperada segundo os cálculos apresentados acima. Evidentemente, esse passo somente deve ser dado depois de demonstrar, como foi feito acima, que as proporções de cônjuges do sexo masculino que manifestam os fenótipos dominante e recessivo não diferem significativamente daquelas observadas entre os cônjuges femininos, bem como, que o número de casais constituídos por homem A_ e mulher aa não difere significativamente do número de casais compostos por homem aa e mulher A_. Aqui é importante tecer algumas considerações sobre a maneira de estimar a freqüência q do alelo a e, por diferença, a freqüência p do alelo A, visto que p = 1 – q. Muitos autores têm estimado a freqüência q a partir da própria amostra de famílias por eles coletadas. Assim, com base em uma amostra de N famílias, contendo n1 casais A_× A_, n2 casais A_× aa, n3 casais aa× aa e um total de f filhos, parte dos quais tem o fenótipo recessivo (faa) e os restantes o fenótipo dominante (fA_), esses autores têm estimado a freqüência q do alelo a a partir de q = f2N fn2n aa23 + ++ . Outros pesquisadores têm levado em conta apenas as 2N pessoas que constituem os N casais, de sorte que estimam a freqüência q do alelo a a partir de q = 2N n2n 23 + . Obviamente, em ambos os casos a estimativa da freqüência p do alelo A é obtida por intermédio de p = 1- q. Entretanto, essas não são as maneiras mais corretas de se estimar as freqüências p e q para se fazer a análise familial. Isso porque os indivíduos da geração filial não são independentes da geração paterna, nem são, freqüentemente, independentes entre si, visto que, muitos deles, são irmãos. Portanto, a maneira mais correta para se estimar as freqüências dos alelos A e a é a de verificar as freqüências dos fenótipos alternativos em uma amostra aleatória da população da qual procedem as famílias. Desse modo, a freqüência dos indivíduos com o fenótipo recessivo será considerada como q2, a freqüência do alelo a será a raiz quadrada desse valor, e a freqüência do alelo A será p = 1 - q. 65 58 Apesar de ser mais correto estimar as freqüências dos alelos a partir de uma amostra aleatória da população da qual procedem as famílias, é importante ressaltar que, se a amostra das famílias for grande e a freqüência dos genes for alta não se correrá o risco de estimar erradamente as freqüências gênicas, a partir dos próprios casais coletados. Retomando, agora, os dados de nosso exemplo, consideremos que em uma amostra aleatória de 100 indivíduos procedentes da população na qual foram coletadas as 50 famílias da Fig. 1.4, constatou-se que 73 eram secretores e 27 não-secretores. Isso permite escrever que q2 = 0,27 e, a partir daí estimar q = 270, = 0,52 e p = 1 – q = 0,48. Temos, pois, os elementos para calcular a distribuição esperada de casais segundo os fenótipos secretor e não-secretor, de acordo com a hipótese monogênica, como abaixo: Se_× Se_ = N(1-q2)2 = 26,64 Se_× sese = 2Nq2(1-q2) = 19,71 sese × sese = Nq4 = 3,65 Essa distribuição é comparada, em seguida, com a observada por intermédio de um teste de qui-quadrado. Visto que para calcular as três classes esperadas necessitamos apenas de uma informação da amostra, isto é, do total de casais, o qui-quadrado, nesse caso, terá dois graus de liberdade (3 -1 = 2). Entretanto, se tivéssemos estimado a freqüência q do alelo se a partir dos casais ou dos casais e seus filhos, o qui-quadrado teria, evidentemente, apenas um grau de liberdade, porque, além do tamanho amostral estaríamos nos valendo de uma segunda informação da amostra. Comparando as proporções observadas com as esperadas como no quadro abaixo, concluímos, pelo valor do qui-quadrado com dois graus de liberdade (0,616) as diferenças entre elas não são significativas, o que indica que a distribuição dos casais está de acordo com a esperada segundo a hipótese monogênica. Casais Obs. Esp. e e)(o 2− Se_× Se_ 29 26,64 0,209 Se_× sese 17 19,71 0,373 sese × sese 4 3,65 0,034 χ2(2)= 0,616; 0,70< P <0,80. O segundo passo a ser dado para pôr à prova uma hipótese monogênica autossômica, a fim de explicar a associação familial de um par de fenótipos alternativos, 66 59 um dos quais mostrando dominância sobre o outro, consiste em comparar a distribuição fenotípica observada entre os elementos que constituem as irmandades geradas pelos três tipos de casais (A_× A_ , A_× aa e aa × aa), com aquela esperada de acordo com a hipótese monogênica. Para tal investigação o geneticista pode valer-se de métodos simples, como os sugeridos por Snyder (1932) e por Fisher (1939). O MÉTODO DE SNYDER No método de Snyder (l932) considera-se que se f1 for o número total de filhos dos casais A_× A_ da amostra, e se q for a freqüência do alelo a, determinador do fenótipo recessivo aa, o número esperado de indivíduos com o fenótipo recessivo entre os filhos de casais A_× A_ deve ser, 2       + q1 q de acordo com a hipótese monogênica. De fato, sabemos que a probabilidade de um casal A_× A_ gerar um filho aa é igual a 4 1 da probabilidade de os dois cônjuges serem Aa, dado que são A_, isto é, P(Aa|A_).P(Aa|A_). 4 1 =       + q1 2q       + q1 2q 4 1 = 2       + q1 q Multiplicando essa probabilidade por f1, isto é, 2       + q1 q f1, obtém-se o número esperado de indivíduos aa entre os filhos de casais A_ × A_. Se f2 for o número total de filhos de casais A_× aa da amostra, espera-se, de acordo com a hipótese monogênica, que q1 q + f2 manifestem o fenótipo recessivo, pois sabemos que a probabilidade de um casal A_× aa gerar um filho aa é igual à metade da probabilidade de o cônjuge A_ ser Aa, isto é, P(Aa|A_). 2 1 = q1 q + Assim, multiplicando essa probabilidade por f2, isto é, q1 q + f2, obtém-se o número esperado de indivíduos aa entre os filhos de casais A_× aa. Evidentemente, se f3 for o número total de filhos de casais aa × aa, espera-se que o fenótipo recessivo ocorra em todos os f3 indivíduos, já que os cônjuges devem ser sempre 67 62 conclui-se que a probabilidade de um filho de um casal A_ × A_ manifestar o fenótipo dominante A_ será, de acordo com a hipótese monogênica, igual a 1 - 2       + q1 2q + 4 3 2       + q1 2q Em uma irmandade de i irmãos gerados por um casal A_ × A_, a probabilidade de todos os i irmãos terem o fenótipo dominante será, portanto, igual a 1 - 2       + q1 2q + i       4 3 2       + q1 2q Se lidarmos com n irmandades de i irmãos, é claro que o número esperado de irmandades constituídas apenas por indivíduos que manifestam o fenótipo A_ será igual a n               +             + − 22 4 3 1 q1 2q + q1 2q i Em uma amostra incluindo irmandades de vários tamanhos poder-se-á, portanto, calcular o número esperado de irmandades constituídas somente por indivíduos com o fenótipo dominante A_ por intermédio de Σn               +             + − 22 4 3 1 q1 2q + q1 2q i Obviamente, o número esperado de casais A_ × A_ com pelo menos um filho aa será obtido pela diferença entre o número total de irmandades geradas pelos casais A_ × A_ e o número esperado daquelas que têm apenas indivíduos com o fenótipo dominante A_. No concernente aos filhos de casais A_× aa têm-se, de acordo com a hipótese monogênica, que a probabilidade de um filho de tal tipo de casal manifestar o fenótipo A_ depende da probabilidade de o cônjuge com fenótipo dominante ser homozigoto, isto é, P(AA|A_) = q1 p + ,bem como da probabilidade de ele ser heterozigoto , isto é, P(Aa|A_) = q1 2q + . Se o cônjuge com fenótipo dominante for homozigoto, é evidente que o filho do casal A_× aa terá, certamente, fenótipo dominante. Se, entretanto, o cônjuge com o fenótipo dominante for heterozigoto é claro, também, que a probabilidade de um filho do casal A_× aa ter fenótipo dominante será igual a 2 1 . Portanto, pode-se dizer, que a 70 63 probabilidade de um filho de um casal A_× aa manifestar fenótipo dominante é, de acordo com um a hipótese monogênica igual a q1 2q q1 p + ⋅+ + 2 1 . Em uma irmandade de i irmãos gerados por um casal A_× aa a probabilidade de todos os i irmãos terem o fenótipo dominante será, pois, igual a q1 2q q1 p i +       + + 2 1 . Lidando com n irmandades de i irmãos gerados por casais A_× aa é óbvio que o número esperado daquelas constituídas somente por indivíduos com o fenótipo dominante será calculado a partir de: n         +       + + q1 2q q1 p i 2 1 Em uma amostra que inclua irmandades de diferentes tamanhos, geradas por casais A_× aa calcular-se-á o número esperado daquelas compostas somente por indivíduos com o fenótipo dominante por intermédio de Σn         +       + + q1 2q q1 p i 2 1 Tal fórmula também pode ser escrita como Σn               + −      + + q1 p q1 p i 1 2 1 pois q1 2q + é igual a q1 p + −1 . O número esperado de casais A_× aa, com pelo menos um filho apresentando o fenótipo recessivo aa, será obtido pela diferença entre o número total de irmandades geradas pelos casais A_× aa e o número esperado daquelas que têm apenas indivíduos com o fenótipo dominante A_. Podemos, agora, analisar a geração filial pelo método de Fisher (1939), dispondo os dados da Figura 1.4 como na Tabela 4.4. Nessa tabela os números esperados de irmandades geradas por casais Se_× Se_ e por casais Se_× sese que deveriam ser constituídas por indivíduos Se_ foram calculados com o emprego das fórmulas mencionadas neste tópico. Assim, por exemplo, para obter o número esperado de irmandades constituídas por dois 71 64 Tabela 4.4. Análise dos dados familiais da Fig.1 pelo método de Fisher (1939). i - tamanho da irmandade; n = número de irmandades de tamanho i; P - probabilidade de uma irmandade de tamanho i ser constituída somente por secretores (Se_); ESP. - número esperado de irmandades constituídas apenas por indivíduos secretores; OBS. – número observado de irmandades compostas apenas por indivíduos secretores. Casais i n P Esp. Obs. 2 14 0,795 11,130 10 3 8 0,729 5,832 6 4 5 0,680 3,400 3 5 1 0,643 0,643 - 6 1 0,615 0,615 1 Se_ × Se_ Total 29 21,620 20 2 8 0,487 3,896 3 3 6 0,402 2,412 4 4 2 0,359 0,718 1 5 1 0,337 0,337 1 Se_ × sese Total 17 7.363 9 2 3 5 1 sese × sese Total 4 Casais Irmandades Obs. Esp. χ2(1) Apenas Se_ 20 21,620 Se_ × Se_ Com sese 9 7,380 0,477; 0,30<P<0,50 Apenas Se_ 9 7,363 Se_ × sese Com sese 8 9,637 0,642; 0,30<P<0,50 indivíduos Se_ filhos de casais Se_× Se_, calculou-se, inicialmente, a probabilidade de encontro de tais irmandades por intermédio de 0,532 + (0,5625 × 0,468) = 0,795, pois: 2       + q1 2q = 2 5201 52002       × , , = 0,468 −1 2       + q1 2q = 0,532 2 4 3       = 0,5625 Multiplicando a probabilidade 0,795 pelo número total de irmandades com dois filhos, que, em nosso caso é 14, obtém-se o número esperado daquelas constituídas apenas por indivíduos Se_ (11,130). Operações análogas foram feitas para obter o número esperado de irmandades com 3, 4, 5 e 6 indivíduos, todos apresentando o fenótipo secretor. Para obter, por exemplo, o número esperado de irmandades constituídas por dois indivíduos Se_, filhos de casais Se_× sese, calculou-se, inicialmente, a probabilidade de encontro de tais irmandades por intermédio de 0,316 + (0,25 x 0,684) = 0,487, pois: q1 p + = 5201 4800 , , = 0,316 q1 p + −1 = 0,684 2 2 1       = 0,25 72 67 4. Se o número total de filhos do sexo masculino gerados pelos casais XAY × XAX- for m e a freqüência do gene a for q, o número esperado de filhos XaY desses casais não deve desviar-se significativamente de q1 qm + . Isso porque consideramos que a probabilidade de um filho de um casal XAY × XAX- ser XaY é igual à metade da probabilidade de sua mãe ser heterozigota, dado que ela tem o fenótipo dominante. De fato, a probabilidade de uma mulher heterozigota XAXa transmitir o cromossomo Xa a um filho é 2 1 , enquanto que a probabilidade de uma mulher XAX- ser heterozigota é P(XAXa | XAX- ) = q1 2q 2pqp 2pq 2 + = + . Portanto, 2 1 . q1 2q + = q1 q + . 5. Se f for o número de filhas e m for o número de filhos de casais XAY × XAX-, o número esperado de filhas com o fenótipo recessivo será q1 qf + e o número esperado de filhos com esse fenótipo será q1 qm + , pelas mesmas razões expostas no item anterior. Os números esperados de filhos e de filhas com o fenótipo dominante serão obtidos pelas diferenças entre f e m e os números esperados de indivíduos com o fenótipo recessivo de cada sexo. A Tabela 5.4 resume o que foi discutido até agora no presente tópico. Tabela 5.4. Distribuição esperada em uma amostra aleatória de N famílias segundo os fenótipos A_ e aa determinados por um par de alelos A,a do cromossomo X, com freqüências iguais, respectivamente, a p e q =1- p, quando a população da qual procede a amostra está em equilíbrio genético. C a s a i s F i l h a s F i l h o s Tipo No. XaXa XAX- Total XaY XAY Total XAY× XAX- Np (1 – q2) - f1 f1 q qm1 +1 m1 - q qm1 +1 m1 XAY× XaXa Npq2 - f2 f2 m2 - m2 XaY × XAX- Nq (1-q2) q qf 3 +1 f3 - q qf 3 +1 f3 q qm3 +1 m3 - q qm3 +1 m3 XaY× XaXa Nq3 f4 - f4 m4 m4 Uma outra alternativa para verificar se a distribuição dos filhos de casais XAY × XAX- e dos filhos e filhas dos casais XaY × XAX- está de acordo com a hipótese 75 68 monogênica, consiste em comparar os números observados e esperados de irmandades constituídas apenas por indivíduos com o fenótipo dominante, bem como aquelas que incluem pelo menos um indivíduo com o fenótipo recessivo, por intermédio, respectivamente, de               + −      + +∑ q p q p n i 1 1 2 1 1 e               + −      + + −∑∑ q p q p nn i 1 1 2 1 1 No caso de irmandades geradas por casais XAY × XAX-, n indica o número de irmandades com i indivíduos do sexo masculino, enquanto que, em relação às irmandades geradas por casais XaY × XAX-, n se refere ao total de indivíduos nas irmandades. Um exemplo poderá esclarecer melhor o que foi discutido até agora no presente tópico. Assim, suponhamos que não soubéssemos que o grupo sangüíneo Xg(a-) é determinado por um gene do cromossomo X, que se manifesta nas mulheres homozigotas e nos homens hemizigotos, enquanto que o grupo sangüíneo Xg(a+) é determinado por um alelo desse gene. Apesar disso, poderíamos com base nos dados da Fig. 2.4, a respeito de 50 famílias estudadas por Mann et al. (1962), sugerir a hipótese da existência de um par de alelos Xga,Xg para explicar esses grupos sangüíneos, sendo o alelo Xga determinador do grupo Xg(a+) e o alelo Xg em homozigose nas mulheres e em hemizigose nos homens o responsável pelo grupo Xg(a-). Fig. 2.4 Dados a respeito de 50 famílias cujos elementos tiveram suas hemácias classificadas com um anti-soro anti-Xga por Mann et al. (1962). Os indivíduos Xg(a+) estão representados por símbolos escuros e os Xg(a-) por símbolos claros. 76 69 De fato, a sugestão de que esses fenótipos dependem do sexo dos indivíduos é dada pelo fato de que o grupo sangüíneo Xg(a+) é mais freqüente nas mulheres. Assim, levando em conta apenas os casais da Figura 2.4 tem-se que, 33 dentre os 50 homens (66%) eram Xg(a+), ao passo que, dentre 50 mulheres, 46 manifestavam esse grupo sangüíneo (92%). Por outro lado, fala a favor de que o grupo sangüíneo Xg(a-) é um caráter recessivo ligado ao sexo. a verificação, na Figura 2.4, de que: 1. O único casal Xg(a-) × Xg(a-) gerou uma filha e dois filhos Xg(a-). 2. Todas as filhas de pai Xg(a+) eram Xg(a+). 3. Todos os filhos de mãe Xg(a-) eram Xg(a-); Para pôr à prova a hipótese em discussão precisamos, evidentemente, da estimativa das freqüências dos supostos alelos Xga e Xg. Assim, partindo de dados de Mann et al. (1962) que, em 342 caucasóides (154 homens e 188 mulheres), encontraram 95 homens Xg(a+), 59 homens Xg(a-), 167 mulheres Xg(a+) e 21 mulheres Xg(a-), podemos estimar a freqüência q do alelo Xg em 0,356, pois: q = ]154)1882[(2 ]59)212][(154)1882[(4)95(95 2 +× +×+×++− = 0,356 o que equivale a dizer que a estimativa da freqüência do gene Xga é p = 1 - 0,356 = 0,644 Com base nas estimativas p e q calculamos a distribuição esperada dos diferentes tipos de casais e seus filhos, de acordo com a hipótese monogênica, dispondo os dados como na Tabela 6.4. Nessa tabela os números observados foram obtidos a partir da Figura 2.4 e os esperados foram calculados segundo as fórmulas expressas na Tabela 5.4. Tabela 6.4. Números observados e esperados de casais e de filhos Xg(a+) e Xg(a-) na amostra de 50 famílias estudadas por Mann et al. (1962). Entre parênteses estão assinalados os valores esperados. C a s a i s F i l h a s F i l h o s Marido × Mulher No. Xg(a-) Xg(a+) Total Xg(a-) Xg(a+) Total Xg(a+) × Xg(a+) 30 (28,1) - ( - ) 29 (29,0) 29 12 (9,2) 23 (25,8) 35 Xg(a+) × Xg(a-) 3 ( 4,1) - ( - ) 4 ( 4,0) 4 3 (3,0) - 3 Xg(a-) × Xg(a+) 16(15,5) 7 (4,5) 10 ( 2,5) 17 4 (3,4) 9 (9,6) 13 Xg(a-) × Xg(a-) 1 ( 2,3) 1 (1,0) - ( - ) 1 2 (2,0) - 2 . 77 72 mulher AA × marido AA = p4 mulher AA × marido Aa = 2p3q mulher AA × marido aa = p2q2 Tabela 8.4. Freqüências dos tipos de pares mãe-filho(a) em uma população em equilíbrio genético, levando-se em conta caracteres autossômicos e ligados ao sexo, com e sem relação de dominância. A. Caracteres autossômicos sem dominância. F i l h o (a) Mãe AA Aa aa Total AA p3 p2q - p2 Aa p 2 q pq pq 2 2pq aa - pq 2 q 3 q 2 Total p2 2pq q2 1,0 B. Caracteres autossômicos com dominância. F i l h o (a) Mãe A_ aa Total A_ p(1+pq) pq2 P2+2pq Aa pq2 q3 q2 Total p2+2pq q2 1,0 C. Caracteres ligados ao sexo sem dominância. F i l h o Mãe XAY XaY Total XAXA p2 - p2 XAXa pq pq 2pq XaXa - q2 q2 Total p q 1,0 D. Caracteres ligados ao sexo com dominância. F i l h o Mãe XAY XaY Total XAX- p2+ pq pq p2+ 2pq XaXa - q2 q2 Total p q 1,0 Os filhos desses casais, por sua vez, se distribuirão como abaixo: mulher AA × marido AA = p4 filhos AA mulher AA × marido Aa = p3q filhos AA e p3q filhos Aa mulher AA × marido aa = p2q2 filhos Aa 80 73 Portanto, a freqüência total de filhos AA de mães AA será p4 + p3q = p3(p + q) = p3 e o de filhos Aa dessas mães será p2q2 + p3 q = p2q (p + q) = p2q, pois p + q = 1. Para demonstrar como a análise dos dados de pares mãe-filho(a) poderia ser utilizada no estudo de um caráter supostamente autossômico monogênico, consideremos na Figura 1.4 apenas as mães e o primeiro indivíduo de cada irmandade. Com tal conduta, obtemos os dados necessários à construção da Tabela 9.4 na qual os valores esperados são obtidos a partir das fórmulas expressas na Tabela 8.4-B. As estimativas de p e q são aquelas obtidas por intermédio de dados populacionais (q = 0,520 e p = 0,480). Tabela 9.4. Proporções observadas e esperadas de pares mãe-filho(a) com os fenótipos secretor e não-secretor. Entre parênteses foram assinalados os valores esperados. F i l h o (a) Mãe Secretor(a) Não-Secretor(a) Total Secretora 32 (30,0) 7 ( 6,5) 39 (36,5) Não-Secretora 4 ( 6,5) 7 ( 7,0) 11 (13,5) Total 36 (36,5) 14(13,5) 50 (50,0) Os dados da Tabela 9.4 permitem constatar que as proporções observadas de mães secretoras (39) e não-secretoras (11) não se desviam significativamente das esperadas (χ2(1)= 0,634; 0,30<P<0,50). Do mesmo modo, não é possível constatar desvio significativo entre as proporções observadas e esperadas de secretores e não-secretores nos filhos (χ2(1) = 0,026; 0,80< P< 0,90). Além disso, as proporções desses fenótipos alternativos nas mães não difere daquela verificada nos filhos (χ2(1) = 0,480; 0,30< P< 0,50). No concernente às quatro classes de mães e filhos, a comparação dos valores observados com os esperados permite concluir, também, pela falta de significação dos desvios, pois o qui-quadrado com três graus de liberdade é igual a 1,133 (0,98 < P < 0,99). Tais comparações, portanto, permitiriam aceitar a hipótese de herança monogênica sem a necessidade de estudar famílias completas. A título de exercício o leitor pode aplicar este tipo de investigação aos dados da Figura 2.4, considerando os dados formados pelo primeiro filho do sexo masculino das irmandades e suas respectivas mães. 81 74 A ANÁLISE FAMILIAL DE CARACTERES COMPLEXOS Nos tópicos anteriores tivemos a oportunidade de discutir a análise familial de caracteres que tinham uma transmissão estritamente mendeliana, ou seja, para explicar a manifestação e transmissão hereditária desses caracteres podíamos desprezar o efeito do ambiente e da constelação gênica individual, isto é, não levávamos em conta a participação multifatorial. Em relação a numerosos outros caracteres humanos, denominados caracteres complexos, essa simplicidade, entretanto, não pode ser aceita a priori. Tais caracteres requerem, para sua análise familial, métodos mais poderosos, que exigem programas de computação, sendo o mais utilizado atualmente aquele que é denominado método unificado de análise de segregação (Lalouel et al.,1983). Esse método de análise de segregação parte de um modelo, denominado modelo mendeliano misto, o qual considera que a manifestação do caráter em estudo depende da contribuição independente dos alelos de um loco autossômico principal, de um componente poligênico e, ainda, de fatores aleatórios do ambiente. No loco autossômico principal supõe-se a existência de um par de alelos A,a com freqüências p e q = 1 - p, sendo a distribuição populacional dos genótipos resultantes (AA, Aa e aa) feita segundo a lei de Hardy e Weinberg, isto é, segundo (p+q)2, isto é, AA: Aa: aa :: p2+ 2pq+ q2. A posição da média do genótipo heterozigoto (Aa) em relação às médias dos homozigotos é designada por grau de dominância e representada por d. No caso de um dos fenótipos em estudo ser completamente dominante (AA = Aa), d será igual a 1 e, em havendo codominância, d será igual a 0,5. Se a dominância for parcial ter-se-á 0,5 < d < 1. A distância entre as médias dos dois genótipos homozigotos (AA e aa) é denominada deslocamento e representada por t. Aceita-se que a variação em torno da média de cada um desses genótipos tem distribuição normal, com uma variância comum C + E a todos, sendo C a variância devida a efeitos multifatoriais transmissíveis e E o componente da variância residual do ambiente que não é transmitido dentro das famílias. A variância fenotípica total é designada por V e a razão V C = H é a herdabilidade, que reflete a transmissão poligênica. No modelo misto são quatro os parâmetros estimados, isto é, o grau de dominância (d), a distância entre as médias dos homozigotos (t), a freqüência de um dos alelos (q) e a 82 77 caráter em estudo. Isso porque, embora a associação familial não implique, obrigatoriamente, na hereditariedade de um caráter, o oposto é verdadeiro, isto é, todo o caráter hereditário é familial. O q.v. do modelo mendeliano misto deve, por isso, ser comparado com o q.v. do modelo esporádico, que propõe a inexistência de agregação familial e, em seguida, com o q.v. do modelo que prega a inexistência de um gene principal e com o q.v. do modelo que fala a favor da inexistência de um componente multifatorial. Tabela 10.4. Análise de segregação da reação de Mitsuda, levando em conta 544 famílias nucleares com 2.925 indivíduos. d = grau de dominância; t = deslocamento; q = freqüência do alelo a; H = herdabilidade; τAA,, τAa e τaa = probabilidades de os genótipos AA, Aa e aa transmitirem o alelo A; q.v. = quociente de verossimilhança (-2lnL+c), P.E. = parâmetros estimados; G.L. = graus de liberdade. Em itálico negrito foram assinalados os parâmetros estimados. (Modificado de Feitosa et al., 1996). MODELO d t q H τAA τAa τaa q.v. P.E. Teste χ2 G.L. P 1. Misto 0,81 1,98 0,47 0,0* 1 ½ 0 0,07 4 2. Esporádico 0 0 0 0 - - - 238,57 0 1×2 238,50 4 <0,001 3. Sem gene principal 0 0 0 0,66 - - - 27,87 1 1×3 27,80 3 <0,001 4. Sem comp.multifatorial 0,81 1,98 0,47 0 1 ½ 0 0,07 3 1×4 0 1 ≅ 1 5. Misto completo 0,80 1,99 0,47 0,0* 1,0* 0,49 0,0* 0,00 7 1×5 0,07 3 >0,99 6. τAA = τAa = τaa 0,35 1,60 0,17 0,0* 1,0* 198,28 5 5×6 198,28 2 <0,001 7. Mendeliano recessivo 0 1,86 0,88 0 1 ½ 0 35,52 2 1×7 35,45 2 <0,001 8. Mendeliano aditivo ½ 2,44 0,47 0 1 ½ 0 13,56 2 1×8 13,49 2 <0,01 9. Mendeliano dominante 1 1,65 0,45 0 1 ½ 0 9,15 2 1×9 9,08 2 <0,02 *Atingiu o limite. Na primeira dessas comparações, isto é, entre os modelos mendeliano misto (modelo No. 1) e esporádico (modelo No. 2), testamos a hipótese nula de inexistência de associação familial contra a hipótese alternativa de que, para a manifestação do caráter em estudo, devemos aceitar que ela existe. Visto que o q.v. do modelo esporádico foi 238,57 e o do modelo mendeliano misto foi 0,07 tem-se χ2(4) = 238,57 - 0,07 = 238,50; P << 0,001. Esse qui-quadrado tem 4 graus de liberdade porque a diferença entre os parâmetros estimados é 4 (4 no modelo mendeliano misto e 0 no modelo esporádico). O valor do qui- quadrado encontrado indica, pois, que devemos rejeitar a hipótese nula que fala a favor do modelo esporádico, isto é, a inexistência de associação familial, e devemos optar pela hipótese alternativa, que pede a aceitação do modelo mendeliano misto e, com isso, a aceitação da existência de agregação familial. 85 78 Na segunda comparação, feita entre o q.v. do modelo mendeliano misto (modelo No. 1) e o q.v. do modelo que propõe a inexistência de um gene principal (modelo No. 3), a hipótese nula é a de que não há gene principal contra a alternativa de que ele existe. Por ser o q.v. do modelo sem gene principal igual a 27,87 e o do modelo mendeliano misto igual a 0,07, tem-se χ2(3) = 27,87 - 0,07 = 27,80; P< 0,001, possuindo esse qui-quadrado 3 graus de liberdade, porque o modelo mendeliano misto tem 4 parâmetros estimados enquanto o modelo que prega a inexistência de um gene principal tem um único (4 - 1 = 3). Esse valor de qui-quadrado também fala a favor da rejeição da hipótese nula e pela aceitação da hipótese alternativa, que prega a existência de um gene principal. Na terceira comparação, feita entre o q.v. do modelo mendeliano misto (modelo No.1) e o q.v. do modelo que prega a inexistência de um componente multifatorial (modelo No.4), a hipótese nula é a de que não existe componente multifatorial e a alternativa é a de que ele existe. Por serem os q.v.s de ambos modelos iguais a 0,07, e por ter o modelo que propõe a inexistência de um componente multifatorial 3 parâmetros estimados, a hipótese nula pode ser aceita, isto é, pode-se rejeitar a importância da participação de um componente multifatorial na manifestação do caráter em estudo, pois χ2(1) = 0,07 - 0,07 = 0; P ≅ 1. A coerência dos resultados apresentados na Tabela 1.40 é ressaltada pelo fato de que a hipótese nula de transmissão mendeliana do modelo que chamamos de misto completo (modelo No. 5) é facilmente aceita quando o seu q.v. é comparado ao q.v. do modelo mendeliano misto (modelo No. 1), fornecendo um pequeno qui-quadrado com três graus de liberdade (χ2(3) = 0,07 - 0,0 = 0,07; P > 0,99), pois, levando em conta os parâmetros estimados, tem-se 7 – 4 = 3. Na Tabela 1.40 é fácil constatar que, no modelo misto completo, os valores estimados de τAA, τAa e τaa ficaram muito próximos daqueles fixados pela teoria nos modelos No.s 1, 4, 7, 8 e 9, isto é, muito semelhantes a 1, ½ e 0. Em oposição, a hipótese nula que afirma não haver transmissão mendeliana de um gene principal (modelo No. 6) contra a hipótese de que ela existe (modelo No. 5) é facilmente rejeitada (χ2(2) = 198,28 - 0,00 = 198,28; P << 0,001). Finalmente, comparando os valores dos q.v.s dos modelos estritamente recessivo (modelo No.7), aditivo (modelo No.8) e dominante (modelo No. 9) com o q.v. do modelo mendeliano misto (modelo No.1) conclui-se que as hipóteses propostas por esses três 86 79 modelos devem ser rejeitadas. De fato, levando em conta os valores de qui-quadrado, todos com 2 graus de liberdade, porque no modelo No. 1 foram estimados 4 parâmetros enquanto que nos outros três modelos só foram estimados 2 parâmetros, verifica-se que o modelo estritamente recessivo não pode ser aceito porque χ2(2) = 35,52 – 0,07 = 35,45; P<0,001 e o modelo mendeliano aditivo deve ser rejeitado porque χ2(2) =13,56 – 0,07 = 13,49; P<0,01. O modelo estritamente dominante também não pode ser aceito porque χ2(2) = 9,15 – 0,07 =. 9,08; P<0,02 o que permite aceitar o modelo mendeliano misto, que fala a favor de um efeito parcialmente dominante da reação Mitsuda-positivo sobre a reação Mitsuda-negativo, com d = 0,81 e desvio padrão estimado em 0,041. QUESTÕES E RESPOSTAS Q 1. Ao estudar 304 famílias dinamarquesas com o auxílio do anti-soro anti-P1, Henningsen (1950) encontrou a distribuição apresentada na tabela abaixo. Nessa tabela os indivíduos do grupo sangüíneo P1 são aqueles cujas hemácias aglutinam quando suspensas no anti-soro anti-P1, sendo os do grupo P2 aqueles em que isso não ocorre. C a s a i s F i l h o s Tipo No. P1 P2 Total P1 × P1 194 471 53 524 P1 × P2 93 169 71 240 P2 × P2 17 1 38 39 Considerando que na população da qual procedem as famílias estudadas a freqüência do grupo sangüíneo P2 pode ser estimada em 20,25%, teste a hipótese de que os grupos sangüíneos P1 e P2 decorrem de um par de alelos autossômicos e que do fenótipo P1 é dominante, empregando o método de Snyder (1932). Para tanto, parta do pressuposto de que já foi demonstrado que: a) As proporções de indivíduos P1 e P2 entre os cônjuges do sexo masculino não diferem significativamente das observadas entre os do sexo feminino. b) O número de casais compostos por marido P1 e mulher P2 e o de casais constituídos por marido P2 e mulher P1 não diferem significativamente. c) A proporção de indivíduos P1 e P2 entre os filhos dos diferentes tipos de casais é independente do sexo. 87 82 .Q 3. Um pesquisador verificou que os seres humanos podiam ser classificados em um grupo positivo ou negativo conforme as suas hemácias aglutinassem ou não quando suspensas em um anti-soro por ele descoberto. As proporções de homens e de mulheres com respostas positiva (+) e negativa (-) não diferiram significativamente, permitindo estimar que 36% dos indivíduos dão resposta positiva e 64% resposta negativa. Os casais positivo × positivo geraram filhos positivos e negativos, mas os casais negativo × negativo geraram apenas filhos com resposta negativa. O referido pesquisador estudou a freqüência do caráter em questão, analisando 100 pares de mães e filhos(as), entre os quais anotou 25 pares ++, 9 pares +-,10 pares -+ e 56 pares --. Verificar se é possível aceitar a hipótese de que os grupos positivo e negativo têm determinação monogênica autossômica, sendo o grupo negativo recessivo em relação ao grupo positivo. R 3. Pode-se aceitar a hipótese de que o caráter em questão tem determinação monogênica autossômica e que o grupo negativo é recessivo, porque: q 2 = 0,64; q = 0,8; p = 1 - 0,8 = 0,2. Mães Filhos + Filhos - Total + 25 (23,2) 9 (12,8) 34 - 10 (12,8) 56 (51,2) 66 Total 35 65 100 Mães: χ2(1) = 0,174; 0,50<P<0,70 Filhos: χ2(1) = 0,043; 0,80<P<0,90 Mães × Filhos: χ2(1) = 0,022; 0,80<P<0,90 Pares: χ2(3) = 2,330; 0,50<P<0,70 Q 4. Um pesquisador verificou que os seres humanos podem ser classificados em normais e deficientes conforme apresentem ou não uma enzima eritrocitária ativa em certas condições experimentais. Verificou, também, que dentre 100 homens examinados, 12 foram classificados como deficientes, enquanto que, dentre 100 mulheres estudadas, apenas uma não apresentou atividade da enzima eritrocitária em apreço. O estudo de 100 famílias quanto aos fenótipos normal e deficiente mostrou a distribuição apresentada na tabela abaixo. Com base nesses dados é possível aceitar a 90 83 hipótese de que esses fenótipos são determinados por um par de alelos do cromossomo X, e que o fenótipo normal é dominante nas mulheres? Casais F i l h o s F i l h a s Marido×Mulher No. Normais Deficientes Total Normais Deficientes Total Normal×Normal 87 117 15 132 128 - 128 Normal×Deficiente 1 - 1 1 3 - 3 Deficiente×Normal 12 24 2 26 19 3 22 R 4. Pode-se aceitar a hipótese de herança monogênica ligada ao sexo e que o fenótipo normal é dominante nas mulheres porque: Ma = 12 Faa = 1 MA = 88 FA_ = 99 q = 600 )142001(744788 ×++− .. = 0,11 p = 1 - 0,11 = 0,89 Marido× Mulher Obs. Esp. Normal × Normal 87 87,9 Normal × Deficiente 1 1,1 Deficiente × Normal 12 10,9 Normal × Deficiente - 0,1 χ2(3) = 0,229; 0,95<P<0,98 Casais F i l h o s F i l h a s Marido × Mulher Normais Deficientes Total Normais Deficientes Total 117 (118,9) 15 (13,1) 132 128 - 128 Normal × Normal χ2(1) = 0,306; 0,50<P<0,70 24 (23,4) 2 (2,6) 26 19 (19,8) 3 (2,8) 22 Deficiente × Normal χ2(1) = 0,154; 0,50<P<0,70 χ 2 (1) = 0,323; 0,50<P<0,70 REFERÊNCIAS Beiguelman, B. Hereditariedade da reação de Mitsuda. Rev. Brasil. Leprol. 30: 153-172, 1962. Beiguelman, B. The genetics of the resistance to leprosy. Internat. J. Lepr. 33: 808-812, 1965. Beiguelman, B. & Quagliato, R. Nature and familial character of the lepromin reactions. Internat.J. Lepr. 33: 800-807, 1965. 91 84 Beiguelman B. A reação de Mitsuda oitenta anos depois. Hansen. Internat. 24: 144-16, 1999. Beiguelman, B. Genética e hanseníase. Ciência & Saúde Coletiva 7: 11-128, 2002. Feitosa, M., Krieger, H., Borecki, I., Beiguelman, B. & Rao, D.C. 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Ohio J. Sci. 32: 436-440, 1932. 92 87 existência de casamentos consangüíneos em alta proporção em eras pregressas é aquela que melhor serve para explicar o fenômeno da perda de ancestrais. Assim, por exemplo, enquanto os filhos de não-consangüíneos têm oito bisavós, os filhos de primos em primeiro grau têm seis e os filhos de primos duplos em primeiro grau têm quatro bisavós. O fenômeno da perda dos ancestrais nos leva, pois, a concluir com Stern (1960) que, do ponto de vista evolutivo, a fraternidade da espécie humana não é um mero conceito espiritual, mas uma realidade genética. No Levítico existem indicações de que entre os povos anteriores e contemporâneos dos antigos hebreus os casamentos incestuosos poderiam não ter sido circunscritos apenas às famílias reais, como as de algumas dinastias do Egito (Figura 1.5). É o que se depreende das restrições que a Lei Mosaica faz no Levítico, 18:26-27, aos casamentos consangüíneos e a outras uniões, com a advertência: "Guardai as minhas leis e os meus mandamentos, e não cometais nenhuma dessas abominações, tanto os naturais quanto os estrangeiros entre vós. Porque todas essas execrações cometeram os que foram, antes de vós, habitantes desta terra, e a contaminaram". Curiosamente, o casamento entre irmãos também foi a regra entre os reis incas (Rothhammer e Cruz-Coke, 1977). Assim, nas onze gerações que antecederam à do rei Huáscar, que Pizarro mandou assassinar em 1532, nove foram de casamentos entre irmãos, uma de casamento de primos em primeiro grau e uma de tia com sobrinho (Figura 2.5). Quando as populações são muito pequenas, os casamentos consangüíneos podem ocorrer não porque sejam preferenciais, mas porque o tamanho reduzido da população faz com que aumente a probabilidade de parentesco consangüíneo próximo entre os cônjuges. Isso tem sido observado em aldeias localizadas em ilhas, em tribos beduínas e em pequenas comunidades religiosas. Existem comunidades pequenas, entretanto, como as encontradas nos Alpes suíços, em que a freqüência de casamentos consangüíneos é bem menor do que a esperada ao acaso, o que indica que, nesses agrupamentos humanos, tais uniões são evitadas. No cômputo geral, porém, predominam as evidências de que os casamentos consangüíneos não ocorrem aleatoriamente na maioria das populações humanas (Haldane e Moshinsky, 1939; Hajnal, 1963). No Brasil, por exemplo, constatou-se que, entre os casais de primos em primeiro grau, aqueles em que o pai do marido é irmão do pai da mulher 95 88 ocorrem mais freqüentemente do que aqueles em que a mãe do marido é irmã da mãe da mulher, o que fala a favor da influência direta ou indireta dos genitores masculinos no casamento de seus filhos (Freire-Maia, 1958; Freire-Maia e Freire-Maia, 1961). Fig.1.5. Casamentos entre irmãos e meio- irmãos na 18a. dinastia do Egito (1580-1350 A.C.). I-1×I-2 : Sequenenra III × Aahotep II-1×II-2 : Aahmes × Ahmes Nefertari III-1×III-2: Senseneb × Amenhotep III-2×III-3: Amenhotep × Aahotep II IV-1×IV-2: Thotmes × Aahmes V-1 : Hatsheput Fig.2.5. Casamentos consangüíneos entre os ancestrais do rei inca Huáscar. I-1 × I-2 : Manco Capac × Coya Oello II-1 × II-2 : Sinchi Roca × Chimpo III-1 × III-2 : Lloque Yupanqui × Anac Varqui IV-1 × IV-2 : Mayta Capac × Chimpo Urma V-1 × V-2 : Capac Yupanqui × Chimpo Ollo VI-1 × V-3 : Inca Roca × Cusi Chimpo VII-1 × VII-2 : Yahuar Huacac × Ipavaco VIII-1× VIII-2: Viracocha Inca×Yunto Cayan IX-1 × IX-2 : Pachacutec Inca Yupanqui × Anahuarque X-1 × X-2 : Tupac Inca Yupanqui × Oello Coya XI-1 × XI-2 : Huayna Capac × Ravaallo XII-1 : Huáscar 96 89 É difícil analisar os fatores que determinam a prevalência de casamentos consangüíneos nas populações humanas, mas os de ordem econômica devem influir de modo prioritário, mormente em comunidades rurais, com a finalidade de manter a integridade da propriedade na família sem herdeiros do sexo masculino. Essa solução, aliás, não deixa de ser bíblica, como se pode ler em Números, 36: 10-12: "E as filhas de Salfaad fizeram como lhes tinha sido mandado e Maala, e Tersa, e Helga, e Melca, e Noa, casaram com os filhos de seu tio paterno, da família de Manassés, que foi filho de José; e a possessão que lhes tinha sido adjudicada permaneceu na tribo e família de seu pai”. Na maior parte dos países, entretanto, a tendência atual é a diminuição acelerada das taxas de casamentos consangüíneos, em decorrência do processo de urbanização, com a formação de grandes aglomerados humanos, das conquistas femininas, que tornam a mulher cada vez mais independente, e das facilidades de locomoção e comunicação, que propiciam maior contato entre pessoas de origem diversa. Assim, por exemplo, a Arquidiocese de Florianópolis, que registrava 4,5% de casamentos consangüíneos em 1920, passou a assinalar 1 % desses matrimônios em 1980 (Agostini e Meireles-Nasser, 1986). COEFICIENTE DE CONSANGÜINIDADE OU COEFICIENTE DE PARENTESCO O parentesco genético entre dois seres humanos pode ser medido por intermédio da probabilidade de eles terem genes idênticos, herdados de um ancestral comum a ambos, independentemente de tais genes condicionarem fenótipos dominantes ou recessivos, normais ou anômalos. Essa medida do parentesco, ou da correlação genética entre dois indivíduos, é denominada coeficiente de consangüinidade ou coeficiente de parentesco e, geralmente, indicada pela letra r, inicial da palavra inglesa relationship = parentesco. Para entendermos facilmente como se chega ao valor de r, consideremos dois primos em primeiro grau, como os indivíduos III-1 e III-2 do heredograma da Fig. 3.5, e suponhamos que, em relação a um par de alelos autossômicos A,a, o indivíduo III-1 é heterozigoto (Aa). Para calcular a probabilidade de seu primo (ou prima) III-2 também possuir o alelo a, por tê-lo herdado de um ancestral comum a ambos, temos que levar em conta que tal ancestral poderia ter sido o avô I-1 ou a avó I-2, já que os primos III-1 e III-2 têm esses dois ancestrais em comum e um desses ancestrais poderia ser heterozigoto Aa. 97
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